O camarim da atriz Tauana Barros não tem paredes, teto, portas, mobiliário ou requintes de grandes teatros. Postada diante do espelho retrovisor da Kombi estilizada da companhia Roupa de Ensaio, a garota de 18 anos retoca a maquiagem. Em minutos, já está pronta para encarar o palco da rua com o espetáculo recheado de crítica social A peleja do vaqueiro Benedito contra o capitão João Redondo e a cobra Madalena. O texto de Futuka Ferreira é mais um do repertório do grupo fundado pela mãe de Tauana, Marília Abreu, e pelo pai, Miguel Mariano. Maria Clara, 6 anos, completa a trupe.
A família mabembe e outros artistas fazem parte do conselho de cultura de Samambaia. Mesmo não existindo oficialmente, a entidade se incumbiu da tarefa de espalhar arte por todo canto da cidade. Uma das ações do grupo é o Sarau Complexo Itinerante. "Samambaia até hoje não tem absolutamente nenhum espaço destinado à cultura. Organizamos esse encontro para engajar a população pela luta por esse espaço físico", explica Marília.
Toda última sexta-feira de cada mês, artistas inscritos com antecedência se apresentam em alguma rua da cidade. Os moradores retribuem a gentileza levando filhos, netos e algo mais: uma cadeira. "Nós alugamos algumas cadeiras, mas não dá para todo mundo. Então, pedimos que a população traga de casa", diz Marília.
Com todo mundo sentado, o rapper da cidade Markão Aborígine fazia às vezes de mestre de cerimônia anunciando atrações como o poeta Luiz Vieira e os versos da poesia Samambaia "em homenagem à cidade que há 20 anos me tirou do pesadelo do aluguel". Também entrou em cena o Fumaça, "o mágico mais gente fina do mundo", garantia dada pelo próprio ilusionista. Quem se empolgou com os truques foi o garoto Davi Mota Silveira, 10. "Vou pedir para os meus pais sempre me trazerem", prometeu.
A noite avançava quando o grupo de street dance Deliriu%u2019s ocupou a área de asfalto transformada em palco. O nome da companhia de dança, formada em sua maioria por rapazes, explica boa parte da histeria das meninas da plateia. "Lindoooos", foi o adjetivo mais inocente bradado em alto volume pelas garotas. As atrações ainda incluíam bandas de forró, rock e reggae.
A professora universitária Jussara Seidel, 41, trabalha como coordenadora pedagógica da ONG Vida e Juventude, cuja sede na QR 510, Conjunto 16, foi emprestada para a realização do evento da última sexta-feira. Naquela noite, porém, Jussara chegou acompanhada do marido, Daniel Seidel, e das filhas, Isabela, e Júlia. "Essas ações de cultura são importantes pela perspectiva de contribuir para uma melhoria da região", afirmou.