Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Festival de Gotemburgo aborda a tolerância entre os povos

Outros temas são o valor das relações familiares e as denúncias de injustiças sociais

Um mês após o ato terrorista em Estocolmo, o 34; Festival Internacional de Cinema de Gotemburgo começa amanhã repleto de filmes com temas que clamam pela convivência harmônica entre as pessoas, como o documentário Tears of Gaza, em que a norueguesa Vibeke Lokkeberg mostra o desejo de crianças, vítimas da violência na Faixa de Gaza, se tornarem doutores e advogados. Para além do sinal de alerta, a indústria do cinema dos países nórdicos ; Suécia, Finlândia, Islândia, Noruega e Dinamarca ; tem foco no evento, que exibirá 440 filmes até 7 de fevereiro. Outras 75 nações tomam parte do festival, o maior na Escandinávia, num cenário que mobiliza 200 mil espectadores. Números que impressionam, uma vez que a cidade tem 506 mil habitantes.

Em noite de gala, o excêntrico roteirista Charlie Kaufman (Brilho eterno de uma mente sem lembranças) quebrará a resistência aos holofotes, na primeira entrega do Dragon Award honorário. A abertura da festa, estendida para 17 salas de exibição (em 11 dias), será marcada pela premier de King of devil;s island, produção norueguesa que registra abusos num reformatório juvenil. Sob a presidência do bósnio Danis Tanovic, o júri elegerá o dono do prêmio de US$ 145 mil atrelado à estatueta do Dragon Award. Nessa corrida, três filmes são suecos: Apflickorna (de Lisa Aschan), centrado nos bastidores de uma disputa em equitação; Odjuret, em que um egresso da prisão se conecta ao erotismo de um trio de novos amigos, e Jag saknar dig (de Anders Gr;nros), drama em que gêmeas são separadas pela morte.

A solidão também se manifesta na trama do grego Attenberg (dirigido pela produtora de Dogtooth), alinhado ao peso comum das situações limite exploradas na disputa pelo prêmio The Ingmar Bergman Internacional Debut, reservado a diretores em busca de estilo. Nesse bloco estão o belga Olivier Masset-Depasse, que trata de imigração, em Illegal; o uruguaio Federico Veiroj, em Uma vida útil, focado num desempregado da cinemateca em Montevidéu, e o americano Derek Cianfrance, do cultuado Blue valentine (com a indicada ao Oscar Michelle Williams), desde já tido como ;um Cenas de um casamento;, na terra de Bergman. Sessões de gala que têm como chamariz indicados ao Oscar do peso de O discurso do rei, Cisne negro e O vencedor prometem ser badaladas.

O amplo cardápio do festival também agrega nomes consagrados, ao exibir títulos de Olivier Assayas, Danny Boyle, Stephen Frears, Pernilla August e Maj Wechselmann, a mais atuante documentarista sueca. A dobradinha artística entre Fernando Trueba e o artista plástico Javier Mariscal resultou na animação Chico & Rita, outro filme programado para o 34; GIFF que gera curiosidade, assim como uma retrospectiva de curtas-metragens do octogenário Jan Troell (Os emigrantes).

Nova onda

Um lote de seis filmes, com assuntos que vão da violência ao humor, traça um painel, em seção dedicada ao vigor do atual cinema romeno, com destaque para nomes como Cristi Puiu (de A Morte do Sr. Lazaresco) e Marian Crisan, estreante que registra o arquivamento de 483 casos de corrupção no Estado. Limados da corrida pelo Oscar de filme estrangeiro, o italiano The first beautiful thing, com Stefania Sandrelli, investe no cunho memorialista da Toscana dos anos 1960 e 1970, enquanto o alemão When we leave descreve os efeitos da separação de um marido autoritário.

Dramas familiares, por sinal, se espraiam no calendário de exibições integrado por Reencontrando a felicidade, com Nicole Kidman (candidata ao Oscar) interpretando a mãe de criança vitimada por acidente; Mamma Gógó, do celebrado islandês Fridrik Thor Fridriksson, que, na ficção, ameniza a situação de uma matriarca acometida por Alzheimer, e Strickly confidential, documentário emanado pela amarga descoberta para a norueguesa Benedicte Maria Orvung, recém-ciente de parentes ligados à colaboração a nazistas.

Estritamente vinculada ao tema Presença proposto pelo festival, a subvenção sueca junto a iniciativas como a produção de longas-metragens na África e a manutenção da única escola de cinema (Ciné Lekól) em território haitiano se multiplica no estímulo a 13 fitas coproduzidas e que serão apresentadas no evento. Numa população que congrega 20% de imigrantes ; com destaque para parcela iraniana ;, Gotemburgo fica atenta ao Oriente Médio com a sessão Dez anos depois do 11 de setembro.

Nesse bloco, despontam filmes como Miral (de Julian Schnabel), centrado num orfanato palestino em Jerusalém, e o iraquiano Son of Babylon, no qual o garoto Ahmed, acompanhado pela avó, busca o pai que sumiu na Guerra do Golfo. O iraniano The other, em torno de um órfão que faz amizade com um amigo do pai morto, e You don;t like the truth, documentário canadense com imagens inéditas da prisão de Guantánamo, completam o pacote.

PRESENÇA SUL-AMERICANA

Fast food off the shelf
; Nesse documentário, o diretor Fernando Martinez revela o peso das tradições bolivianas, no processo que desmantelou a rede McDonald;s em patriótico solo de Evo Morales.

Os lábios
; Santiago Loza e Ivan Fund tratam da gradual afeição gerada entre três mulheres (foto) dedicadas a trabalho de assistência social em área isolada da Argentina.

Post mortem
; Saudado pela crítica pelo anterior Tony Manero, Pablo Larraín cria uma atmosfera de assombro, no filme que conecta a autópsia do presidente chileno Salvador Allende ao latente romance entre um agente de necrotério e uma stripper.

108 cuchillo de palo
; Desencobrindo o período obscuro da liderança do ex-ditador Alfredo Stroessner, a espanhola Renate Costa entrega uma fita que expõe a intolerância e a repressão a homossexuais catalogados em listas do governo.

Little voices
; Desenvolvida em animação e mostrada no Festival de Veneza, a fita se apropria de experiências reais de vítimas infantis da guerra civil ma Colômbia.