Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Júpiter Maçã, um dos grandes nomes do underground nacional, faz show hoje


Uma enciclopédia sobre o rock brasileiro não estaria completa sem um capítulo dedicado a trajetória do gaúcho Flávio Basso, o cantor, compositor e multi-instrumentista mais conhecido como Júpiter Maçã ; ou ainda, Jupiter Apple. O músico, que se apresenta hoje em Brasília (no Cult 22 Rock Bar, no Lago Norte), mantém a posição de um dos artistas mais reverenciados e influentes do underground nacional.

Depois de fundar, nos anos 1980, as bandas TNT e Cascavelletes (com esta, encontrou sucesso regional, ainda que só tenha arranhado o mainstream), Flávio entrou na década seguinte com novas ideias e influências. Sob a alcunha Júpiter Maçã, lançou em 1996 A sétima efervescência ; figurinha fácil em listas de melhores discos brasileiros dos anos 1990.

De lá para cá, ele se revezou entre Maçã e Apple (para os discos com letras em inglês). Visitou a bossa nova (Plastic soda, 1999), o pop futurista do Stereolab (Hisscivilization, 2001), o rock cru (Bitter, 2007) e a tropicália (Uma tarde na fruteira, 2008). Após um período turbulento (no qual enfrentou problemas com álcool), o músico se reabilitou e voltou à forma.

Pela segunda vez em Brasília (a primeira foi em 2005, em uma edição das Noites Senhor F), Júpiter se apresentará acompanhado de Astronauta Pinguim (teclados), Felipe Maia (bateria), Julio Cascaes (guitarra) e Felipe Faraco (baixo). No repertório, suas músicas mais conhecidas (como Um lugar do c;, Miss lexotan 6mg garota e A marchinha psicótica de Dr. Soup), novidades como Modern kid e Calling all bands (que ele lança em compato de vinil) e ainda inéditas que estarão em seu próximo álbum.

Júpiter está em estúdio, produzindo com Thomas Dreher o novo CD, que terá faixas em inglês e português. ;Tenho tocado todos os instrumentos. São músicas que traduzem o meu dia a dia, um reflexo da minha essência;, conta ele, que vem escutando Yeah Yeah Yeahs, Franz Ferdinand, Stereolab e o disco Beggar;s banquet, dos Stones. ;Não diria que essas bandas me influenciam sonoramente, mas em sensações;, observa.

Recentemente, o cantor esteve em Londres para masterizar 37 faixas que devem sair em uma caixa dedicada a ele (ainda sem data de lançamento definida). Lá, trabalhou com Simon Gibson, que remasterizou os discos dos Beatles. ;Eu me coloquei no lugar do público e escolhi aquilo que eles considerariam o filé da minha produção. De uma maneira bem distribuída e gostosa de ouvir;, comenta. Aos 43 anos, Júpiter Maçã acaba de entrar em um novo ciclo cósmico. O que espera desse ciclo? ;Expansão, em todos os ; bons ; sentidos.; (PB)

Show
Hoje, às 22h, no Cult 22 Rock Bar (Centro de Atividades 7, Lago Norte). Show com Júpiter Maçã (RS). Abertura: Pedrinho Grana & Os Trocados. Entrada: R$ 10 até 22h; R$ 15 até 0h e R$ 20, após. Não recomendado para menores de 18 anos. Informações: 3468-4678.

Cinco perguntas // Júpiter Maçã

Desde o disco Uma tarde na fruteira (2008) você tem sido mais Apple do que Maçã, compondo basicamente em inglês. Por quê?
Não existe uma lineariedade no meu sistema de composição. Sou uma antena ambulante que capta as sintonias, as vibrações dessas informações que podem chegar em inglês ou português. Por ora, estou mais à vontade assinando Apple. Mas quando preciso de uma coisa mais tropicalista, sou mais Maçã. O Maçã é mais divertido e o Apple é mais cientista. Eu sou o mesmo cara, mas Apple é mais incisivo e mais, acredito eu, fácil para as pessoas pegarem toda a gama de coisas que acabo abrindo na minha obra.

Nos últimos anos, você tem vivido entre São Paulo e Porto Alegre. Onde se sente melhor?
Para parir, dar à luz, eu prefiro Porto Alegre. Gosto de São Paulo para sociabilizar, tenho uma nata de amigos lá. Em Londres, me sinto em casa. Mas não sei se escrevi mais do que quatro ou cinco canções lá. O poeta maior dá as caras em Porto Alegre. A sede da Jack ; Jupiter Apple Corporation and Kingdom ; é aqui.

Como foi dividir o palco com o Cidadão Instigado no Rock in Rio?
Eles tocam as minhas músicas maravilhosamente. Como a música deles me é menos familiar, eu tentei colocá-las na minha escola. Diria que soou instigante.

Você se reconhece naquele Júpiter ;pré-rehab;?
Acho que estive íntimo da morte umas quatro ou cinco vezes. Essa coisa meio pirata, meio Keith Richards. Reconheço a autenticidade do artista que se apresentava naquela época. Era um artista que vivia em hotéis antigos, com o equipamento elétrico desligado, exceto abajur e ar-condicionado. Com a luz baixa, fumava, tomava drinques, recebia poucas pessoas ; algumas garotas e amigos, lógico. E escrevia algumas coisas. Mas não escrevi coisas tão legais nesse período. Depois, eu entrava numa van já ;;altinho;; e ia para o show. E quando subia ao palco, já estava bem alto.

Qual é o seu pior defeito? E a maior qualidade?
Meu ego. O ego está no cerne, no âmago da sua essência. Dali, vem minha maior qualidade. Às vezes, reconheço que tenho acesso à genialidade e posso me tornar petulante. Na verdade, eu sou um amor de pessoa. Encaro a genialidade com naturalidade, mas a busco. Acho que quando os navegadores pegam um barco, eles buscam uma terra nova. Não me considero satisfeito com ilhotas, eu quero um continente. Esse é o perigo, ser confundido. E o ego é a linha central da hipercomunicação social.