Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Blocos, orquestras e artistas anseiam por um local para o frevo em Brasília

;Pernambuco tem uma dança que nenhuma terra tem. Quando a gente entra na dança não se lembra de ninguém; É uma dança, que vai e que vem. Que mexe com a gente. É o frevo, meu bem!” Os versos do compositor pernambucano Capiba (1904-1997) resumem como poucos a magia e a efervescência desse ritmo brasileiro, nascido em 1907. Mais do que brasileiro, ele é essencialmente pernambucano e não se faz presente apenas em seu estado de origem, mas em outros cantos dos país.

Em Brasília, não é de hoje que se respira frevo por aqui. Segundo dados do historiador pernambucano Leonardo Dantas, os primeiros blocos desse gênero musical que surgiram no DF são datados de 1967: o Vassourinhas e o Lenhadores. Um ano depois, surgia o Pás Dourada. Já nas décadas seguintes, vieram o Batutas do Cruzeiro (1973) e o Bola de Ouro (1985). ;Esses blocos nem existem mais e só na década de 1990 é que apareceram os novos como o Galinho de Brasília (1992) e o Menino da Ceilândia (1995). Não há como negar, até pela grande colônia de gente de Pernambuco e de outros estados do Nordeste, que a capital federal sempre teve frevo. É algo consolidado. Não existe carnaval em Brasília sem ele;, comenta o recifense Fabiano Medeiros, maestro da orquestra Marafreboi de Brasília, especializada em ritmos regionais como o maracatu, o bumba-meu-boi e, claro, o frevo.

Marcado, alegre, improvisado, descontraído e, sobretudo, espontâneo. Reza a lenda que a palavra frevo vem de ferver, por corruptela, ;frever;, por isso, é sinônimo de agito, efervescência, rebuliço. Hoje, a partir das 14h, os brasilienses vão poder conferir um pouco dessa folia animada. A Troça Carnavalesca Mista (TCM) Suvaco da Asa vai fazer, pelo sexto ano consecutivo, a abertura informal do carnaval candango, levando o melhor do frevo para as ruas do Cruzeiro e do Sudoeste. O bloco nasceu de uma maneira despretensiosa, e foi crescendo ao longo dos anos. Já trouxe até uma legítima orquestra de frevo de Recife, mas, desde o ano passado decidiu fortalecer a cultura local. ;Hoje, a gente tem a participação da orquestra de Brasília, a Marafreboi, que conta com músicos de vários lugares, inclusive de Pernambuco. O carnaval tem essa magia de levar as pessoas de uma maneira espontânea às ruas para fazerem o que bem entenderem, se vestirem como quiserem, e ainda sem precisar pagar ingresso. É maravilhoso isso;, comenta um dos diretores do Suvaco, Rodrigo Hilário.

Compositores
Para 2011, a grande novidade da troça é o lançamento do seu hino oficial, composto pelo pernambucano Zezinho das Candongas e por seu filho Fábio Liberal, que faz uma referência à balbúrdia e à irreverência dos seis anos do Suvaco da Asa. ;Na verdade, o meu pai fez uma poesia em homenagem ao Suvaco há uns dois anos e então me pediram para eu fazer a melodia. Acabou virando o hino e vamos tocar muito durante o desfile;, revela Fábio. Apesar de compor esporadicamente, ele acredita que a cidade já tem uma safra de compositores de frevo locais, formada, principalmente, por pernambucanos aqui radicados ou gente de outros estados do Nordeste. ;É um povo que tem paixão pela sua cultura, pela sua terra, e faz questão de propagar e manter as tradições mesmo de longe;, diz.

Um deles é Josildo Santos, 35 anos, alagoano que vive em Brasília há 16. Professor de percussão e um dos integrantes da Marafreboi, ele acaba de compor o hino do bloco Menino da Ceilândia. ;A gente faz um trabalho de musicalização com as crianças e já temos muitas tocando, dançando e lendo partituras desse ritmo musical. Em breve, vamos ter muita gente criando mais frevo por aqui;, acredita. Para o fundador do bloco ceilandense, Aílton Velez, o trabalho desenvolvido é mais uma prova de que se tem frevo o ano inteiro em Brasília, já que o Menino da Ceilândia se apresenta todos os meses em diversos pontos do DF e também fora daqui. ;Nossa origem está no frevo, e nossa associação, que também é um Ponto de Cultura, oferece oficinas de música, artes plásticas, cordel, além de apresentações artísticas para resgate e disseminação da cultura nordestina. O objetivo é capacitar e estar sempre formando mais gente ligada ao frevo;, destaca.

