Um menino descobre que o bandeirante Fernão Dias Paes foi seu antepassado e, encantado com a novidade, passa a se dividir entre sua rotina de escola, casa e deveres, e um episódio do século 17. Sonho e realidade se confundem em O sonho de Fernão ; uma aventura com Fernão Dias Paes, de Wilson Rossato. O lançamento do livro será na noite de hoje, dentro do projeto Quinta Cultural do T-Bone, que também contará com a presença do escritor gaúcho Daniel Galera (lançando sua HQ Cachalote, feita em parceria com o desenhista Rafael Coutinho), além de show da cantora Sandra Dualibe e bate-papo com a escritora e poeta Noélia Ribeiro.
A obra de Rossato é ficção com pitadas de realidade, já que o jornalista e escritor, nascido em Piracicaba (SP), é descendente de verdade do desbravador que sonhava encontrar esmeraldas no interior do país. A descoberta do fato também é descrita quase fielmente no texto ; a diferença é que o autor só veio a saber do ilustre parentesco dois anos atrás, adulto. O fato está registrado em uma obra escrita por Frederico de Barros Brotero, em 1956, para o Instituto Histórico e Geográfico do Estado de São Paulo, em que consta o nome de solteira da mãe de Rossato.
Escrito na primeira pessoa, o livro conta as peripécias de Wilson, adolescente que se empolga ao saber que o bandeirante paulista é seu antepassado. Ao adormecer, vai parar nos preparativos para a bandeira das esmeraldas, expedição realizada em 1674. ;Pensei que essa história poderia render um bom infantojuvenil, com aventura e informação histórica. Minha licença poética foi me colocar como criança, nos tempos atuais, usando celular;, diz ele, que vive em Brasília há 18 anos e também escreveu o romance adulto O tolo precário, vencedor dos prêmios da revista Cult e da Oficina do Autor, da Funarte.
Palestras
O sonho de Fernão é o segundo livro que Rossato escreve como parte de um projeto próprio de inclusão cultural, com edição bancada com recursos do Fundo de Apoio à Cultura (FAC), da Secretaria de Cultura do Distrito Federal. O anterior foi O DJ e as armas proibidas, que levou o escritor a visitar e a fazer palestras em unidades onde meninos infratores cumprem pena.
Desta vez, quase todos os mil exemplares serão encaminhados a escolas públicas nas comunidades carentes do Paranoá e de Itapoã. Na noite de hoje, eles serão vendidos pelo preço simbólico de R$ 1. ;Peço para os meus amigos que vão ao lançamento para comprarem exemplares a serem doados a escolas públicas. Depois de lerem o livro, os alunos farão um trabalho e eu visitarei a escola para um bate-papo. A presença do autor incentiva a leitura;, comenta ele, que contou com a colaboração do filho, Igor, de 15 anos, para ilustrar a obra.
;Eu me aproveitei dessa curiosidade da minha vida para escrever o livro e fazê-lo chegar aonde dificilmente ele vai. A suprema vitória do projeto seria cada criança ler o livro, terminar e ficar com vontade de começar outro. Temos que despertar o hábito da leitura;, assinala ele, que também doará exemplares para o projeto de biblioteca popular Parada Cultural, iniciativa dos mesmos donos do T-Bone, que mantêm livros de literatura disponíveis em 38 paradas de ônibus da W3 Norte.
Trecho do livro
Olhei para os meus tênis de cano alto. Deviam ser diferentes para ele.
-- Um tipo de calça desconhecida -- ele continuou me observando -- uma camisa estranha onde está escrito alguma coisa, sabe-se lá em que língua.
-- É inglês, está escrito I love New York -- ensinei. Era uma das camisetas que meu pai tinha comprado quando foi aos Estados Unidos a trabalho.
-- Vou embora -- ele disse repentinamente, depois de me encarar durante alguns instantes.
E se virou. Só aí percebi que dez metros atrás dele, um cavalo estava amarrado numa árvore pastando tranquilamente.
Entrei em pânico.
O que eu faria? Não sabia onde estava. Sabia a data e a época, mas não acreditava ainda. O que poderia fazer?
De repente, me ocorreu uma ideia. E se fosse uma pegadinha?
Sim, meu pai poderia ter perfeitamente planejado e um programa de televisão ter armado tudo. Aquele garoto era um ator e eu passaria por bobo.
-- Meu pai me paga -- falei entre dentes.
Garcia olhou para mim quando resmunguei, mas não se deteve e foi em direção ao cavalo.
Enquanto isso, fiquei olhando para as árvores ao redor, procurando pelas câmaras escondidas.