Após dois anos de pesquisa que incluiu, além da leitura de todas as publicações sobre o sanfoneiro, visitas aos locais por onde passou e conversas com personagens que o viram no palco, o escritor passou tudo para o papel com a intenção de ressaltar a força de vontade que sempre guiou o músico. ;Tento mostrar ao jovem o que o biografado fez para alcançar seus objetivos. No caso do Gonzaga, mostro as dificuldades, mas também a força de vontade que, se ele não tivesse, não teria conseguido tudo o que conseguiu.;
Essência
No entanto, o escritor não se prende a roteiros cronológicos. A leveza de O jovem Luiz Gonzaga vem dos saltos no tempo praticados pelo autor, que narra como se estivesse presente nas cenas descritas e devota especial atenção à infância do sanfoneiro. ;O mais importante foi a vivência dele em Exu, onde conseguiu captar toda a essência de sua vida. Essa primeira infância foi fundamental. Ele aprendeu a tocar enquanto escutava o pai e depois usou isso na sua música. Em outro momento importante, ele foge de casa e vai para o Exército. Lá, aprendeu alguma coisa no sentido de conhecer o mundo e viajou muito pelo Brasil.; Mais tarde veio o sucesso. Para consegui-lo, Gonzaga percorreu caminhos tortos. No Rio, participava de concursos de rádio como sanfoneiro. Não tocava o forró pé-de-serra, sua marca e melhor performance, mas um repertório colhido em outros universos. Tango e outros ritmos costumavam pautar suas apresentações até resolver mostrar as suas raízes nordestinas. Foi então que o nome de Luiz Gonzaga ganhou o Brasil.
O sucesso veio acompanhado de altos e baixos. Jatobá conta que o sanfoneiro nunca entrou em baixa no Nordeste. Nas metrópoles, era diferente. Se não estivesse na mídia, acabava ignorado. ;De repente ele desaparecia e depois reaparecia. Nos anos 1970, as universidades redescobriram Gonzagão, mas o auge foi nos anos 1950 e 1960. Mesmo assim, ele sempre viajava pelo interior do país, tocava em cinema, praça pública, circo, onde tivesse lugar para se apresentar.; O mais precioso na figura do compositor, no entanto, era generosidade. ;Era um cara brincalhão e solidário com todo mundo. Não deixou grandes fortunas porque dava tudo. Se encontrava um cara com talento tocando nas feiras, mandava ele para a própria casa, no Rio. E tinha uma preocupação muito grande com a sua cidade de origem.;
; 1 - EXU
Gonzaga nasceu em dezembro de 1912 na fazenda Caiçara, no município de Exu, interior de Pernambuco. Hoje a casa é um museu e Exu abriga um centro cultural chamado Asa Branca, em homenagem à música mais conhecida do compositor.
; Lei trecho do livro O jovem Luiz Gonzaga
"Manhã de sábado, 18 de junho de 1988. Uma camioneta Chevrolet Veraneio 1984, de cor bege, cruza a ponte Presidente Dutra ; a divisa das cidades de Petrolina, em Pernambuco, e Juazeiro, na Bahia. Sopra um vento frio vindo das margens do rio São Francisco, de época de inverno, mas o calor que chega de outra direção, das terras áridas da caatinga, ao norte, logo vai aquecer o asfalto da estrada de rodagem.
Os cinco passageiros que lotam o veículo são músicos. Entre eles está Luiz Gonzaga, o mais famoso sanfoneiro do país, que vai se apresentar à noite na abertura das festas juninas de Senhor do Bonfim, a cerca de 120 quilômetros de distância. A Veraneio segue devagar. Desde que sofrera dois acidentes de carro, muitos anos atrás, Gonzaga sempre reclama quando o motorista pisa forte no acelerador.
Depois da ponte Presidente Dutra, já em terras da Bahia, a Veraneio entra na BR-407. O carro roda deixando para trás a cidade de Juazeiro. Sentindo um ligeiro mal-estar, Gonzaga aprecia a paisagem à beira da estrada, ali de extrema penúria.
; Aqui é pior do que Exu ; comenta.
Um dos músicos gargalha.
; Pensa que é brincadeira?
A estrada corta o meio da caatinga, de vegetação árida, de solo seco e pedregoso. De vez em quando, se vê um bode ou uma cabra que pasta perto do acostamento ou um raro pássaro em busca de água e comida.
; Se Exu fosse assim eu não teria sobrevivido ; diz Gonzaga.
O carro passa por um entroncamento, à esquerda, que segue para as minas de cobre da Caraíba Metais.
; Por ali dá para se chegar a Euclides da Cunha1. E também em Canudos, terra do Conselheiro ; ensina Gonzaga, que conhecia meio mundo ; Sem asfalto, estrada de terra.
Bem mais adiante, os passageiros cruzam com a pequena cidade de Jaguarari, próxima a Senhor do Bonfim.
Dali em diante, a natureza muda de água para vinho. Em lugar de chão pedregoso e vegetação catingueira, surgem terras férteis, morros verdejantes, nessa hora cobertos de nuvens de chuva.
; Exu é assim ; diz Gonzaga, depois gargalha e aponta o dedo para o agrupamento de morros e grotas da serra do Gado Bravo, extensão da Chapada Diamantina, na cordilheira do Espinhaço, e segue em direção a Minas Gerais.
; Pé de serra.
A Veraneio passa pela rodoviária de Senhor do Bonfim.
; O movimento aqui já está grande ; diz um dos músicos.
; À noite o show vai lotar ; completa Gonzaga.