Comparar Brasília e a cidade indiana de Chandigarh soa como obviedade. Colocadas lado a lado, as duas cidades costumam ser alvos de estudos empenhados em discutir o projeto modernista aplicado aos centros urbanos. Mas o fotógrafo francês Stéphane Herbert não se intimidou pela frequente comparação e saiu em busca de imagens capazes de traduzir as diferenças e semelhanças entre os dois projetos. Brasília-Chandigarh Patrimônio moderno, em cartaz a partir de hoje no Museu da República, resume o olhar que Herbert dirigiu às cidades.
Chandigarh foi projetada por Le Corbusier em 1947, a pedido do então primeiro-ministro Pandit Jawaharlal Nehru, para ser a capital do estado do Punjab. O arquiteto suíço e sua equipe aplicaram à cidade indiana o traçado modernista que faz Chandigarh ser frequentemente associada a Brasília, que seria inaugurada apenas três anos depois. Herbert fotografou as duas cidades entre 2005 e 2008. ;As duas foram construídas na mesma época, no espírito da modernidade mas com um ponto de vista estético diferente;, explica. ;Ao fotografar as duas, percebi muitas diferenças e semelhanças nos volumes.;
O fotógrafo ficou particularmente surpreso com a grande liberdade do movimento na arquitetura de Oscar Niemeyer e Le Corbusier. É uma das características que une e afasta os dois projetos. No caso da cidade brasileira, a leveza é maior, assim como o movimento sugerido pelas curvas. Chandigarh é mais ancorada no concreto e, por isso, aparenta maior solidez. ;Ela é mais massuda e tem a matéria do concreto aparente bruto, sem artifícios. É uma arquitetura muito orgânica e isso obriga uma percepção acentuada dos contrastes.; Herbert trabalhou apenas com filme. Preferiu esquecer a câmera digital porque essa tecnologia prejudica o registro dos volumes. ;Há uma certa tendência em deixar tudo no mesmo plano no digital;, justifica.
Todas as imagens da exposição são coloridas. Herbert considerou que muitos trabalhos de grande qualidade ; como os de Marcel Gautherot ; já haviam sido feitos em preto e branco. ;É um luxo trabalhar com filme, mas ele valoriza a materialidade.;
BRASÍLIA - CHANDIGARH PATRIMÔNIO MODERNO
Exposição de fotografias de Stéphane Herbert. Visitação até 7 de novembro, de terça a domingo, das 9h às 18h30, no Museu Nacional da República.
Água inspira instalações
A água é bom elemento. Escorre fácil, encaixa-se em qualquer espaço e, quando se trata de poesia, pode até virar objeto de contemplação. É, por assim dizer, bastante lírica. Ansiosa por um pouco mais de contemplação na arte contemporânea, a dupla gaúcha Nelton Pellenz e Dirnei Prates escolheu então a água como objeto primeiro de suas investigações e o cinema como alvo segundo. O trabalho foi selecionado para o Prêmio Funarte de Arte Contemporânea 2010 e pode ser visto em Brasília, na Galeria Fayga Ostrower.
Pellenz e Prates formaram o grupo Cine água para dar selo aos vídeos e instalações nos quais trabalham desde 2002. Na Funarte, a dupla mostra Salas de chuva, uma reunião de três instalações concebidas para serem contempladas no maior conforto possível. A Galeria Fayga Ostrower recebeu almofadas para que o público possa assistir aos vídeos sem pressa e a sala de exposição foi dividia em dois ambientes. No primeiro, um cubo branco semelhante às galerias comuns, ficam as instalações Chuva 4, Chuva 6 e Chuva 7. No segundo, uma imitação de sala de cinema, estão Chuva 1 e Chuva 2.
;A exposição trata da desaceleração do tempo. Os nossos trabalhos necessitam de um tempo para poder entender. É o tempo da contemplação;, avisa Prates, que em Chuva 3 e Chuva 4 se apropria de cenas do filme Cantando na chuva para chamar atenção dos visitantes para detalhes da sequência em que Gene Kelly canta em uma calçada munido de um guarda-chuva.
O artista transforma quatro minutos de filmes em um vídeo de uma hora e faz um comentário visual do clássico de Stanley Donen e Gene Kelly. ;Eu quis dilatar o tempo do filme para que as pessoas percebam todo o encanto que tem a cena;, avisa. ;Resolvi não fazer mais imagens próprias e me apropriar por entender que tudo já foi feito. Geralmente meu trabalho é um comentário, uma crítica a respeito de algo que percebo nessas imagens e que me toca.;
Sequência
Para Chuva 6, Prates busca a imagem em Psicose, de Alfred Hitchcock. Uma tempestade e o letreiro do Motel Bates, no qual acontece uma das cenas mais famosas do cinema de suspense, serve de motivo para o artista fisgar a atenção do público. Já nos vídeos de Pellenz, a água é protagonista. Chuva 7 é uma longa sequência de pingos d;água e pequenas poças no qual nada parece acontecer até que uma pequena ação perpassa a cena e surpreende o espectador. ;A ideia é criar um antagonismo entre o que se vê e o que se ouve;, adianta o artista.
Pellenz costuma trabalhar com câmeras fixas que filmam o objeto como se fosse uma fotografia. Há pouco movimento, muitos ruídos e eventuais interferências para lembrar que não se trata de uma foto, e sim de um acontecimento. Novamente, o tempo é fundamental para a compreensão do trabalho. Chuva 7 é formada por três vídeos acionados ao mesmo tempo. O audio ajuda a criar um ambiente de dúvida sobre a origem dos ruídos. ;É uma poesia sonora;, diz o autor. E uma prova de como a água pode se prestar ao trabalho da dupla. ;É um elemento aglutinador, uma vez que é um elemento que ocupa espaços diversos, quaisquer espaços;, completa Prates.
SALAS DE CHUVA
Instalação de Dirnei Prates e Nelton Pellenz. Em cartaz até 5 de dezembro, na Galeria Fayga Ostrower (Complexo Cultural Funarte, Setor de Divulgação Cultural). Visitação de segunda a domingo, das 9h às 21h.