Ainda na adolescência, o ator e diretor Bruno Torres, 29 anos, viu-se revoltado com o cinema narrativo norte-americano. A insatisfação, segundo ele, fruto do excesso de juventude e deslumbramento com a própria arte cinematográfica, foi acalentada pelo conselho do pai, Geraldo Moraes, 70 anos, que, ao citar a vanguardista francesa Germaine Dulac (1882 %u2013 1942), o tranquilizou: "O cinema é a música da luz". "Ela defendia a ideia de que o cinema deveria passar sensações. Essa frase define muito o meu estilo de trabalho", compara Bruno, que desde cedo acompanha Geraldo pelos sets de filmagens. "Guardo esse ensinamento como um tesouro", emenda. Embalados pelo tempo, pai e filho construÃram relação de cumplicidade profissional rara no cinema brasileiro. Esse resultado explode agora nas telas do Cine BrasÃlia, dentro da mostra competitiva da 42ª edição do Festival de BrasÃlia do Cinema Brasileiro. Moraes com o longa O homem mau dorme bem; Bruno Torres com o curta-metragem A noite por testemunha. "Isso um dia aconteceria", ri o filho. "Estou numa idade que não acredito mais em coincidências. Mas em sincronicidade", observa o pai. "Já faz bastante tempo que trabalhamos juntos, um acompanhando o trabalho do outro, sempre nos ajudando. Esse encontro no festival só vem coroar essa cumplicidade. Estou muitÃssimo feliz por isso ter acontecido, emocionado mesmo", destaca Moraes. Outro detalhe que perpassa essas duas identidades cinematográficas é o encontro de gerações promovido dentro de espaço que, desde 1965, tem sido importante polo de debates tanto na esfera cultural quanto polÃtico-social. Por mais de 20 anos professor de cinema da Universidade de BrasÃlia (UnB), o expansivo Moraes tira de letra o embate que trava há anos com várias gerações. Explica que essa aproximação é facilitada pelo interesse incessante em acompanhar a evolução técnica do cinema promovida por jovens cineastas independentes, como o seu filho. "Sempre tive na vida uma ligação próxima à s novas gerações. Aprendi a ser acessÃvel aos jovens e me obrigava a um processo permanente de atualização", conta. "Geraldo é uma pessoa generosa, um cara que está sempre aberto à s propostas", concorda Bruno, que se tornou parceiro do pai em alguns de seus projetos. "Essa aproximação com os jovens realizadores permite-lhe sempre renascer com pulsação diferente", observa. Prova dessa interferência mútua pode ser conferida, por exemplo, no processo de criação de O homem mau dorme bem, longa de Moraes que interrompe um hiato de 10 anos longe dos sets de filmagens. "Bruno é uma pessoa identificada com o projeto desde o inÃcio. O roteiro nasceu de várias conversas que tivemos sobre os trabalhos independentes e alternativos", revela o diretor, que não hesitou em escalar o filho para um dos papéis do filme que classifica como road movie. "O Bruno está no filme não por ser meu filho, mas por mérito próprio. Quem for assistir verá como o trabalho dele é maravilhoso", elogia. "Faço um personagem bastante interessante e que me proporcionou uma emoção que poucas vezes senti como ator. Isso se deve à confiança que ele depositou em mim", agradece. Ouça entrevista com o diretor Geraldo Moraes Ouça entrevista com o ator e diretor Bruno Torres