Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Ana Cecília Tavares e Marcelo Fagerlande fazem recitais gratuitos para lançar CD com peça de Bach

Uma das curiosidades mais interessantes em A arte da fuga é o fato de Johann Sebastian Bach não ter especificado para qual instrumento compôs a peça. Deixou as notas copiadas em quatro pentagramas e morreu em 1750, antes de completá-la. A arte da fuga virou então um ícone do estudo da música barroca, gravada com as mais variadas formações, desde saxofone até o órgão tradicional dos tempos de Bach. Os cravistas Marcelo Fagerlande e Ana Cecília Tavares sabem da popularidade da obra entre instrumentistas, mas ficaram surpresos ao realizar uma temporada de recitais nos quais o complexo conjunto de fugas, contrapontos e cânones tocados em dois cravos eram estrelas do programa. Surpresa com a receptividade do público, a dupla de amigos resolveu gravar o CD que será lançado amanhã, na Casa Thomas Jefferson, e segunda-feira, na Escola de Música de Brasília. Nos primeiros compassos de A arte da fuga, uma sequência de oito notas revela o tema a ser repetido e trabalhado durante as 18 peças seguintes. A melodia simples serve de base para uma trama de sons construída de acordo com as mais complexas formas musicais da época, as fugas e os contrapontos. O desenvolvimento a partir de um pequeno conjunto de notas se espalha pela variedade de vozes que caracterizavam a música de Bach. As possibilidades sonoras são tantas que A arte da fuga ficou conhecida como um exercício sofisticado do pensamento polifônico do compositor e ganha em perspectiva nos dois cravos tocados por Ana Cecília e Fagerlande. O instrumento permite acelerar andamentos e colorir a peça com uma vivacidade raramente presente em execuções em outros teclados, como órgão e piano. ;Essa transcrição para dois cravos permite abordar a obra de maneira diferente, os tempos são mais rápidos e a interpretação fica mais viva. É uma maneira de mostrar A arte da fuga com outra visão. Com dois cravos podemos fazer as quatro vozes;, explica Ana Cecília, que contou com verba do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) para produzir o disco. Sintonia Primeira gravação da peça com dois cravos no Brasil, o CD, finalizado no ano passado, também é fruto da interação de dois instrumentistas engajados numa mesma conversa musical e atuantes em cenário de poucos nomes. Ana Cecília, professora da Escola de Música de Brasília (EMB), e Fagerlande, carioca e professor da Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UERJ), se conheceram em Brasília há mais de duas décadas e desde então trabalham juntos com frequência em projetos musicais destinados à música barroca, mas nunca haviam entrado em estúdio para um registro em dupla. A sintonia é importante para deixar transparente a polifonia da peça de Bach. ;Estamos dentro do mesmo caráter, juntos. Não é uma coisa fácil, porque tem que dar a mesma mensagem, é diferente de um concerto para dois cravos, em que a gente soma as quatro vozes para chegar a um resultado comum. Essa peça (A arte da fuga) não é uma coisa de virtuosismo, então cada cravo soma;, diz Ana Cecília. ;É uma peça emblemática para a música de maneira geral e a gente achou que neste momento era importante abordar uma peça dessa magnitude. Quando a gente fala em dar a ela caráter vivo, é torná-la acessível para o público. Dividindo as vozes com dois cravos, ouve-se tudo com mais clareza e esse é o diferencial do disco;, completa Fagerlande. Também são raros recitais como o que a dupla preparou para amanhã. Dedicada exclusivamente à peça de Bach, cuja duração tem pouco mais de 73 minutos, a apresentação retoma a temporada realizada no ano passado e responsável por detonar a gravação do CD. A ARTE DA FUGA ; JOHANN SEBASTIAN BACH Primeiro disco de Ana Cecília Tavares e Marcelo Fagerlande, 18 faixas. Preço: R$ 31,20. Os cravistas fazem recital amanhã, às 21h, na Casa Thomas Jefferson (706/906 Sul), e segunda-feira, às 15h30, no Teatro de Câmara da Escola de Música de Brasília (602 Sul; 3321-8300). Entrada franca. Classificação indicativa livre.