Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Novas gerações de poetas brasilienses buscam uma linguagem própria

Há pouco tempo, um dos ícones poéticos de Brasília, Nicolas Behr, ministrava uma palestra em uma escola quando de repente foi questionado por um aluno: ;Mas ainda existem poetas? Achei que todos tivessem morrido;; E então Behr respondeu: ;Enquanto o homem existir e tiver a capacidade de se emocionar, sempre haverá poetas e poesia;.

E foi assim que ao longo dos anos surgiram Cruz e Sousa, Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles, Manuel Bandeira, João Cabral de Melo Neto, Mário Quintana, Ferreira Gullar, entre tantos outros. E a cada dia florescem novos poetas no Brasil e no mundo afora. ;A poesia está sempre se renovando; não existe limite para a criação e tem uma nova geração surgindo aí sim. E isso é muito bom;, destaca Behr.

Gabriela Ziegler,16 anos; Bruno Soares, 19; Paulo Ohana, 20; e Carla Andrade, 32, são alguns dos jovens poetas que estão jogando versos, rimas e prosas em toda Brasília. Cada um deles já publicou um livro. Mas reconhecem que, especialmente para a sua geração, as ferramentas da internet têm sido de grande valia. ;A internet é um espaço democrático e assim acaba sendo uma vitrine para a gente, já que não temos muito espaço no mercado editorial;, opina Carla, que conseguiu publicar seu livro com recursos do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) do DF.

Já Paulo Ohana acredita que mais que uma ferramenta, os blogs, sites e afins são espaços que dão suporte e expressão à poesia. No entanto, jamais vão substituir a experiência de se ler um livro. ;Hoje, você não se vende, não se divulga, se não ocupar um espaço virtual. Mas jamais vai substituir o significado que tem o papel. São experiências diferentes, porém, sempre válidas;, destaca.[SAIBAMAIS]

Inspiração

Mas em que fonte de inspiração bebe essa nova geração? E qual o espaço que esses jovens ocupam? Conflitos, amores e paisagens são temáticas sempre recorrentes, mas Nicolas Behr acredita que há uma descrença e uma desesperança bem maior na juventude atual do que na que ele pertenceu. ;Muita gente se pergunta: já fizeram de tudo o que nos falta fazer? Mas é claro que ainda falta muito para se fazer, se criar. Há uma tendência de se glamorizar o passado, mas são épocas diferentes. A minha geração tinha outras temáticas, como a luta contra a ditadura, o desejo pela liberdade. Hoje, estamos em uma democracia. É um outro momento, outras aspirações;, ressalta.

O jovem poeta Paulo Ohana acredita que, realmente, o contexto em que emergiu a poesia do próprio Nicolas Behr e de outros poetas daquela geração é bem diferente do atual. Ohana acredita que a nova geração corre atrás de experiências com a linguagem.

;Na época deles, a poesia ocupava um espaço mais claro, uma possibilidade de expressão numa sociedade onde não se podia expressar de maneira tão livre. E hoje, a gente tem a liberdade, mas qual o espaço que a poesia ocupa agora? Acho que estou fazendo uma poesia que não tem nada a ver com o que as pessoas querem ouvir no momento, que estou meio na contramão de tudo, apesar de não me importar muito com esse retorno;, enfatiza.

Para Bruno Soares, de apenas 19 anos, que aos 17 anos publicou seu primeiro livro de poesias, o que atrai e inspira são a proximidade cada vez maior com outras expressões artísticas, como a música e as artes plásticas. ;Há muito tempo, a poesia já saiu desse lado só da literatura. Ela se encontra muito com as outras artes, ou até mesmo com a comunicação visual. Hoje, você consegue ir muito mais além do que antigamente;, salienta.

Já Gabriela Ziegler, 16 anos, que tem a poesia no sangue ; ela é filha dos poetas Francisco Kaq e Ana Paula Ziegler ; conta que busca inspiração nos mais diversos temas, como a natureza, o amor, a vida e até sobre Brasília e o cerrado. A garota começou a escrever poesias assim que foi alfabetizada, por volta dos 6 anos, e lançou seu primeiro livro quando tinha apenas 13. Ela admite que ainda não tem um estilo próprio. ;Faço algumas rimas, tem uma certa métrica, mas são versos livres;, diz.

Caldo de sotaques

E será que a cidade de concreto projetada por Oscar Niemeyer combina com poesia? O mercado aqui é promissor? Para a poetisa Carla Andrade, 32 anos, que é mineira, mas mora em Brasília há quase uma década, o mais interessante na cidade é que, pelo fato de ela ser a capital do país, reúne gente de todos os lugares e, por isso, há uma poesia peculiar por aqui. ;Brasília tem um caldo de sotaques, de vários cantos do Brasil. É uma síntese do que tem de qualidade no resto do país e isso faz da poesia daqui bem especial;, acredita. ;A capital tem uma vida poética intensa. Percebo isso muito claramente, ainda mais aqui que tem poetas de tudo quanto é lugar;, acrescenta a poetisa Gabriela Ziegler. Bruno Soares também é da teoria de que a cidade tem um grande potencial, mas se queixa do restrito mercado editorial brasiliense. ;Temos grandes e bons poetas, mas falta visibilidade.;