A história de Brasília cabe em um quadro. Na verdade, em 1.410 quadrinhos que, juntos, formam um rosto anônimo. Clarissa Paiva, Fernando Nisio, Lauro Gontijo, Wesley de Sousa e Netinho Maia acalentaram a ideia de contar a saga da capital por meio de imagens, quando descobriram que podiam fazer isso com tintas e pinceis. O desafio surgiu em sala de aula. Os alunos do curso de artes da Universidade de Brasília (UnB) decidiram juntar as 10 mãos para produzir um trabalho em homenagem a Brasília especialmente concebido para concorrer ao Prêmio Marcantonio Vilaça, realizado pela Funarte. O edital exigia que a obra fosse destinada a alguma instituição museológica e a Casa da Cultura da América Latina (CAL) aderiu à ideia. As caras de Brasília ganhou vida assim, com um pé no prêmio, outro na universidade e um terceiro bem ancorado na consistência da ideia dos artistas. Acabou por levar os R$ 90 mil do Marcantonio Vilaça e pode ser visto até janeiro na CAL.
Clarissa, Fernando, Lauro, Wesley e Netinho são gente de pincel. Curtem pintura e nem cogitaram outro suporte para a obra. Todos, com exceção do piauiense Wesley, nasceram em Brasília e queriam aproveitar a obra para explorar a história da cidade. A questão era como conciliar pintura e narrativa figurativa condensada em uma tela de 2,10X1,60 m. Para que as 10 mãos pudessem trabalhar em conjunto, os artistas dividiram a tela em pequeninos lotes, exatos 1.410. Cada um teria direito a uma quantia específica de centímetros. O segundo passo foi sair em busca de fotografias sobre Brasília. A ideia era reproduzir as imagens em cada um dos quadradinhos, mas o Google não deu conta do recado e o grupo foi obrigado a recorrer ao Arquivo Público. ;Eu nunca havia visitado o arquivo;, conta Netinho. ;É um local muito importante, mas pouco divulgado.;
Munidos de 600 imagens históricas e mais outras tantas pessoais e produzidas por outros artistas da cidade, o grupo começou o trabalho de reproduzir uma a uma as fotografias. Brasília, em versões histórica e atual, foi transposta para a tela e virou um grande mosaico de cenas e rostos. ;Tentamos misturar a pintura, dividimos o espaço dentro do mesmo quadro para não ficar com uma parte em que desse para ver que foi uma só pessoa que pintou;, explica Clarissa. O trabalho durou um mês e meio, com turnos de 10 horas de pintura em grupos alternados.
A repetição de algumas imagens ajudou a criar individualidade dentro da unidade do quadro. ;É na repetição que se pode ver as diferenças de cada um;, diz Lauro. ;A gente dividiu a tela em vários setores e no início foi fácil por causa do espaço. Mas quando o espaço foi reduzindo a gente teve dificuldade. Essa experiência de entrar no ateliê juntos aproximou o nosso fazer. Olhando o outro fazer e como ele resolvia certas questões acabamos aprendendo e hoje temos até dificuldade em saber quem pintou o quê.;
Visto de perto, o enorme mosaico traz rostos conhecidos como o de JK, Oscar Niemeyer e Bernardo Sayão, cenas da época da construção e paisagens contemporâneas, como pontes e edifícios, construídos na última década. ;Quisemos representar a diversidade cultural e regional da cidade. Até hoje se ouve falar que Brasília é uma cidade sem cara porque é formada por pessoas de todo o país, mas a gente quis mostrar que ela também tem sua cara sim e que é muito diversificada, mas também comum;, resume Netinho.
AS CARAS DE BRASÍLIA
Visitação até 28 de janeiro, de segunda a sexta, das 10h às 20h, na Casa da Cultura da América Latina (CAL, SCS Qd 4, Edifício Anápolis).