A bagunça de papel na mesa do ministro da Cultura, Juca Ferreira, assusta. E ele sabe disso. De maneira que não tem nenhum pudor em admitir. "É mesa de quem trabalha muito e não tem tempo para arrumá-la", brinca. Desde que assumiu a função, em setembro de 2008, que o sucessor de Gilberto Gil na pasta tem a preocupação de dar continuidade a uma política cultural que tenta atingir toda a população. "Estou dando continuidade à gestão do ministro Gilberto Gil; acho que estou colhendo o que ele plantou, 2009 foi o melhor ano para a cultura", avalia.
Um passo importante foi dado na última quarta-feira, com a apresentação na Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados, de projeto que visa a substituir a Lei Rouanet (Lei n; 8.313/1991) por uma legislação mais abrangente e transparente. Com a medida, o ministro pretende desburocratizar os mecanismos de acesso à lei. "A Lei Rouanet cumpriu seu papel, mas nesses 19 anos ela gerou distorções monstruosas e a nova legislação irá disponibilizar mais dinheiro que será empregado de maneira criteriosa e acessível a todas as áreas da cultura com a criação de novos fundos setoriais", garante.
Outra novidade conquistada nesses 13 meses de trabalho foi a aprovação, no Senado, do Vale-Cultura, benefício que irá atingir 14 milhões de brasileiros, injetando cerca de R$ 7 bilhões na economia do setor. "A cultura é uma economia importante. Além de patrimônio simbólico, é preciso o governo tratá-la como área econômica também", reforça.
Outro ponto postivo, segundo Juca Ferreira, foi a aprovação, também no Senado, da PLC/2009, projeto de lei complementar que altera a alíquota de tributações pagas por empresas culturais, o Simples da cultura. O projeto, que segue agora para sanção presidencial, propõe a redução de quase 18% dos impostos pagos. "Desde o início do ano que estamos trabalhando para aprovar este Simples, nós ajudamos a rever essa questão porque prejudica a cultura", diz Ferreira, que ainda não teve tempo de ouvir o novo trabalho do amigo Gil, o disco Bandadois. "Até liguei para ele outro dia, mas infelizmente não tive tempo de escutar nenhuma música até agora, é bom?", pergunta.
Distorções
Sobre a Lei Rouanet, o ministro diz que ela cumpriu seu papel, "mas, nesses 19 anos, ela gerou distorções monstruosas, como uma concentração territorial excessiva". Como exemplos, ele cita que 80% dos recursos foram para apenas dois estados - sendo que 60% ficaram com duas cidades, onde mais da metade dos recursos acabou nas maõs de 3% dos proponentes, sempre os mesmos. Existe estado que não recebeu quase nada. "Isso é resultado de falta de critério absoluto, possibilidade de apropriação de dinheiro público e, além disso, muitas áreas da cultura não tiveram acesso à Lei Rouanet", analisa.
Segundo ele, artistas de vanguarda, manifestações populares, arqueologia, história, museus tiveram uma presença medíocre na lei. "Enquanto isso, temos uma realidade dantesca na cultura brasileira: a gente não consegue envolver culturalmente 20% da população com única exceção da tevê aberta, só 8% foram ao museu, só 13% vão com alguma regularidade ao cinema, só 17% compram livros, mais de 90% das cidades não têm cinemas, a realidade é muito grosseira e excludente. Ou seja, não dá para garantir desenvolvimento cultural no Brasil nessas condições. E a Lei Rouanet aprofunda, acirra essa desigualdade, essa desconcentrarão, esses privilégios e essas exclusões, por isso tem que mudar."
Ponto a ponto
Mudanças
Para chegar a essa conclusão, de que era preciso mudar, geramos uma grande mobilização. Rodei o Brasil inteiro, passamos por 20 estados, com o secretário- executivo e o de Políticas Culturais, e conseguimos criar uma opinião pública favorável e apoio de de artistas e produtores. Hoje temos condições de fazer mudanças, possibilitar mais recursos para a área cultural e empregá-los melhor: somando a Lei Rouanet com as outras leis, Vale-Cultura, inclusão no Simples das empresas culturais, Plano Nacional de Cultura, Sistema Nacional de Cultura e o Plano de Emenda Constitucional, projeto que vai colocar a cultura como necessidade básica.
Vale-Cultura
O projeto foi aprovado no Senado e volta à Câmara para pequenas modificações, já que eles incluíram revistas também como produto do Vale-Cultura. Estamos indo bem, estou bastante otimistas, há um consenso, até os líderes da oposição elogiaram a iniciativa. O Vale-Cultura vai injetar R$ 7 bilhões/ano na economia ligada à cultura, beneficiando 14 milhões de pessoas. Vai colocar dinheiro no bolso do trabalhador para ele poder ir ao cinema, à livraria, comprar CD, enfim, o projeto vai estimular a presença e o consumo cultural entre a população.
Simples da cultura
A cultura é uma economia importante, responsável por 5% do PIB e quase 6% do emprego informal, com potencial para chegar até a 10%, então, é preciso que o governo trate como área econômica também. A cultura é também uma economia e, nesse sentindo, a inclusão no Simples estimula a formalização porque mais da metade das empresas culturais estão na ilegalidade, na informalidade porque as leis não contemplam as singularidades da cultura.
Balanço
Estou dando continuidade à gestão do ministro Gilberto Gil, acho que estou colhendo o que ele plantou e acho que 2009 foi o melhor ano para a cultura: estamos sendo avaliadoa pela população como um dos melhores ministérios do governo Lula, conseguimos uma base consensual entre os artistas e os produtores culturais muito grande. Estou muito contente, chegando ao fim do ano com a sensação de que estamos cumprindo a nossa missão e vamos trabalhar até o último dia de 2010.
Ouça entrevista com o ministro da Cultura