Há quatro anos, desde que montou Irmã Cecília fala de sexo, Dora Wainer cultiva saudades: da vibração da plateia, da emoção, do pavor da solidão de quando o pano do palco sobe e daquilo que vem em seguida - o prazer do domínio da cena. Vendo - no teatro - a "catarse de uma renovação", a atriz conta que, ao menos provisoriamente, as barreiras econômicas restringiram o contato com o mundo encenado. "O fazer artístico sempre foi importante e me exigiu dedicação - dividi meu tempo entre o serviço público e o teatro, que vinha após a carga de trabalho, quando finalmente ensaiava", conta.
A rotina contínua, desde 1982, do envolvimento em uma peça por ano trouxe o desgaste. "Veio o cansaço natural da vida dupla, já que, a cada espetáculo, há sempre recomeço e o envolvimento com peças de baixo orçamento, nas quais o sacrifício maior geralmente é dos atores", observa.
Analista de documentação na Procuradoria-Geral da República, Dora Wainer - formada em biblioteconomia pela UnB - atualmente se empenha na chefia ("é uma visão de diretor", brinca) de setor ligado à documentação jurídica. "O teatro reforçou minha disciplina. Rigidez de horário e responsabilidade estiveram no meu trabalho artístico, que nunca vi como coisa de malucos", comenta. A oportunidade de injetar projetos, sonhos e aperfeiçoamento na organização e na recuperação de uma massa de informações é o que tem movido a atriz, aos 51 anos: "O mundo ficou tão menor com o acesso digital e, há muito tempo, a biblioteca não é mais um depósito de livros".
Desde os 22 anos estudiosa de teatro, Dora, que nasceu em São Paulo e chegou a Brasília com 18 meses, brinca que sempre foi muito fiel aos diretores. A lista de compromissos incluiu Ricardo Torres, B. de Paiva e os irmãos Guimarães, ao defender personagens de peças como A falecida, Viúva porém honesta e As desgraças de uma criança.
[SAIBAMAIS]Formada na primeira turma da Faculdade de Artes Dulcina de Moraes, época em que admirava figuras como Guilherme Reis, Maura Baiocchi, Tânia Botelho e Françoise Forton, Dora guarda daquela época a recordação especial da direção de Dulcina de Moraes, em Bodas de sangue (1983). "Com ela, tive a noção de que uma grande atriz se faz com disciplina, trabalho e respeito pela profissão. Aplauso e glamour podem vir como consequência, mas a atividade é mais penosa e bonita do que isso", diz. Ainda muito conectada ao universo das artes, que lhe faz falta, Dora Wainer - mesmo sem planos definidos - só tem uma certeza: "Quando eu voltar, vou querer investir em algo ligado a proposta que parta de mim".
Teatro sem investimento
Morador da capital desde 1974, quando "a cidade ainda era adolescente", o fluminense (de Resende) Luis Guilherme Baptista descobriu a vocação teatral em 1982, quando entrou para o grupo Vidas Erradas, com atividades estendidas entre os anos de 1980 e 1990. Saudoso do "sustento espiritual" encontrado no teatro, que ele deixou desde 2003 (com a peça Álbum Wilde), aos 48 anos, Luis Guilherme segue na trilha docente, com ensinamentos de história (como professor da rede pública) e à frente de aulas de artes cênicas.
Integrante da "década da criação" (os anos 1980), na qual apareceu em Você tem uma caneta azul pra a prova? (1982) e João e Maria - Uma história de verdades e mentiras (1985), o ator atualmente dá sequência a projetos culturais como o Caminhada, com alunos interessados em pesquisas de patrimônio e do meio ambiente.
Um motivo de decepção nessa nova fase só transparece com os 12 anos de inatividade e falta de estímulo, por parte do governo local. Vale a lembrança de que, há 13 anos, ele foi diretor de programação e um dos coordenadores do projeto Temporadas Populares que, na quinta edição (1998), alcançou o patamar da realização de 350 eventos culturais. "Se o Temporadas Populares encontrasse continuidade, Brasília estaria envolvida no cenário internacional, numa dimensão em que não fazemos nem ideia", defende.
Numa revisão da carreira nos palcos, Luis Guilherme ressalta especialmente espetáculos conduzidos por Hugo Rodas, como Orquestra de senhoritas (de Jean Anouilh) e O jardim das cerejeiras (de Anton Tchecov). Com a perspectiva lançada para o futuro - "quem sabe se, no cinquentenário de Brasília, a gente não mete bronca?" -, em 2010, Luiz Guilherme não descarta a retomada da direção de projeto acalentado por uma década, com participação do ator Chico Sant%u2019Anna.