Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Orgulho de Portugal, vinho da região do Douro ganha um dicionário


Com cerca de 400 anos de existência, merecidamente, o vinho do Porto acaba de ganhar um registro importante. Abordando 55 temas que, dentre outros assuntos, discorrem sobre a produção e as castas cultivadas, o Dicionário Ilustrado do Vinho do Porto demorou seis anos para ficar pronto. Esse foi o tempo necessário para o enólogo Carlos Cabral e o administrador de vinícula Manuel Joaquim Pintão reunirem 3 mil verbetes e 620 ilustrações, fruto da paixão dos autores pela bebida. Incansáveis apreciadores, eles alertam que o livro poderá sofrer alterações à medida que encontrarem novas curiosidades relevantes sobre o Porto.

A bebida é considerada um patrimônio cultural e coletivo português. Produto-chave da economia do país ibérico, há indícios de que já nos séculos 3 e 4 era consumida, mas só na metade do século 17 que foi denominada como vinho do Porto. Nessa época, também teve início a exportação das safras.

Carlos Cabral explica que o objetivo do dicionário foi levar ao público uma história completa do vinho do Porto e, ao mesmo tempo, transformar o trabalho em um obra de referência no assunto. ;Embora o Porto possua uma bibliografia vastíssima, cada assunto referente a ele era tratado individualmente. No dicionário, buscamos mostrar todo o universo e mais as novidades encontradas em uma pesquisa muito detalhada;, conta.

Segundo ele, a pesquisa foi feita no Brasil e em Portugal. Manuel Pintão, português, pesquisou na cidade do Porto. Já Cabral, brasileiro, mergulhou na história da bebida em São Paulo, onde mora. ;Tenho mais de 400 livros sobre o vinho do Porto. Trocávamos e-mails quase que diariamente e, por nove vezes, estive no Porto para tratarmos do assunto;, relata.

Cabral, que é um estudioso da bebida desde 1969, conta que já esteve na cidade que dá nome ao vinho e à região vinícula do Douro 44 vezes. Ele garante que, no mundo, não há outro vinho com tanta história; por isso, julgou que a bebida merecia ter um registro específico. Ainda durante as pesquisas, o enólogo recorda que encontrou rótulos de quase duas centenas de vinículas que hoje não existem mais, parte essa que mais agradou ao especialista. ;Foi uma boa descoberta;, diz. Embora o livro já esteja publicado, Cabral considera o dicionário uma obra inacabada.

Para ele, uma das relevâncias do livro é que a publicação trata desde os termos básicos até os mais complexos, sempre ligados à história do Porto. ;Um vinho com 400 anos de existência e que aquece há quatro séculos o coração de muita gente tem também importância vital para a economia de Portugal e para os consumidores do mundo;, acredita.

Produção
Um detalhe que chama a atenção sobre o vinho do Porto é a personalidade de quem o degusta. A bebida, embora famosa, não agrada a todos os paladares. Por ter sua fermentação interrompida, o vinho adquire sabor adocicado e, consequentemente, uma graduação alcoólica elevada. Essas duas características dão ao Porto o título de vinho fortificado, tornando-o uma bebida própria para ser saboreada no fim das refeições, pois auxilia a digestão.

De acordo com o sommelier Alex Ordenes, da Adega do Vinho, a grande diferença entre o Porto e os vinhos denominados ;secos;, ou seja, que não contêm açúcar, está nas leveduras, que são todas transformadas em álcool. ;Normalmente, os vinhos secos têm uma insignificante presença de açúcar, cerca de 5g por litro. Se tiver mais de 5g, é denominado vinho semiseco;, explica. No caso do Porto, a técnica de produção mantém os resíduos de açúcar e, por isso, as leveduras não se convertem completamente em álcool. É uma espécie de aguardente vínica.

O sucesso da bebida orgulho de Portugal, segundo o sommelier Marcos Rachelle, um dos proprietários da Art du Vin, pode ser atribuído à grande longevidade do vinho, aos aromas e paladares únicos, sem contar com a vasta e rica história. Ele explica que, para ser considerado vinho do Porto, é necessário que a produção seja feita na região do Douro. ;As uvas para a elaboração são cultivadas no Douro e elaboradas e conservadas em Vila Nova De Gaia, um entreposto da cidade do Porto, que empresta seu nome ao vinho;, descreve.

Apesar de o Porto ser servido ao fim da refeição, Rachelle conta que apenas um tipo, o branco extra dry deve ser servido como aperitivo. Entre as harmonizações, o sommelier cita que, com o Porto Late Bottled Vintage (LBV) ou com o Vintage (veja quadro), combinam com queijos azuis, como stilton, gorgonzola e roquefort. Já para os tawnys e colheita, o ideal é casá-los com sobremesas à base de frutas secas. Caso não queira harmonizá-lo, Rachelle sugere apreciá-lo sozinho. ;Pode-se saborear os melhores vinhos do Porto pensando nas boas coisas da vida;, acredita.

