Fábio Jr., quem diria, é um cara caseiro, que quando sai é para trabalhar ou ir ao sÃtio, ouvir
moda de viola e pescar. Por isso, não estranhe quando escutar a voz dele por aÃ, em clássicos
caipiras, como Estrada da vida, Cabecinha no ombro e Rio de Piracicaba. É ele
mesmo, o cantor popularÃssimo que há três décadas interpreta músicas de amor - e regrava,
regrava, regrava - e que agora decidiu fazer de seu 25º disco, Romântico, um CD...
sertanejo. E não é que ficou bom?
Sem carregar nos tons (agudos), Fábio Jr. aposta num repertório de "classicões", como ele diz, de
músicas que o emocionam, que gosta de cantar em casa (e ouvir no sÃtio que tem há 20 anos, perto
de São Paulo). Com mais acertos do que erros (o inverso dos últimos álbuns), interpreta à sua
maneira pérolas do campo, como No rancho fundo, de Lamartine Babo e Ary Barroso, e
Amizade sincera, de Renato Teixeira. "Meu xodó é Cabocla Tereza, que meu pai
adorava", conta ele, que também gravou os hits Fio de cabelo, É o amor e Telefone
mudo.
Pode parecer engraçado, mas Fábio se sai melhor no repertório sertanejo do que nas quatro
regravações que escolheu, fora do universo caipira, para o novo trabalho. Alma gêmea,
segundo ele, só entrou (de novo) porque teve o andamento mudado, "ficou mais intimista, mais
simplezinha, na praia do resto do CD". Amar é perdoar, versão de Don%u2019t know why feita
por Sylvia Massari (também autora da outra versão do disco, de When a man loves a woman,
traduzida para Quando um homem se apaixona), ele explica que foi a música que lhe fez achar
o caminho para os arranjos do álbum. Ok, mas entre as quatro estranhas no ninho, a melhor é
Românticos, de Vander Lee.
Prestes a completar 56 anos (no próximo dia 21), Fábio Jr. diz que o tempo lhe trouxe serenidade
para lidar melhor com tudo - a carreira, os cinco filhos, o sexto casamento. "Estou numa fase boa,
animado com a vida", garante o cantor, que vive na estrada e fazia um tempo que não dava
entrevistas, embora se considere low profile para essas coisas de paparazzi e celebridades. "Imagina
se vou me incomodar com fofoca... Tem coisa mais importante na vida."
Sem nenhuma vontade de voltar para a tevê, ele hoje se emociona vendo os filhos na televisão -
Fiuk é o novo protagonista de Malhação; Cléo Pires teve seu melhor momento como Surya, na
novela Caminho das Ãndias. Também se entusiasma ao ver a renovação do público em seus
shows. "As mães agora levam as filhas, já, já estão levando as netas. Isso dá um gás, um
fôlego que... nossa"
Cinco perguntas
Você quis fazer um disco sertanejo, mas incluiu uma música do Vander Lee (Românticos) e
duas versões (de Don%u2019t know why, conhecida na voz de Norah Jones, e When a man
loves a woman) que não fazem parte do universo caipira. Por quê?
Na verdade, a gente achou o caminho do disco com Amar é perdoar, a versão da música da
Norah Jones. Quando Guto (Graça Mello, o produtor) trouxe uma demo para eu ouvir, falei: "Véio"
Engraçado, foi ali, com a música de uma artista supercontemporânea, que encontrei o jeitão de
cantar, os arranjos e tudo mais do disco. Porque os classicões sertanejos, a maioria é cantada em
duas vozes desde o inÃcio. E eu ficava: meu Deus, como resolver isso? Quando achei o caminho,
substituà (a segunda voz) pelos quatro vocalistas, numa linha mais pro gospel, pro spiritual. Deu
certo, graças a Deus.
As pessoas não estranharam quando você disse que faria um disco sertanejo?
O Guto estranhou, e ele me conhece há 30 anos: "Pô, será que seu público vai entender?. E será
que os sertanejos não vão ficar meio assim?" Ah, meu deus do céu, mas será que não posso cantar
as músicas que gosto de ouvir? E são clássicos, músicas que um monte de gente já regravou. Por
que eu não posso regravar? Recebi o disco agora, no último fim de semana. Não sei se alguém (um
dos sertanejos) já ouviu, mas queria escutar a opinião deles.
