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Voz das minorias vence o Prêmio Nobel de Literatura

Nem o israelense Amós Oz nem a argelina Assia Djebar e nem a norte-americana Joyce Carol Oates. Mais uma vez a Academia Sueca descartou os favoritos e optou pela surpresa, indicando a escritora romena de origem alemã Herta Müeller, de 56 anos, como vencedora do Prêmio Nobel de Literatura de 2009. Ela é a décima quinta mulher a ganhar o Nobel de Literatura e receberá a quantia de US$ 1,4 milhão. Herta só tem um livro publicado no Brasil, o romance O compromisso (Ed. Globo), que narra a história de uma operária da indústria têxtil perseguida pela polícia secreta romena. Mais uma vez, também, a Academia utilizou o critério político como referência para a decisão de atribuir o prêmio. A obra de Herta expressa a realidade dramática das minorias da Alemanha e dos países da Europa Central, após o fim da Segunda Guerra Mundial, assoladas pela herança autoritária do comunismo em seus países. No anúncio do porta-voz da Academia Sueca, Herta é definida como ;alguém que, com a concentração da poesia e a franqueza da prosa, retrata a paisagem dos desfavorecidos;. A carga autobiográfica é forte na obra da escritora. Ela nasceu em uma família de alemães, que constituem uma das minorias da Romênia, e, durante a adolescência, estudou filologia alemã e romena simultaneamente, tentando estabelecer uma conexão entre as duas culturas. Perdeu o seu primeiro trabalho, de tradutora em uma fábrica de máquinas, ao entrar em conflito com o aparato repressivo da ditadura de Nicolae Ceausescu, por se negar a colaborar com o serviço secreto da Romênia comunista. [SAIBAMAIS]O embate com as forças repressivas prosseguiu com o lançamento do primeiro livro, publicado em 1982, uma coletânea de contos intitulada Niederungem, logo censurada pelo governo comunista da época. A história principal de Niederungen narra as agruras dos alemães desgarrados na Romênia, desfigurados do ponto de vista econômico e moral. O drama ganha ainda mais intensidade pelo fato de ser narrado sob o olhar de uma criança: ;Não suportamos os outros nem nos suportamos a nós mesmos, e os outros nos suportam menos ainda;, afirma a menina narradora. Intolerância Ao ser publicada na Alemanha, em 1984, a versão do livro de estreia conquistou muitos leitores e mereceu generosos elogios da crítica. Na sequência, ela publicou Oppressive Tango, em que volta a tratar o universo da corrupção, da intolerância e da opressão em um pequeno povoado de língua alemã. Com o seu oficialismo, a imprensa romena desfechou duras críticas à obra, mas, novamente, o livro teve uma recepção muito positiva da crítica e dos leitores em outros países europeus de fala alemã. Contudo, os conflitos com o governo romeno obrigaram Herta e o marido a fugirem para a Alemanha em 1987. Sobre eles pairava o medo da truculenta polícia secreta romena. A mudança para a Alemanha proporcionou condições para que Herta entrasse em um ciclo muito fértil de produção, aprofundando e detalhando a radiografia crítica sobre a opressão provocada pelos regimes de força na Romênia. No seu romance mais recente, Atemschaukel, Herta tematiza a experiência dos romeno-alemães nos campos de trabalhos soviéticos. A história é narrada a partir do ponto de vista de um jovem de 17 anos. Na obra, a escritora rompe com o silêncio de sua mãe e de inúmeros romenos-alemães daquela geração que jamais se dispunham a falar sobre o que se passou nos campos de trabalho soviéticos. É que os alemães se sentiam culpados pela sua cumplicidade com o nazismo e queriam se redimir participando da reconstrução da União Soviética. O escritor Marcelo Backes organizou e traduziu a coletânea de contos Escombros e caprichos (L), que incluiu um conto de Herta. Ele considera a escritora uma outsider no mundo literário alemão: ;Ela é uma escritora muito boa, vigorosa, marcadamente poética. Algumas vezes, com toques surreais, mas apenas para revelar o absurdo da realidade. Trata de questões fundamentais, mostra o que significa viver sem pátria nos dias de hoje. Todas essas razões tornam a escolha muito justa;.