Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

O americano Matthew Dear mescla eletrônica e pós-punk

Não tente procurar Black City no mapa dos Estados Unidos. A cidade não existe - é uma invenção do DJ, produtor e compositor americano Matthew Dear. Mas, ao mesmo tempo, é como se ela estivesse em todo lugar: tal como a Gotham City de Batman (ou a Sin City de Frank Miller), o traçado dessa metrópole de ficção remete a paisagens reais. Nasce do frenesi nova-iorquino, dos becos mais escuros de Detroit e do misto de euforia e solidão que se detecta em qualquer região superpovoada. "É um disco sobre a máquina urbana", explicou o "arquiteto" da ideia, em entrevista de divulgação. Pode parecer um plano sofisticado demais para caber num álbum de música pop. Mas não é de hoje que Dear, 31 anos, mira alto. Desde o início da década, ele se multiplica em pseudônimos (Audion, False e Jabberjaw), experimenta diferentes subgêneros da música eletrônica e lança projetos que desorientam o público e a crítica. Um DJ de microhouse e techno tem o direito de tomar o microfone e gravar canções pop? Pois foi isso que Dear fez em 2008, quando surpreendeu os fãs com o álbum Asa Breed. Soava como uma revelação: no peito de um produtor cerebral batia um coração rock 'n' roll. A nova cria, Black City, confirma essa fase "rockstar", inspirada em discos de David Bowie com participação de Brian Eno (como Low e Heroes) e na crueza do krautrock. À frente da Big Hands Band, Dear toma os palcos com a languidez de um Bryan Ferry. Mas no álbum "conceitual" ele interpreta um personagem mais temperamental, entre momentos de excitação e de melancolia profunda. "A vida numa cidade como Nova York tem desses contrastes: de dia, o trânsito é intenso; à noite, você encontra ruas vazias, terrenos desolados", comparou. O estado de espírito do narrador oscila a todo momento, mas a atmosfera do disco não se altera: o trunfo de Black City está na construção de um clima noturno, denso, com efeitos eletrônicos que vão empurrando o ouvinte para o breu. Soa como um filme de horror (ou como álbuns assombrados do fim dos anos 1990, como The Contino sessions, do Death in Vegas, e Pre-millenium tension, do Tricky). Com quase 10 minutos de duração, a faixa Little people (Black City) condensa a paranoia delirante de Dear: começa como uma faixa para as pistas termina à beira do precipício. Elogiado pelo New York Times e pelo site Pitchfork, o projeto eleva Dear a um patamar de prestígio que, para ele, era inédito. Hoje, bandas como The XX, The Chemical Brothers e Spoon cobiçam os remixes do produtor, um dos fundadores do selo independente Ghostly International. Mas a bajulação não deve modificar a persona provocativa de um compositor em constante movimento. Artista plástico, Dear trata cada disco como uma obra de galeria, uma instalação pop. Na última faixa de Black City (a delicada Gem), a cidade gótica é destruída - para que, do zero, o autor sonhe com uma nova criação. MATTHEW DEAR Conheça o compositor americano em www.myspace. com/matthewdear. O disco Black City foi lançado pelo selo Ghostly International. Importado. ****