Há dois anos, a rapper Aninha, do grupo Atitude Feminina, teve um sonho no mínimo curioso: estava se apresentando no palco da Sala Villa-Lobos do Teatro Nacional cantando hip-hop e sendo regida pelo sogro, que ela nem chegou a conhecer, pessoalmente, o maestro Claudio Santoro. Mal sabia que aquilo, de certa forma, iria se concretizar. Na última quinta-feira, o duo de São Sebastião formado por Aninha e Hellen gravou o primeiro DVD da carreira em um show realizado justamente no Teatro Nacional. ;Pra gente, é uma emoção muito grande estar gravando aqui nesse palco que é tão símbolo de Brasília e mais ainda para o nosso produtor e meu marido, o DJ Raffa Santoro, que é filho do maestro Claudio. O coração está bem acelerado;, contou Aninha.
O cenário, com direito a carro, um orelhão e telas grafitadas, além de objetos como galões e restos de latas, deu um ar de periferia ao palco da Villa-Lobos. Durante duas horas, o Atitude Feminina mostrou por que é um dos grupos de rap de mulheres mais importantes do país. ;É um meio ainda machista, então é uma conquista muito grande pra gente estar fazendo esse trabalho e ainda tendo participações tão especiais;, comentou Hellen.
Vários artistas do hip-hop brasiliense e até nacional passaram pelo palco do Teatro como o Voz sem Medo, Ato MC, Taty Beladona e o grupo de rap cristão Provérbio X, do rapper Isaías Júnior. ;Elas são uma referência de tudo o que a periferia representa e além de uma conquista artística é uma conquista pessoal e social;, declarou o cantor. Vindo diretamente de São Paulo para a gravação, o paulista Renan Inquérito destacou a relevância de um grupo feminino estar gravando um DVD e, por isso, fez questão de dar sua contribuição à iniciativa. ;Acompanho o trabalho delas há algum tempo e a música que cantamos exalta essa questão de que o hip-hop é unissex e tem espaço pra todos;, frisou.
Homenagens
Um dos pontos alto do show foi a participação do grupo Patubatê. A mistura inédita de percussão em sucatas com o hip-hop agradou os músicos e o público. ;Fizemos um arranjo especialmente para a música que apresentamos com elas e o som ficou bem interessante;, disse um dos músicos do grupo brasiliense, Fred Magalhães. Outro momento emocionante foi a homenagem à rapper paulista Dina Di, considerada um ícone do hip-hop feminino, que morreu no ano passado, em decorrência de uma infecção generalizada logo após dar à luz. ;Ela era nossa rainha e fizemos questão de cantar uma música pra ela;, lembrou Aninha.
A última faixa do DVD, a canção Neguinho da favela, teve a presença de duas ex-integrantes do Atitude Feminina: Giza Black e Jane ex-Veneno. ;Saí do grupo há cinco anos, mas não ia deixar de estar envolvida nesse projeto. Querendo ou não, fez parte da minha história, mesmo tendo buscando um outro caminho;, contou Jane, que virou evangélica e hoje se dedica ao rap cristão.
Para o DJ e produtor do Atitude, Raffa Santoro, o show representou muito mais do que a gravação de um DVD e é que um marco para o hip-hop de Brasília e até brasileiro. ;Pouquíssimos grupos de rap conseguem gravar e lançar um DVD próprio. Acredito que essa conquista para o rap brasiliense e para os grupos de rap femininos seja realmente inédita e que o Atitude está encabeçando. Gravamos na raça e na coragem e agora é esperar para finalizar e colocá-lo no mercado;, afirmou.
O evento contou com o apoio da Secretaria de Estado da Juventude, da Secretaria de Cultura e da Secretaria de Segurança Pública.
Histórico
Surgido em São Sebastião, no ano 2000, desde o início o grupo chamou a atenção para o lado feminino do movimento hip-hop, pelo seu engajamento contra a violência doméstica e a discriminação das mulheres de classes mais humildes da sociedade. Chegaram a ganhar o Hutúz, principal premiação do hip-hop brasileiro, em três ocasiões. Em 2005, com a música Rosas, na categoria de melhor demo feminino; em 2006, como Revelação; e, em 2009, como grupo Revelação do século.