Na última década, quadrinhos norte-americanos e brasileiros tiveram de dividir espaço nas bancas com uma invasão de títulos japoneses. Desde então, cada vez mais séries nipônicas que reproduzem os sucessos animados da televisão são lançadas no mercado nacional. E é com a intenção de expandir esse mercado lucrativo que chega às bancas a Ação Magazine, revista com linha editorial inspirada no estilo de mangá mais acessível no Japão: o almanaque.
As revistas de bolso com leitura invertida são, na verdade, cópias do produto final de um processo dinâmico. Antes de serem publicadas no formato de livro ; ou tankobon ; no Japão, as séries chegam às bancas em capítulos semanais ou mensais, reunidos em calhamaços que mais lembram uma lista telefônica. Entre as mais conhecidas está a Shonen Jump, revista publicada desde os anos 1960 ; e que, como outras séries, só ganhou versão em livro depois de mostrar que conquistou o público.
O sucesso da fórmula pode ser comprovado em títulos como One Piece, que tem publicação semanal desde 1997 e hoje contabiliza mais de 600 capítulos e 60 volumes em tankobon. No Brasil, no entanto, o mangá que conta a história do pirata Ruffy foi interrompido pela editora Conrad depois de anos de pausas e mudanças de formato.
A Ação Magazine tem, portanto, a difícil tarefa de emplacar no Brasil uma fórmula bem-sucedida, mas que depende de um mercado editorial que já viu o fracasso de tentativas semelhantes. Para o idealizador e editor-chefe da revista, Alexandre Soares, esse desafio pode ser superado. ;Estamos começando algo novo no Brasil e quem vai ditar isso será o mercado. O importante é que os autores e os editores consigam criar histórias que deixem o leitor querendo mais na próxima semana;, afirma.
Depois de quatro anos de planejamento, Soares chegou a um formato que acredita que fará sucesso no Brasil: tamanho consideravelmente menor do que os almanaques japoneses, somente com histórias nacionais, desenhadas no sentido ocidental de leitura. Ele adianta que as histórias de maior sucesso têm grande chance de serem republicadas depois no formato de livro.
O primeiro número da Ação Magazine traz os capítulos iniciais de três histórias: Madenka, Tunado e Jairo. Nos próximos meses, devem ser incluídos nas páginas da publicação ao menos dois títulos (veja quadro). Mas quem vai decidir que histórias ficam na revista é o público. ;O bom do almanaque é que você tem liberdade de fazer alterações no formato. Dragon Ball, por exemplo, começou como comédia e virou série de luta;, diz Alexandre Soares. Antes do lançamento, a Ação criou um site com blogs, além de e-mail e conta no Twitter, por meio dos quais os fãs podem dizer o que querem ver na revista.
Para garotos
A julgar pelos primeiros capítulos, Ação deve seguir a linha shonen, nome usado no Japão para classificar mangás feitos para garotos. As narrativas de estreia do almanaque seguem a fórmula usada há décadas pelos grandes sucessos ; as três contam histórias de protagonistas carismáticos, que terão de provar seu valor em desafios crescentes para alcançar sonhos de grandeza ou revelar algum talento desconhecido. Fabio Sakuda, outro editor da Ação, afirma em seu blog ter alimentado a paixão pelos mangás na infância graças aos almanaques Shonen Jump e Shonen Magazine.
Mesmo que referências sejam inevitáveis, o mais interessante é que os autores não se inspiraram nas histórias que fazem sucesso no mundo dos mangás. Em vez de copiar os heróis idolatrados pelas crianças de hoje, ilustradores e roteiristas criaram personagens cheios de personalidade, que mais lembram séries exibidas na extinta Rede Manchete: Shurato, Patrulha Estrelar, Piratas do Espaço e Cavaleiros do Zodíaco.
Um dos diferenciais das histórias da Ação Magazine é que elas rompem com o estereótipo de mangás de colegiais e guerreiros japoneses. As que não se passam no Brasil são ao menos neutras, como o épico medieval Rapsódia. Mesmo a série sobre corridas Tunado substitui os clássicos carrões norte-americanos por máquinas nacionais.
O maior destaque é do herói Madenka, que ganha personalidade justamente por parecer um garoto brasileiro comum, jogando futebol com os amigos e ajudando no sustento da família. Em vez de enfrentar dragões e outros seres do folclore nipônico, ele tem encontros com sacis e cucas ; criaturas estilizadas que em nada lembram as descritas por Monteiro Lobato.
Ação Magazine
De Will Walbr, Maurílio DNA, Victor Strang, Alexandre Lancaster, Michele Lys, Renato Csar, Altair Messias, Fábio Satoshi Sakuda e Carlos Sneak. Lancaster Editora, 160 páginas. R$ 9,90.
Cinco histórias
Madenka
; O protagonista que dá nome à série é um garoto que toca a vida como vendedor de frutas, livre de preocupações. Mas, no capítulo de estreia, assinado por Will Walbr, Madenka prova que tem tudo o que é preciso para se tornar um herói ; desde que ele escute seu mestre, com quem vive às turras.
Tunado
; Na linha do ícone da animação japonesa Initial D, Maurílio DNA e Victor Strang criaram uma história sobre um garoto que decide seguir os passos do tio para se tornar um grande piloto de corrida. Antes de chegar lá, ele testa suas habilidades em rachas de rua.
Expresso
; Série que o próprio editor assina (com o nome Alexandre Lancaster), mistura steam punk e ficção científica, com direito a máquinas mirabolantes e muitos conflitos. O protagonista é filho de um coronel do início do século passado que, após estudar na Europa, decide mudar tudo ao se tornar um jovem inventor no Brasil.
Jairo
; Jairo é um garoto de origem humilde que tem de morar com os tios depois de perder os pais. Nessa narrativa criada por Michele Lys, Renato Csar e Altair Messias, o garoto se divide entre a rejeição da nova família e o bullying no colégio. Mas logo ele nota que a angústia pode ser usada nos ringues a seu favor.
Rapsódia
; Fantasia típica dos mundos de RPG, criada por Fábio Satoshi Sakuda e Carlos Sneak, Rapsódia conta a história de Reegan. Ele decide superar suas fraquezas para enfrentar os gigantes que amedrontam um pequeno povo na terra medieval. Sem grandes poderes, ele precisa lutar em desigualdade contra seus inimigos.