Um dos compositores mais tradicionais de frevo na cidade é Dinaldo Domingues, 70 anos, responsável pelos hinos de um dos blocos carnavalescos mais queridos da capital federal: o Galinho de Brasília. Saudoso do agito de sua terra natal, Pernambuco, o artista sempre fez questão de passar o carnaval por lá, mas em 1992, em virtude do confisco das poupanças dos brasileiros pelo então governo Collor, os foliões tiveram que encontrar uma alternativa para não perder a festa nacional mais aguardada do ano. ;A gente ficou sem dinheiro para viajar e então criamos um bloco por aqui mesmo. Ele começou pequeno e hoje é essa festa grande que todo mundo conhece. Naquela época, não havia muito entrosamento entre o pessoal do frevo. Hoje, é bem mais forte e temos várias opções desse estilo na cidade;, reconhece Dinaldo.

Sombrinhas coloridas

Não se pode falar de frevo sem associá-lo à coreografia contagiante e ao seu elemento mais típico: a inseparável sombrinha colorida. Reza a lenda que o frevo é uma mistura de maxixe, marcha, quadrilha, danças europeias e, principalmente, dos movimentos e rasteiras da capoeira. Aliás, a sombrinha teria surgido dessa luta de rua. Os capoeiristas usavam guarda-chuvas velhos e usados como apoio para os passos e também como arma de defesa. Hoje, a sombrinha é o ornamento que mais caracteriza o passista e um dos principais símbolos do carnaval pernambucano. ;Não há passista sem sombrinha e também sem animação, sem disciplina. O frevo tem uma energia tão intensa que não há como não se envolver;, ressalta um dos principais representantes do frevo na cidade que, curiosamente, é gaúcho de nascimento, mas pernambucano de alma e coração, o professor de dança e ex-administrador de empresas
Jorge Marino, 69 anos.

Desfile do Suvaco da Asa

Concentração: hoje, a partir das 14h, no Quiosque da Codorna (Quadra 10 do Cruzeiro Velho). Desfile: a partir das 17h, pelas ruas do Cruzeiro e do Sudoeste.

Coceira no Suvaco

(Frevo de Fábio Liberal e Zezinho das Candongas)
(Em homenagem à Troça Carnavalesca Mista Suvaco da Asa)

O frevo é igual uma coceira,
Quando começa ninguém quer mais parar,
Coça aqui, coça ali, ai, ai
Coça acolá
Quanto mais a gente coça
Mais tá querendo coçar

Coça, coça, minha gente,
Ai que coceira profunda,
Vai coçando mais prá baixo,
Coça aqui na minha bunda.
Que coceirinha gostosa,
Coça aqui que é meu fraco,
Fico todo arripiado
Quando coçam o meu SUVACO!

Coçá, coçá,
Coçá, coçá, coçá,
Quá, quá, quá, quá, quá
Quá, quá, quá, quá, quá
A turma é mesmo boa,
É do balacobaco,
SUVACO, SUVACO, SUVACO!!

Tipos de frevo

Frevo de rua

Genuinamente e puramente instrumental, não tem voz e nem letra. É o mais popular. Dentro desse tipo de frevo, existem três modalidades:

* Abafa: é uma disputa entre duas orquestras. Uma quer abafar o som da outra.
* Ventania: é tocado muito rápido, ficando para as palhetas (saxofones) sua execução.

* Coqueiros: toca notas longas e agudas nos metais (trompetes e trombone).

Frevo-canção

Possui a mesma pegada instrumental do frevo de rua, mas com letra. Tem metais, percussão e madeira.

Frevo de bloco

Tem letra e exalta às troças e blocos. Tem uma formação instrumental chamada de Banda de Pau e Corda (clarineta, sax, flauta transversal, bandolim, violão, cavaquinho e banjo) e conta com acompanhamento de um coro feminino ou misto.