Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Circuito de filmes alternativos se fortalece na cidade

Insatisfeita não apenas com a falta de conforto nas salas de cinemas, mas especialmente com o desinteresse reservado à programação diversificada nos redutos da sétima arte, a analista judiciária Letícia Alvetti, 51 anos, redescobriu o prazer de assistir a filmes na tela grande com as recentes idas à Embracine (CasaPark). Ao lado do companheiro, Irineu Mamedi, consultor de vendas, ela confirma: ;A gente só vem aqui. Praticamente só sobrou este cinema na cidade;. O retorno às salas alternativas da fiel espectadora terá um custo, como ela brinca, uma vez que um acordo, vigente há 12 anos, a coloca na obrigação de assistir a ;filmes horrorosos; do gosto de Irineu, adepto das fitas hollywoodianas. Rendido ao chamado circuito alternativo, no qual conferiu Cópia fiel (de Abbas Kiarostami), o consultor de vendas não reclama: ;Hoje, o cinema daqui está campeão;.

Formada em cinema, Renata (a filha de Letícia), num esforço como o de disponibilizar para o casal os cinco primeiros filmes de Claude Chabrol (de Madame Bovary), consegue delinear o perfil do público-alvo de algumas salas do complexo de cinema Embracine. Há quase dois meses, o incremento nos títulos abarcou raridades díspares, como uma animação alemã, um documentário francês que repassa tópicos de quarteto de culturas (ao acompanhar o crescimento de quatro bebês mundo afora), e a investida em programa duplo assinado pelo franco-argelino Rachid Bouchareb (Fora da lei e London River). Quem notou a diferença, por exemplo, foi a bancária Eliane de Sousa, 51 anos, que assistiu a comédias franceses (como Enfim viúva) ;que não passaram noutro lugar;. ;Primeiro vem a escolha do filme, depois a gente avalia a sala;, completa o psicólogo José Carlos de Sousa, 62, outro fisgado por Cópia fiel.

Com o cinema no sangue, o engenheiro aposentado Antônio Joffily (primo de José Joffily, diretor de Olhos azuis) conta que ;até havia perdido o hábito de ir ao cinema;, desde o fechamento das 10 salas da Academia de Tênis, há um ano (na sequência de incêndio que atingiu três delas). ;Sempre percebi o filão aberto em que, quem investisse, ia se dar bem. Gostamos de filmes que nos façam pensar, que repassem alguma mensagem. Há títulos que nos fazem passar uns dias pensando;, acredita Joffily, ele próprio apoiado em ações criativas como a pintura e o canto em coral (no Cantus Firmus). Exemplo de satisfação veio com Cópia fiel. ;O enredo dá margem a mais de uma interpretação e, além disso, é interessante reparar no enfoque especial dado à mulher, por parte de um diretor iraniano;, comenta.

Enfoque

Também saudosa da ;seleta programação da Academia de Tênis;, a servidora pública Cristiane Oliveira, que mora na Asa Norte, não se incomoda ;da forcinha; feita para chegar ao novo templo dos títulos alternativos que, até quinta-feira, por exemplo, encerra uma retrospectiva com 21 filmes do francês Eric Rohmer (morto em 2010). ;Sou muito atenta aos lançamentos e temos ido ao cinema, no mínimo, cinco vezes por mês. A proximidade da livraria também é atrativo a mais;, comenta, ao lembrar dos títulos recentemente exibidos, como O retrato de Dorian Gray e outros saídos do cardápio especial do Festival Varilux de Cinema Francês. ;Foram várias perdas seguidas: a Academia de Tênis, as salas do Brasília Shopping e o Cine Brasília, que está fechado;, lamenta o marido de Cristiane, Luis Henrique Oliveira, que é analista de comércio exterior.

Entre a dúzia de filmes em cartaz na Embracine, a escolha do casal foi pelo cult A minha versão do amor, baseado no último livro do canadense Mordecai Richler, morto há 10 anos. Premiado com o Globo de Ouro de melhor ator de comédia, Paul Giamatti demonstrou a popularidade, com grande peso na decisão dos cinéfilos. ;Ele escolhe uns personagens fora dos estereótipos dos mocinhos e dos vilões. Muitas vezes encarna o tipo angustiado, sem um final mais feliz para os personagens dele;, observa Cristiane Oliveira.

Os queridinhos de público

O retrato de Dorian Gray 3.424 espectadores
Cópia fiel (ainda em cartaz) 3.022 espectadores
Enfim viúva 1.609 espectadores

As próximas atrações

Como arrasar um coração (França)

Estreia de Pascal Chaumeil, colaborador de Luc Besson, tem como protagonistas Romain Duris (Albergue espanhol) e Vanessa Paradis. Na trama, um eterno impostor segue contratos para desfazer relacionamentos que incomodem terceiros.

A árvore (Austrália/França)

Baseado em livro da australiana Judy Pascoe, o filme dirigido por Julia Bertuccelli se apropria de elementos fantásticos, para contar a trama de superação da morte de um pai de quatro crianças que deixa viúva a personagem interpretada por
Charlotte Gainsbourg.

Contracorrente (Peru)

O título do estreante Javier Fuentes-León foi o pré-selecionado peruano para concorrer ao Oscar de melhor filme estrangeiro, mas foi cortado da lista dos cinco finalistas. O enredo gira em torno de um pescador de vila que tem o casamento desestabilizado pelo surgimento de misterioso fotógrafo.

15 anos e meio (França)

Dirigido pela dupla François
Desagnat e Thomas Sorriaux,
mostra as trapalhadas de um
cientista (Daniel Auteuil) que,
afastado da filha, deve retomar
a missão de pai da adolescente Églantine, a fim de que a mãe
dela possa viajar.

Ricky (França)

Exibido poucas vezes no Festival Internacional de Cinema
de Brasília, o antepenúltimo
filme de François Ozon, que
competiu no Festival de Berlim,
mostra as peripécias de um
menino especial,
que nasce alado.