A história do Valdez começa pelo fim. Mais precisamente, pelo armagedom. Até agora, o trio de Taguatinga é conhecido apenas por uma música chamada Apocalipse girl. Gravada para a coletânea de lançamento do coletivo Cultcha, em julho do ano passado, a faixa tem pouco mais de três minutos de duração. Mas é a medida exata para despertar expectativas em torno de uma banda que, no melhor dos sentidos, soa furiosa. "Comecei a gostar de rock por causa do Ramones. O Nirvana me formou como músico. Sempre gostamos dessa coisa agressiva, suja, música para mosh. Nada contra o indie rock. Mas, na hora de tocar, são essas as influências que batem forte", resume o vocalista e guitarrista Diego Valdez, 23 anos.
Reforçada pelo baixista Everaldo e o baterista Sérgio, a família Valdez encarna o espírito de coletividade. No Cultcha, nascido da união de seis bandas de Taguatinga, cria estratégias para amplificar o rock da cidade - em fevereiro, ajuda a organizar a primeira edição local do festival Grito Rock. Além disso, adota a filosofia do todos-por-um até na hora de escrever canções. Apocalipse girl, por exemplo, teve a colaboração do amigo Davi Kaus (vocalista do Leda), que escreveu os versos sobre uma musa fatal que faz o pobre narrador confundir o inferno com o céu. "As músicas são feitas em conjunto, em ensaio. Colhemos ideias aos poucos", afirma Diego.
Mais do que amizade, os integrantes do coletivo compartilham afinidades musicais. Daí o som agressivo, com traços de grunge e punk rock, que permeia a coletânea oficial, com seis faixas. "Crescemos juntos ouvindo mais ou menos as mesmas coisas. Nos anos 2000, quando muita gente do Plano Piloto embarcou na onda do Strokes, a gente ouvia Queens of the Stone Age", compara. O estilo do trio aponta para os dias monótonos de adolescência em Taguatinga, quando Diego e Everaldo encontravam no punk rock do Ratos de Porão e do Garotos Podres um antídoto ao marasmo.
Os riffs densos do stoner rock, aliás, bateram como uma revolução juvenil no cotidiano dos dois amigos. "Estávamos fechados no segmento punk. Quando começamos a ouvir Queens of the Stone Age, começamos a conhecer um mundo bem maior. Foi o grande acontecimento", lembra Diego. No entanto, não é apenas a influência da guitarra "dopada" de Josh Homme que o Valdez deixa transparecer. A rispidez punk, também marcante no trio River Phoenix (outro membro do Cultcha), não tem nada de radiofônica. Mas quem se importa?
Com um repertório de 18 músicas, a banda resolveu entrar no estúdio Macaco Malvado (de Gustavo Bill) para registrar um compacto de sete faixas. "Toda banda precisa de um material para se apresentar, fazer shows. Apocalipse girl só representa uma faceta nossa", explica. Ainda sem planos para gravar o primeiro disco, a banda admite passar por um processo de amadurecimento. "Evoluímos a cada dia, a cada ensaio. O Valdez é uma banda muito aberta a várias influências. Falar sempre a mesma coisa fica meio chato, e isso só deu certo com Ramones e AC/DC. Amo tanto Beatles quanto Ratos de Porão", sintetiza.
Valdez
Conheça a banda de Taguatinga no site www.coletivocultcha.blogspot.com. O trio está em estúdio preparando o primeiro EP, que será lançado no fim do mês.
Coletivos de rock fazem a força?
"O coletivo Cultcha tem sido um integrador em todos os níveis. Além da integração com outras bandas, cria uma espécie de engenharia da cena independente. São criadas teias de contatos. Por aqui, se dizia que Brasília era a capital do rock, mas isso era reflexo de um ostracismo meio anos 1980. Os coletivos têm dado uma retomada no circuito. Isso torna o caldo mais grosso, promove debates e shows. A gente se encontra algumas vezes para debater assuntos de natureza da cena, apontar novos caminhos e canalizar boas ideias. E isso tudo acontece sem burocratização, sem concorrência. No caso dos coletivos, essa coisa de panelinha está sendo anulada."
Ennio Villavelha, 26 anos, vocalista e baixista da Deluxe Jazz Fuckers