Adecisão do Supremo Tribunal Federal (STF) garante que a atividade profissional de músico não necessita de registro na Ordem dos Músicos do Brasil (OMB), instituição que representa a categoria. A sentença abre espaço para que os artistas atuem sem vinculação ao órgão.
O julgamento do STF de anteontem favoreceu o recurso de um artista de Santa Catarina que foi à Justiça em defesa do exercício da profissão sem filiação obrigatória à Ordem. Na classe artística, prevalecem opiniões divididas: uns aprovam a solução dos magistrados da Corte, enquanto outros, temendo o fim da Ordem, preocupam-se com a desproteção legal dos colegas.
Cantor, gaitista e produtor, Engels Espíritos, que encabeça o Movimento pela Valorização do Músico (musicoatitude.com.br) no Distrito Federal, celebra a determinação do Supremo. ;Foi uma grande vitória para os músicos de todo o país, que sofreram, durante os 50 anos de existência da Ordem, os desmandos e o autoritarismo de um órgão que só teve uma função: ser um fiscalizador em causa própria, para punir e perseguir os músicos, arrecadando nossas anuidades e taxas sem transparência, sem trazer nenhum benefício à classe;, declara. Para ele, a profissão não necessita de uma instituição que a represente. ;Precisamos, na verdade, é de um sindicato forte, que lute pelos nossos direitos e conquiste benefícios. Não vejo nenhum lado negativo na desativação da Ordem no Brasil, porque não precisamos dela;, recomenda.
Ele também considera obsoleta a Lei n; 3.857, de 22 de dezembro de 1960, que permitiu a criação da OMB. ;É antiga e tem artigos ultrapassados, anacrônicos e autoritários, que não foram revisados pela Constituição Federal de 1988. A Ordem não sofreu nenhuma evolução representativa ou relevante, tanto do ponto de vista administrativo quando em termos de conquistas para os filiados;, critica.
O compositor piauiense Clodo Ferreira acredita que a decisão do STF foi acertada, pois exigirá da Ordem um posicionamento maior. ;Acho que é uma oportunidade de a Ordem se colocar com mais clareza. Se a Ordem não é o local onde os músicos vão procurar obrigatoriamente, cabe a ela procurar os músicos, pois agora é o local que eles vão procurar apoio. A não obrigatoriedade faz com que a Ordem reveja o seu papel e passe a ter a função de agregar os músicos em vários aspectos, não só no controle. É uma repercussão imediata;, analisa.
Atuação ambígua
Pedro Vasconcellos, cavaquinista, acredita que a resolução revela o desempenho irregular da OMB. ;Sou a favor que haja uma reforma e que a Ordem possa atuar de maneira mais eficiente na regulamentação e na valorização do músico. Essa decisão foi uma consequência, porque nunca vi ela fazer muita coisa pelos músicos. E, ao mesmo tempo, acho que a extinção do órgão pode acarretar num problema de valorização social da profissão, já que a gente precisa de alguém que responda por questões legais, que consiga dialogar por nós politicamente;, observa o instrumentista.
Ele também não concorda com os critérios de filiação da instituição. ;Por exemplo, um sambista do Rio de Janeiro que veio do morro, que compõe e toca de maneira informal, com um aprendizado mais natural; ele, de repente, não teria capacidade de passar na prova, nem de conseguir arcar com a anuidade da Ordem. Mas é qualificado. A nossa profissão não é uma ciência exata;, destaca.
Ex-conselheiro da OMB-DF e ex-integrante do Sindicato dos Músicos do DF, o músico Jaime Ernest Dias considera que o credenciamento à instituição é fundamental e que, apesar das denúncias, ela ajuda a compor a identidade da classe. ;A Ordem regulamenta a profissão, e isso é uma coisa legal para efeitos de fiscalização. Algumas pessoas dizem que, como se trata de uma manifestação artística, o registro não é necessário. Concordo em parte. Mas a regulamentação garante o reconhecimento profissional. Não acho que seja uma coisa que a gente deva comemorar;, alerta.
Procurado pela equipe de reportagem do Correio, o escritório da OMB-DF, presidido por Sidney Teixeira, alegou falta de espaço em agenda para comentar a resolução do Supremo.