Um sopro pode ser fatal para a instalação criada por Luciana Paiva para a Galeria Fayga Ostrower, na Funarte. All, projeto desenvolvido ao longo dos últimos dois anos, consiste em 300 embalagens de chocolate Alpino pregadas com alfinetes na parede da galeria. O conjunto forma um suposto circuito. Por trás de algumas embalagens, uma luz dicroica trata de criar texturas e cores particulares. Pelas paredes da galeria se pode observar os circuitos e fios que conduzem eletricidade às lâmpadas, assim como todos os materiais utilizados por Luciana na instalação.
A precariedade se espalha por todos os cantos de All, assim como a simplicidade. Mais da metade da galeria não está ocupada. O branco impera e os circuitos em papel alumínio percorrem apenas trechos de algumas paredes. Tudo é proposital. A artista quer mesmo causar a sensação de falta, de ausência, de vazio e de um processo inacabado. ;Precariedade, para mim, não está vinculada a ideias como gambiarra ou escassez de recursos, uma coisa pejorativa. Para mim, é mais a ideia de frágil. Alguns objetos do nosso cotidiano têm isso de chamar nossa atenção para detalhes meio absurdos;, explica a artista.
All começou a ser gestado no ano passado como fruto de pesquisa sobre a precariedade em movimentos artísticos como minimalismo, arte povera e a própria arte conceitual. Ganhou corpo e acabou selecionada para o prêmio Energias na Arte, realizado em 2009 pelo Instituto Tomie Ohtake. Apenas artistas com menos de 27 anos foram selecionados, já que o prêmio pretendia mapear a jovem arte contemporânea em todos os territórios brasileiros.
Os papéis de chocolate recolhidos no cotidiano são portadores dos mesmos significados das palavras cruzadas e das embalagens de balas de trabalhos como Quando eu fugi e Todos os muros são L, reunidos na mostra Criptografia, individual da artista realizada, no mês passado, no Espaço Piloto.
A trajetória de Luciana é construída assim, com recortes e fragmentos do cotidiano reorganizados em circuitos delicados que chamam atenção para detalhes minimalistas. ;São trabalhos que surgem da pesquisa de utilização de materiais do meu cotidiano;, avisa Luciana. ;A arte não precisa de produtos acabados, alguns artistas são mais processuais.; Em Quando eu fugi, um conjunto de recortes de palavras cruzadas forma caminhos pelas paredes da galeria. ;A disposição é algo que vou compondo na hora, deixando espaços vazios;, diz a artista. A impressão de que falta algo está presente em todas as instalações em cartaz. É um recurso para estimular a reflexão sobre a necessidade (ou falta) de preenchimento, o mesmo utilizado eventualmente pelo argentino Jorge Macchi e seus diagramas em papel, uma das referências de Luciana para a construção de All e das três instalações de Criptografias.