Jornal Correio Braziliense

Diversão e Arte

Leia techo do livro Um náufrago que ri

Trecho de Um náufrago que ri, de Rogério Menezes

"Eu estou lá. Vejo-me assim: elegantemente deitado às margens de pequeno lago de belo parque de luminosa cidade. À contraluz do sol de final de tarde de quase dezembro, assemelha-se àquele laguinho feito-com-espelho-e-areia-de-rio que ocupava lugar de destaque no presépio natalino da senhora Teodora Martiniano, mãe do senhor Antonio Martiniano.

(Era aquele presépio algo tropicalista o objeto de culto daquele menino gorducho que habitava um dos cus-do- mundo; esse cu-do-mundo ficava mais exatamente no agreste pernambucano ; na verdade, mais tarde acharei essa expressão algo chula tremenda redundância e concluirei: o mundo, em si, é, sim, um grande cu ; e aquele menino gorducho ansiava dezembro chegar e, junto, o encantamento de flagrar o desvario da fantasia materna, a misturar tudo em gloriosa geléia geral: casinhas feitas de caixas de fósforo e papelão, bois, vacas, elefantes, galos, cavalos, árvores, laguinhos, automóveis, bonecos, bonecas. Tudo. Tempos felizes. Ele me contou ; ele me contava tudo ; absolutamente tudo.)