Um é de Carangola e o outro de Laranjal. Ambos mineiros, mas com longa vivência no Rio de Janeiro e ligados ao samba, tornaram-se portelenses. Tempos depois, em meados da década de 1970, conheceram-se em Brasília, e graças ao samba tornaram-se amigos e fieis às cores azul e branca, mas agora sob a bandeira da Associação Recreativa Unidos do Cruzeiro (Aruc), a escola de samba campeoníssima.
Manoel Frederico Soares, o Manoel Brigadeiro, 87 anos, e Carlos Elias da Cruz, 76 anos, são figuras de destaque na música da cidade e legítimos representantes da tradição do samba ao qual têm dado importante contribuição. Hoje, no final da tarde, os dois vão ser homenageados durante a 13ª edição da Salve a Pátria, festa cívica cultural promovida pelo Café da Rua 8, na 408 Norte.
A Aruc, localizada no Cruzeiro Velho, é um elo entre Brigadeiro e Carlos Elias. Sabedores que a escola de samba brasiliense havia sido batizada pela Portela, passaram a frequentá-la. Mas hoje a presença dos dois na agremiação se dá de forma esporádica, porém, o vínculo se mantém. "Recentemente, recebi convite para integrar o conselho deliberativo da escola, o que muito me honra", revela Elias, orgulhoso.
Brigadeiro chegou primeiro à capital. Veio para cá em 1974, transferido do Rio, como servidor do Ministério dos Transportes. O apelido ele trouxe da juventude e lhe foi dado por trabalhar diretamente com o brigadeiro Guedes Muniz, na Fábrica Nacional de Motores, em Petrópolis (RJ). A música entrou em sua vida aos 18 anos, coincidentemente quando "descobriu" a Portela.
Mas demorou para compor seu primeiro samba. "Eu tinha 30 anos quando compus
Eu não vou pra casa. Meu maior sucesso, porém, foi
Tem bobo pra tudo, na voz de Carmem Costa. Essa música, feita em parceria com João Correia da Silva, foi gravada, também, por Isaurinha Garcia, Jair Rodrigues. Consegui destaque, também, com
É problema seu, em gravação de Alcides Gerardi", lembra.
Autor de quase 100 composições, o agora aposentado Brigadeiro continua escrevendo suas músicas. O único disco que gravou, um CD, foi lançado em 1998, no qual incluiu
Cidade maior, classificada em segundo lugar num festival de músicas carnavalescas, 18 anos antes. "Dividi esse disco com Julinho do Samba, um saudoso amigo, que era meu vizinho de quadra na Asa Norte", comenta o veterano sambista, ex-presidente da Associação das Escolas de Samba de Brasília e detentor do título vitalício de Embaixador do Carnaval de Brasília.
Sambista na essência, quando chegou à cidade, em janeiro de 1975, Carlos Elias logo quis contribuir com a ainda incipiente vida artística local. Junto com Paulo Brandão, servidor do Banco Central, abriu a Camisa Listrada, casa de show que funcionou por algum tempo na antiga Galeria Ouvidor, no Setor Comercial Sul. Três anos depois fundou o Clube do Samba, que passou a funcionar no Teatro Galpão.
Em 1981, foi além ao criar a Feira de Música, que se instalou inicialmente no Teatro Galpão, passando depois para o Teatro Garagem, na 913 Sul. "Quando a feira passou para o Garagem eu tinha ido morar na França, onde fui servir no consulado brasileiro em Marselha e posteriormente na embaixada, em Paris. Lá, fiz algumas apresentações no restaurante Favela Chic", recorda-se.
Enredo
Na vinda do Rio para a capital, Carlos Elias já trazia uma bagagem artística considerável. Logo depois de entrar para a Portela, no final dos anos 1950, ocupou os cargos de diretor social e de relações públicas. Passou também a dirigir o conjunto de show. Em 1962, foi parceiro de Zé Kéti e Marques Balbino em
Rugendas %u2014 Viagem pitoresca através do Brasil, samba enredo que levou a escola de Madureira ao título de campeã do carnaval carioca.
Compositor com mais de 40 músicas, Elias é autor de, entre outras,
Carnaval, gavada por Paulinho da Viola;
Canção da primavera, registrada em disco por Nara Leão; e
Homenagem a Nelson Cavaquinho, sucesso na voz de Beth Carvalho. "É um privilégio ter sido gravado por essas figuras importantíssimas da MPB", comemora.
Aqui, Elias escreveu, por exemplo,
Samba para um sambista maior (em homenagem a Cartola) para o grupo Samba & Choro;
Imagens do passado (feita com Daniel Jr. e Josias dos Santos), gravada por Célia Rabelo; e
Para conhecer o Brasil (com Daniel Jr. e Eugênio Monteiro), segunda colocada no Prêmio Sesc de Música, de 2006, e interpretado pelo grupo Toque de Salto.
"Atualmente, produzo shows de samba, que têm sido apresentados no Teatro do Sesc, na 504 Sul; no Clube do Choro, Feitiço Mineiro, Biblioteca Demonstrativa de Brasília. Estive à frente, também, de um show na Embaixada da França, como parte do Ano da França no Brasil", diz esse nome tradicional do samba, com o conhecido e invejado entusiasmo juvenil.
Salve a Pátria
A festa cívica cultural Salve a Pátria, que o Café da Rua 8 promove hoje, na 408 Norte, chega à 13ª edição, com uma programação extensa, que tem início às 14h e prossegue até as 21h. Durante o evento, serão homenageados, com a entrega de placas comemorativas dos 13 anos do estabelecimento, figuras de destaque das artes em Brasilia %u2014 entre eles, Manoel Brigadeiro e Carlos Elias (samba), Reco do Bandolim e Evandro Barcelos (choro), Mestre Teodoro (bumba-meu-boi) e Seu Estrelo (folcore).
Na abertura da programação, haverá a lavagem da rua, apresentação circense e de capoeira, com Mestre Isquizito. Em seguida, um show variado vai reunir Mara (dança do ventre), Liga Tripa, Célia Porto e Rênio Quintas, Jaime Ernest Dias e Luliana Gayoso e Eduardo Rangel; exibição do curta-metragem
Lauro-Davidson %u2013 O filme; execução do Hino Nacional com guitarras.
De acordo com Eva Pimenta, organizadora da Salve a Pátria, no fechamento da programação vão se apresentar os grupos Tersamba e Maracangalha, Nika Macedo e a sanfoneira Dona Gracinha e as bandas CCE, Pacato Cidadão do Alto, Ha Ono Beko e Os Tios, e Brazilian Blues Band. O aceso é gratuito e a festa tem classificação indicativa livre.