Na hora da escolha, o sommelier aconselha sempre procurar por informações dos produtores, levando em conta a credibilidade. Em seguida, prestar atenção nas principais categorias. ;Em ordem decrescente de qualidade, está o vintage, o colheita, aqueles com 10, 20,30 ou 40 anos de envelhecido, os LBV e, por último, o ruby e o tawnys, mais simples;, ensina.



Duas perguntas para - Manuel Joaquim Poças Pintão
Administrador há 53 anos da Casa Vinícola Manoel D. Poças Junior, em Portugal

Por que o interesse pelo vinho do Porto?
Está no sangue. Meu avô fundou a Casa Poças em 15 de agosto de 1918. Portanto, quando nasci, já passei a conviver com esse vinho. Trabalhei em vários postos da empresa até chegar à presidência do Conselho. Foram 51 anos de muita luta, mas sempre tinha um cálice de Porto para animar o trabalho.

O que o Porto tem de mais especial em relação aos outros vinhos?
Primeiro a sua elaboração, pois é adicionado a ele uma aguardente vínica, fato que preserva todas as qualidades e o transforma em um vinho de longevidade. Depois, é o vinho que mais dá trabalho para ser elaborado, a sua região de nascimento é acidentada e exige um esforço quase sobre-humano para cultivar a vinha e colher as uvas. O Porto é o vinho da celebração, sua presença denota bom gosto de quem o elege.

Identificando um Porto

; White ; brancos que podem ser extra dry, secos, doces e lágrima
(muito doce)

; Rubyc ; envelhecido em grandes balseiros de carvalho. A composição é feita com vinhos de várias safras

; Tawny ; envelhecido em pequenos barris de carvalho de 525 litros. A mistura das safras que entram nessa categoria ocorre em torno de quatro a oito anos

; Tawny com idade ; nesta categoria, aparece no rótulo a média de idade da mistura de várias safras que entraram na composição. Por exemplo, no Porto 10 anos, são diversas safras, sendo que, em média, as uvas envelheceram por 10 anos. O mesmo ocorre com o Porto 20, 30, 40 ou com mais de 40 anos

; Tawny colheita ; é preparado com vinhos de apenas uma safra excepcional e envelhecido, no mínimo, por sete anos em barricas de carvalho de 525 litros

; Crusted ; preparado com diversas colheitas e envelhecido durante três a quatro anos em madeira

; LBV (Late bottled bintage) ; preparado com apenas uma colheita. É envelhecido em madeira durante quatro a seis anos e filtrado.

; Vintage character ; engarrafado quando o envelhecimento é de quatro a cinco anos em madeira

; Vintage de quinta ; feito com uvas de apenas uma safra e proveniente de uma única propriedade (quinta)

; Vintage ; é o ícone dos vinhos do Porto, produzido apenas em anos excepcionais, quando a uva foi colhida em perfeito estado. Depois, é envelhecido por até dois anos, antes de ser engarrafado. Ao abrir uma garrafa de Porto vintage, a mesma deverá ser consumida imediatamente. O ideal seria provar um Porto vintage após 15 ou 20 anos de engarrafado.

Companhia das vinhas

Em meados do século 18, embora a produção do vinho do Porto continuasse crescendo, as exportações diminuíram, os preços baixam, e a Inglaterra, principal consumidora externa, parou de comprar os vinhos, alegando que as bebidas sofreram adulterações. Foi aí que nasceu, em 1756, a Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro, uma forma de assegurar a qualidade da bebida, estabilizar os preços e equilibrar a produção.

Anos depois, foram desenvolvidas novas preparações do terreno, cultivo de uvas e, assim, se aperfeiçoaram as técnicas do feitio do vinho. Mesmo com crises, ao longo dos anos, foi criado em 1926 o Entreposto de Vila Nova de Gaia, uma espécie de prolongamento da região produtora ; o Douro ;, em que todas as fábricas do porto deveriam ter ali os armazéns de envelhecimento, o que acabaria com a comercialização direta. Foram anos de comércio, governo e economia girando em torno dessa bebida tão cheia de personalidade.

Aprenda a fazer um drinque com o vinho do Porto:

Porto Flip

Ingredientes
2 doses de brandy
2 doses de vinho do porto tinto
2 gemas de ovo
1 pitada de noz moscada

Preparo
Misture todos os ingredientes em uma coqueteleira e sirva em cálices próprios para vinho do porto.