Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Chega às livrarias o primeiro número da série Peanuts completo, que recupera os desenhos originais do menino Charlie Brown e sua trupe

Os fãs brasileiros da turma do menino Charlie Brown e seu cãozinho Snoopy não têm do que reclamar. Afinal, lá se vão décadas desde que os personagens criados pelo cartunista americano Charles Schulz são publicados por aqui (tanto em tiras de jornal diárias quanto em incontáveis coletâneas oferecidas nas livrarias) e seus desenhos animados estão disponíveis em DVD (e antes disso, em VHS). Mas um item imprescindível da coleção só foi ganhar versão nacional recentemente. A série Peanuts completo foi lançada originalmente nos Estados Unidos (como The complete Peanuts) em 2004. O número um contém os três primeiros anos da tira diária - de 1950 a 1952 - e também das páginas dominicais do mesmo período. Desde então, de seis em seis meses, são lançados por lá, novos volumes, cada um coletando o material referente a dois anos da série que Schulz desenvolveu sozinho até o ano de sua morte (em fevereiro de 2000). Ou seja, são cinco décadas de tirinhas. A coleção completa, com 25 álbuns, chegará a sua conclusão apenas em 2016. Mas se as tiras e os livros de Snoopy nunca saíram de catálogo nem aqui, nem nos Estados Unidos (nem em outras dezenas de países que os publicam) qual o real interesse em Peanuts completo? Além de ter à mão toda a produção de Schulz, é possível acompanhar o desenvolvimento tanto do criador, quanto de seus personagens. Este primeiro número é um bom exemplo disso, a começar pela capa. O menino na ilustração é o bom e velho Charlie Brown, mas não aquele com o qual os mais jovens devem estar acostumados. O design do personagem é visivelmente diferente. E basta uma folheada para perceber como o desenho de Schulz era mais comportado e suave comparado ao traço mais solto, simples e estilizado que marcou seus desenhos nas últimas décadas. No princípio, os personagens tinham um ar mais infantil, eram mais "fofinhos" por assim dizer. Mas não se deixe enganar. Por mais bonitinhas e engraçadas que pudessem ser essas crianças, elas eram donas de uma personalidade por vezes cruel, que acabou virando marca da tirinha. Acontece que os personagens de Peanut nunca tiveram papas na língua, são meninos e meninas que falam uns para os outros o que vem na cabeça. Isso porque eles nunca foram exatamente crianças normais. Daí vem parte do humor (especialmente para o leitor mais velho). Elas conversam sobre questões existenciais, sobre solidão e melancolia e com o passar dos anos, também política, religião, cultura, comportamento e sociedade - ainda que Schulz tenha tomado o cuidado de não levantar qualquer bandeira ideológica. Mesmo sem saber, ao expressar nas tiras o sentimento de rejeição que sentiu na infância e na adolescência e os assuntos que lhe chamavam a atenção quando adulto, o autor criou um trabalho diferenciado e à frente de seu tempo. A edição da editora LP está irretocável, seguindo a risca o padrão de qualidade da original (publicada nos Estados Unidos pela conceituada Fantagraphics). Além de capa dura e ótima impressão, o livro vem com texto introdutório assinado por Garrison Keillor, jornalista e radialista conterrâneo de Schulz, texto sobre vida e obra de Schulz escrito por David Michaelis e uma entrevista com o autor realizada por Rick Marschall e Gary Groth, o primeiro pesquisador de quadrinhos, o segundo, cofundador da Fantagraphics. O pai da turma Charles Monroe Schulz nasceu em Mineápolis, em 26 de novembro de 1922 e cresceu na cidade de Saint Paul. Filho único, costumava ler com o pai as tiras de quadrinhos que vinham encartadas nos jornais. Foi um adolescente tímido e de poucos amigos. Depois de voltar da Segunda Guerra Mundial, passou a lecionar artes e, logo depois, estreou a tira Li'l Folks - espécie de embrião de Peanuts, que começaria em 1950. No fim daquela década, o trabalho de Schulz já era conhecido em todos os Estados Unidos, e nos anos seguintes, em diversos países. O cãozinho Snoopy e sua turma viraram uma lucrativa franquia, com direito a desenho animado, brinquedos, camisetas e tantos outros produtos. Schulz morreu de ataque cardíaco, na cidade californiana de Santa Rosa, em 12 de fevereiro de 2000. Peanuts completo De Charles Schulz. 360 páginas. L Editores. Preço médio: R$ 68. Para : confira galeria de imagens de Peanuts completo.