De uma elegância quase soberana e arrogância talhada na mesma proporção, o escritor e dramaturgo irlandês Oscar Wilde (1854-1900) carregava em si o dom da ironia. Elemento esse valorizado pela habilidade do autor de obras clássicas como O retrato de Dorian Gray e Salomé. Obras que dosam com tamanha destreza os caminhos do grotesco e do bizarro. Alguns desses ingredientes podem ser conferidos no conto O aniversário da Infanta, obra publicada pelo artista em 1888 para homenagear os filhos, e que acaba de ganhar montagem para os palcos pelas mãos dos irmãos Adriano e Fernando Guimarães.
O aniversário da Infanta: onze atores perambulam pela escura e triste corte espanhola" />"É uma história pouco conhecida do Oscar Wilde e a escolha se justifica pela maneira como ele apresenta temas atuais, como a paixão, a vaidade, o poder da beleza, o horror", comenta Adriano, que assina a direção e cenografia com irmão Fernando. A livre adaptação e dramaturgia do texto ficaram a cargo de Camila Evangelista e Michelly Scanzi. "A obra de Oscar Wilde continua atual, porque ele tratava de temas universais", continua Adriano.
Na trama, ambientada na Espanha do século 15, a pequena princesa Infanta (vivida por Nathalia Mello) vê sua rotina real quebrada com a chegada do aniversário de 12 anos. "Embora fosse princesa, a filha do rei, só fazia anos uma vez a cada 12 meses, como as filhas dos pobres", ironiza Wilde.
Tramada nos moldes dos contos de fadas, a obra sutiliza essa estrutura narrativa para desenvolver, bem ao estilo do escritor, pesadas e ácidas críticas à sociedade do seu tempo. "Interessante como ele recorre a um gênero voltado genuinamente para o público infantil para falar de coisas complexas, inerentes ao mundo dos adultos", observa o diretor.
Ao contrário das fábulas criadas por La Fontaine ou pelos irmãos Grimm (Jacob e Wilhem), Wilde adornou suas alegorias infantis com pitadas de crueldade e quase perversão. Depois de receber como presente de aniversário um anão mostrengo (Rodrigo Lélis), mas destituído de qualquer maldade e do total conhecimento de sua feiúra, a mimada alteza se vê desiludida com a morte súbita de seu "pequeno brinquedo humano". "Quando ele vê sua imagem diante do espelho e tem a autoconsciência de que sua feiúra era o motivo de tanto sucesso na corte, a criatura tem um colapso", detalha Adriano. "Foi um grande desafio transportar esse universo para o palco, porque o texto quase não tem diálogos", revela.
Para dar vida ao enredo pontuado por reviravoltas e contundentes reflexões da condição humana, 11 atores sobem em cena, desdobrando entre vários personagens que perambulam pela escura e triste corte espanhola. "Foi muito legal fazer porque o conto é riquíssimo, fala de coisas atuais como os padrões de beleza, da vaidade do ser humano", conclui Adriano.
O ANIVERSÁRIO DA INFANTA
No Teatro Dulcina de Moraes (SDS, Bloco C - Tel.: 3224-5369). De hoje a 14 de março, de quinta a sábado às 21h e domingo, às 20h. Ingressos: R$ 20 e R$ 10. Não recomendado para menores de 16 anos.