Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Festival de Brasília sofre alterações na 44ª edição

Antes mesmo do anúncio oficial, as alterações na estrutura e na programação do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro já provocavam falatório na classe cinematográfica da cidade. Ontem, quando a Secretaria de Cultura do DF apresentou à imprensa o novo formato de uma das mostras mais tradicionais do país, a polêmica atingiu ponto de ebulição: em cena, a discórdia entre cineastas locais e a produção do evento. A entrevista coletiva para divulgação do regulamento da 44; edição, no foyer do Teatro Nacional, se transformou em palco para associações brasilienses, que cobraram participação nas mudanças definidas pelo governo.

O cartaz da mostra garante um festival novo, moderno e instigante. O pacote aprovado pelo secretário de Cultura, Hamilton Pereira da Silva, ; que também responde pela presidência do evento ; não só cumpriu a promessa como revelou surpresas já controversas. A mais barulhenta, divulgada no fim da semana passada, derruba a exigência de ineditismo para os longa-metragens que concorrem na mostra principal. Todas as produções inscritas estão no páreo, à exceção das que venceram prêmios de melhor filme em festivais. ;Queremos uma programação de alto nível, que movimente a cidade;, afirmou o secretário. Nas associações, ainda não há consenso sobre a decisão.

Sem dogma
Para Hamilton, o ;dogma; do ineditismo fragilizou edições recentes. ;Em alguns casos, foram incluídos apenas os filmes que não conseguiam ser selecionados em outros festivais;, observou. O cineasta João Paulo Procópio, presidente da Associação Brasiliense de Cinema e Vídeo (ABCV), vê a medida com ressalvas. ;O ineditismo provoca interesse da imprensa, por exemplo;, afirma. O tema ainda será debatido entre os associados. Mais do que essa novidade, no entanto, o que preocupa a ABCV é outro vespeiro: a entidade, que envolve cerca de 40 profissionais da área, se diz excluída das discussões sobre o festival.

;Nunca tivemos relação tão unilateral com a Secretaria de Cultura. Nós sugerimos um conselho curador formado por nomes locais e nacionais, com peso artístico e político, mas nos apresentaram um grupo formado por representantes apenas de Brasília. Isso provoca até um certo constrangimento;, reclama João Paulo. Mais descontentamento foi provocado pela determinação de que a seleção dos longas será definida por essa mesma comissão, escolhida pela organização do evento. Integram o grupo o apresentador Sérgio Fidalgo, os diretores Cibele Amaral e José Roberto Duque, o crítico Sérgio Moriconi, a pesquisadora Berê Bahia e o programador José Damata.

De acordo com o coordenador do festival, Nilson Rodrigues, a curadoria tem a liberdade de convidar outros representantes no momento da escolha dos filmes. ;Ela é responsável pela seleção, mas o método ainda será definido. Ela pode montar uma nova comissão, por exemplo;, disse ao Correio. Ontem, uma outra medida foi colocada em xeque assim que anunciada: a Mostra Digital, que substituiu em 2010 a competição de filmes em 16mm, foi abolida. Em compensação, o regimento passa a permitir as produções digitais, que agora competem entre os longas e curtas. De acordo com o secretário, o Cine Brasília será equipado para exibir cópias digitais.

Surpresa
O fim da Mostra Digital promete aquecer o debate entre as associações (entre elas, a Aprocine e a Ceicine) e a Secretaria de Cultura. Ano passado, foram exibidos 22 curtas nessa seção. Em 2011, o cardápio de curtas será limitado aos 12 que passam no Cine Brasília e a 12 exclusivamente de animação. ;Admito que fui pega de surpresa;, reconheceu Cibele Amaral, integrante da comissão. ;Pode ser que o festival perca essa reunião de estudantes, que é sempre importante;, afirmou. Nilson Rodrigues, que coordenou quatro edições do festival nos anos 1990, foi categórico. ;Acho que nós estamos valorizando o digital, e é só isso que eu gostaria de dizer;, concluiu.

Na coletiva, que contou com presença expressiva de cineastas, o clima era de queda de braço. Até o veterano Vladimir Carvalho, cineasta de Conterrâneos velhos de guerra e um dos fundadores da Aprocine, fez um apelo para que a secretaria marcasse um grande encontro com as associações para desfazer a ;cisma; que se criou. ;Estamos todos de pleníssimo acordo em relação à maior parte das mudanças, mas as tensões ficaram patentes. Estão no ar;, comentou. O secretário, porém, não marcou datas. ;Desde que assumimos o mandato, não recusamos ouvir segmentos da sociedade. Vamos continuar dialogando com quem quiser dialogar;, disse. A ABCV, que vai apresentar propostas à secretaria, lançou manifesto e promete uma campanha de ;amor ao Festival de Brasília; em blogs e sites.

Além da queda do ineditismo e da mostra digital, o Festival de Brasília aumenta o prêmio para longas (de R$ 80 mil para R$ 250 mil, equiparado ao do Festival de Paulínia, em São Paulo), altera a data (antes realizado no fim de novembro, será antecipada para o período entre 26 de setembro e 3 de outubro) e espicha para mais três cidades: Taguatinga, Ceilândia e Sobradinho terão sessões simultâneas dos curtas e longas em competição. O objetivo é, segundo a Secretaria de Cultura, estancar a crise do evento. ;Até onde pude perceber, o festival dava sinais de declínio. Estamos tomando as medidas necessárias para recolocá-lo no contexto dos festivais brasileiros;, comentou Hamilton. As novidades, no entanto, não encerram o drama em cartaz: as polêmicas sobre o futuro do Festival de Brasília só começaram.

O QUE MUDA

Ineditismo
Cai a exigência de ineditismo na seleção de longas. Todos serão avaliados pela comissão de seleção, exceto os que venceram prêmios de melhor filme em outro festival.

Nova data
Para não perder filmes para outras mostras, a data foi antecipada. De novembro, passa para um período imediatamente anterior ao Festival do Rio. De 26 de setembro a 3 de outubro.

Digital

Filmes em digital passam a concorrer nas mostras de curtas e longas. Acaba a Mostra Digital, que reunia principalmente produções universitárias.

Circuito ampliado
Mostra competitiva, que antes passava primeiro no Cine Brasília, será exibida simultaneamente em Ceilândia, Taguatinga e Sobradinho.

Mais mostras
Filmes de animação passam a competir a prêmios em seleção paralela. Também serão criadas as mostras Mosaico (com produções de diversos estados do Brasil), Primeiros Filmes e Filme para Celular. Festivalzinho exibirá mais filmes. Mostra Brasília continua.

Prêmio maior
O melhor longa ganhará R$ 250 mil. No ano passado, foi R$ 80 mil.

44; FESTIVAL DE BRASÍLIA DO CINEMA BRASILEIRO

De 26 de setembro a 3 de outubro. As inscrições para a mostra estão
abertas até 30 de junho. Nos sites www.festbrasilia.com.br e www.sc.df.gov.br.