Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Ferrock comemora 25 anos com grande encontro de bandas que fizeram barulho

[SAIBAMAIS]Ari de Barros, 53 anos, já ouviu de tudo: são tantas as lembranças musicais que, assim de supetão, não se arrisca a eleger as edições e performances mais marcantes do Ferrock. Prefere a isenção. Desde 1985, esse roqueiro aguerrido afina um dos festivais mais longevos do Distrito Federal. Defende o rock candango com tamanha dedicação que se incomoda quando ouve acusações de que a cena brasiliense anda anêmica, sem a quentura dos anos 1980. ;O rock ainda pulsa forte aqui;, resume, convicto. ;As bandas novas aparecem a todo momento, em todos os lugares: no Gama, no Recanto das Emas, no Riacho Fundo, em Ceilândia. Existe sim uma efervescência, ainda que ela não apareça num alcance nacional;, afirma.

O estigma de ;capital do rock; pode parecer datado ; mas, para o produtor, as guitarras do DF ainda conservam uma antiga vocação para a diversidade. Daí que, para comemorar os 50 anos de Brasília e os 25 de Ferrock (evento ceilandense que combina música e projetos sociais), planejou uma homenagem nada óbvia ao rock local. Entre as 27 bandas escaladas para se apresentar nos três dias de evento ; hoje, amanhã e segunda-feira, na Praça do Trabalhador ;, 24 nasceram sob o sol do cerrado. Mais inusitado é que a maior parte desse elenco está aposentada dos palcos: são grupos que retornam (talvez por uma noite apenas) para celebrar o passado. Entre eles, crias oitentistas como Finis Africae, 5 Generais e Mel da Terra.

O ;encontro de dinossauros; (como o próprio organizador define) começou a ser planejado há 10 anos e apenas um convidado, Vênus da Grande Maçã, deu para trás. Em maio, Ari organizou uma edição especial do Ferrock com as gringas Napalm Death e Suffocation. Mas o grande desafio estava por vir. ;Muita gente me aconselhou a desistir do projeto. Diziam que os músicos estavam cansados e não queriam saber mais de rock;, lembra Ari. ;Mas peguei pelo lado emotivo. Quando eu contava as histórias do Ferrock, os olhos deles brilhavam;, conta. Alguns se diziam ;enferrujados;, sem tempo para ensaiar. Mas toparam o desafio de reunir velhos amigos ou apresentar novas formações. No front, só três forasteiros paulistas: Casa das Máquinas, Made in Brazil e Nasi (ex-Ira).

Resistência
O critério de seleção para a edição ;revival; não exclui grupos que resistem na labuta. Mas até aí Ari privilegiou quem prestou mais serviços à causa: nesse time de convidados, que inclui nomes como Elffus e ARD, nenhum tem menos de 15 anos de trajetória. De convite em convite, Ari conseguiu formar uma galeria sonora que abrange um período que começa nos fim dos anos 1970 (com Marciano Sodomita) e vai até os anos 1990 (Os Cachorros das Cachorras, Nata Violeta, Kaos Klitoriano). ;É uma ideia muito bem-vinda. O festival mostra, entre outras coisas, que o rock de Brasília foi consagrado não apenas por aquela turma da Colina. E que ele nunca acabou: sempre se transforma;, observa o flautista e vocalista Paulo Mattos, do Mel da Terra.

A tradição do Ferrock pesou nos acertos do evento. Manter a regularidade ; e o engajamento ; é um dos traços mais notáveis do festival, que defende com bravura um formato que não para de trazer melhorias para a população de Ceilândia. ;A questão social é tão mais importante que nem me lembro muito das bandas que se apresentaram no festival;, conta Ari. O próprio nome do festival resume as utopias do grupo de 15 amigos que, num barraco da QNP 13, criou os fundamentos do projeto: fé, rock e revolução. Hoje, o organizador ainda se agarra àquele conceito. ;Organizar um festival não é fácil, mas, quando você trabalha com isso há tanto tempo, vai se livrando de algumas pedras e acaba virando história. Isso facilita;, reconhece. ;Hoje vivo exclusivamente da família, das ações sociais e do Ferrock;, afirma. Um gosto pela resistência que, tal como o rock de Brasília, não ficou na nostalgia.

FERROCK REVIVAL
Hoje, amanhã e segunda-feira, a partir das 14h, na Praça do Trabalhador, em frente à Administração Regional de Ceilândia. Entrada: 2kg de alimentos não perecíveis. Informações: www.ferrock.org. Não recomendado para menores de 12 anos.