Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

O discurso do rei e A rede social vão duelar na festa do Oscar

Houve um tempo em que a cerimônia do Oscar ultrapassava medidas ; num claro exemplo, a de 2002 atravessou mais de quatro horas. Ultimamente, porém, uma nova dinâmica tem atraído espectadores dos mais de 200 países que acompanham a festa. Uma vez que o figurino mudou ; os próprios apresentadores têm sido os nomes da moda, como James Franco e Anne Hathaway ;, resta saber se a essência, ou melhor, a tendência renovadora transparece nos votos dos seis mil eleitores da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.

A prova dos nove pode ser medida, na noite de hoje, quando justo os dois filmes mais cotados para ganhar o prêmio ; O discurso do rei e A rede social ; contrapõem não apenas o conteúdo ; o primeiro vinculado à velha expressão oral e o outro, detido na frieza da comunicação via Facebook ;, mas, ainda, a estrutura shakespeariana clássica (calcada nos atores) de uma produção de época em choque com a proposta de linguagem moderna, nada sentimental, de uma trama assentada na tecnologia.

Às vésperas da 83; cerimônia, marcada para as 22h (horário de Brasília) deste domingo (27/2), a mídia americana confirmou o favoritismo de O discurso do rei, que, com 12 indicações, superou a campanha de A rede social ao vencer os prêmios das associações de produtores, diretores e atores. O investimento pesado em marketing ; bancado pelo estúdio de Harvey Weinstein (ex-Miramax), Midas do cinema independente americano dos anos 1990 ;, a simpatia dos críticos, o tom sentimental da trama e a boa performance nas bilheterias (US$ 105 milhões arrecadados nos Estados Unidos) preenchem todos os requisitos tradicionais da Academia.

Essa invasão britânica, no entanto, pode esbarrar nas transformações que a própria festa da indústria do cinema tem adotado, ao valorizar produções dedicadas a temas contemporâneos, por vezes polêmicos, e que fugiam de uma antiquada zona de conforto ; a exemplo de Onde os fracos não têm vez e Guerra ao terror. Se a Academia confirmar essa tendência, A rede social pode se impor como a opção mais realista. Com apoio quase incondicional da crítica norte-americana, o filme de David Fincher acumula oito chances de vitória ; menos do que as 10 indicações do azarão Bravura indômita, faroeste assinado pelos irmãos Coen. Sem esperanças de vencer, Cisne negro, Toy Story 3, A origem, Minhas mães e meu pai, O vencedor, 127 horas e Inverno da alma fecham a lista dos concorrentes a melhor filme.

Mudança de rota

Na disputa entre os diretores, a Academia ressalta uma geração despontada nos anos 1990 e que, em grande parte, insuflou o cinema independente. À exceção do inglês Tom Hooper (O discurso do rei), há coincidências entre as trajetórias de Darren Aronofsky (Cisne negro), David Fincher (A rede social), David O. Russell (O vencedor) e os irmãos Joel e Ethan Coen (Bravura indômita). São cineastas que, avessos às fórmulas dos grandes estúdios, desenvolveram projetos intensos e pessoais. No início da carreira, eram tidos como ;outsiders;. Hoje, são assimilados pelo mesmo ;establishment; que os menosprezava.

Apontado por apostadores, como o grande candidato à estatueta, pela perda com O curioso caso de Benjamin Button (2009), David Fincher pode sair vitorioso pela primeira vez. Aos 42 anos, Aronofsky finalmente garante uma indicação, após ter sido desprezado por Réquiem para um sonho (2000) e O lutador (2008). A ironia é que, numa competição dominada por americanos, o britânico Hooper (que dirigiu o primeiro filme em 2004) toma a dianteira, com o aval do sindicato dos diretores de Holly-wood.