Você se sente mais à vontade fazendo um disco de intérprete?
Não. Já, já vai sair um de inéditas, quase de autor, só não sei quando. Mas eu gosto de
cantar, essas são músicas que gosto de ficar cantarolando em casa. Na hora em que a gente foi
pesquisar, falei, meu Deus, é um universo infinito! Para você ter uma ideia, a gente escutou umas
500 músicas. Dava para fazer uns 20 discos. Foi um parto escolher o repertório.
Seu filho Fiuk agora é mocinho de Malhação e tem uma banda, a Hóri%u2026 De certa
forma, repete um pouco sua história, não?
Ah, é demais, né? O moleque fez 19 anos no mês passado e já saiu com as duas carreiras, de ator
e de cantor e compositor. Também está no novo filme de LaÃs Bodanzky, que vai sair no ano que vem
(As melhores coisas do mundo). Ele morava comigo desde os 13 anos, se mudou para o Rio em
outubro por causa de Malhação. Chorei muito quando o vi na televisão. Foi impressionante
ver o moleque ali. Gostei pra caramba. Quando a Cléo (Pires) estreou, também foi assim. Nossa, que
emoção!
Você tem vontade de voltar para a televisão, como ator ou apresentador?
Não, não tenho. Foram três anos seguidos como apresentador, caramba. Como ator, também não
penso, não. Não digo que nunca mais vou fazer, a gente nunca sabe, mas não é algo que eu tenha
em mente.
De Uncle Jack a cantor caipira
Paulistano do Brooklyn, filho de um taxista e uma professora de piano, Fábio Corrêa Ayrosa
Galvão, quando adolescente, revezava-se com os irmãos, Heraldo e Danilo, na banca de jornal do
pai. Nas horas vagas, os três mandavam brasa no grupo vocal que eles criaram naquele fim dos anos
1960 - e que conseguiram mudar de nome três vezes em apenas três anos: Os Colegiais, Os Namorados,
Bossa 4 e Arco-Ãris. "A gente brigava um pouquinho, sim. Até porque era uma banda de irmãos. Mas
o resultado era muito legal", comenta ele, que começou a compor nessa época, por volta dos 15
anos, e gravou sua primeira música no lado B do compacto de Os Namorados.
Quando se lançou em carreira solo, em 1972, Fábio usava o pseudônimo Uncle Jack. Em 1973, já era
Mark Davis. Bem no espÃrito dos tempos, cantava em inglês para o público pensar que era
norte-americano, "coisa fina". "Embromation, né?", lembra às gargalhadas o cantor, que assinou em
1976 seu primeiro LP como Fábio Jr. (o Júnior foi acrescido ao nome para que não o confundissem
com o cantor Fábio, sucesso na época). Pouca gente conhece esse disco. Virou raridade. O detalhe
interessante: a maioria das faixas foi composta em parceria com Paulo Coelho.
De lá para cá, foram 25 discos. Nos primeiros, ele ainda apostava mais nas próprias
composições, nas inéditas. Os últimos foram de regravações (Fábio Jr. e elas,
Minhas canções, Ao vivo, Acústico%u2026). "Acabei emendando um projeto no
outro", justifica o cantor, que nem tinha o CD sertanejo como sonho antigo. "Deu vontade e fiz. O
que tenho em mente já há algum tempo é um disco de autor", adianta ele, que já vem tirando do
baú umas músicas inéditas (ou pedaços delas), retomando a parceria com Sérgio Sá (de O que
é que há e Eu me rendo) e estreando outras, com nomes como Aldo Gouveia e Márcio
Cruz, vocalistas de sua banda. "Gosto de compor com parceiros. Quando um pedaço da letra ou da
melodia enrosca, eu passo o pepino para eles", ri.
Raridades
As oito canções de Fábio Jr. e Paulo Coelho gravadas no LP de estreia do cantor são muito pouco
conhecidas: Nós, os filhos, Coisas de agora, Agora chega, Bicho de sete
cabeças, Novos tempos, Se saudade matasse, Tua idade e Já são
quinze para as sete. E não dá vontade de regravá-las? "TaÃ, é uma ideia que você está
me dando", diz Fábio. "Foram músicas que não fizeram sucesso, vão soar como inéditas."
Ouça trecho da música Rancho Fundo com Fábio Júnior