O Custo Brasil é um dos maiores vilões da perda de competitividade do país no cenário internacional, de acordo com o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. Ele cita estudos mostrando que a carga tributária elevada, a burocracia e a infraestrutura logística desatualizada e ineficiente acabam encarecendo o produto manufaturado brasileiro, em média, 30%, deixando-o menos competitivo no mercado global. Essa realidade faz com que, apesar de o país estar entre as 10 maiores economias do planeta, não figure no ranking dos maiores exportadores do mundo, na avaliação do especialista.
“O Custo Brasil foi subindo, subindo, subindo. Cada vez que tinha uma crise no estado e no governo federal, se aumentavam imposto e sobretaxas, e perdíamos competitividade. Por isso, nosso problema é totalmente interno. Se o mundo crescer amanhã, podemos aumentar as exportações de commodities, mas não a de manufaturados”, afirma. Para ele, a alta carga de impostos, que crescia a cada crise dos governos e que faz parte desse Custo Brasil, deixa os produtos de maior valor agregado sem espaço no cenário externo, extremamente competitivo.
Básicos
De acordo com dados do presidente da AEB, o volume exportado do país passou de 244 milhões de toneladas, em 2000, para 708 milhões de toneladas, em 2018, um salto de 190%. Mas esse comércio é dominado por commodities, de baixo valor agregado. Desse total registrado no ano passado, 605 milhões de toneladas foram produtos básicos, ou seja, 85,4%. Já os manufaturados, representaram 6,9%, ou seja, 49 milhões de toneladas. “Sempre digo que o Brasil é um país exportador de peso, no duplo sentido. De peso-pesado, não em termos de importância”, lamenta. Na avaliação de Castro, se a economia global desacelerar, como está sendo previsto a partir deste ano, a tendência é de que as exportações de manufaturados diminuam, assim como as de commodities. “Esse é um cenário que não podemos mudar”, explica.
O presidente da AEB reforça que a mudança do Brasil passa pelas reformas estruturais que estão na agenda do novo governo. Ele destaca que o país também precisa ter um novo posicionamento no cenário internacional, com mais agilidade nos acordos bilaterais “que tragam vantagens”. “Sem o dever de casa, a solução é rezar em mandarim”, resume, lembrando que, nos anos 1980, a China tinha uma participação no mercado externo parecida com a do Brasil, mas hoje é a maior exportadora global. Enquanto isso, o Brasil continua estacionado com 1,2% das exportações mundiais, e com uma parcela menor ainda do mercado dos manufaturados, que é praticamente a metade: 0,6% do total vendido no planeta. “O mundo cresceu, e nós paramos no tempo. Estamos observando o mundo sem fazer nada. Relegamos os manufaturados ao segundo plano”, lamenta. Ele ressalta que, enquanto o Brasil cresceu 16% desde os anos 1980, a China cresceu mais de 1.500%; a Coreia do Sul, 300%; e a Índia e o México, 400%.
Em meio a esse baixo nível de competitividade, o presidente da AEB acrescenta que o número de empresas exportadoras não mudou nos últimos anos, nem durante a recessão do país entre 2015 e 2016. “Naquele momento, se esperava que o país buscasse o mercado externo devido à retração do mercado interno, mas essa mudança não aconteceu por conta das dificuldades que uma empresa tem para colocar seus produtos no mercado externo”, resume. “A cultura exportadora, nós temos, mas não temos é competitividade. Se houvesse condições, todos exportariam. Na crise, na realidade, o país não voltou a exportar produtos manufaturados, porque não tinha preço competitivo.”
Risco
Castro também frisa um dado importante e que precisa ser levado em consideração quando o governo traçar sua estratégia de política comercial: os países que mais compram produtos acabados do Brasil são Argentina e os vizinhos latino-americanos, que também exportam commodities. Logo, se a economia global desacelerar, eles devem exportar menos, e, portanto, também importarão menos manufaturados do Brasil, como vem ocorrendo já com a Argentina, que atravessa uma crise econômica e é o principal destino dos veículos nacionais.
No entender do dirigente, para reduzir esse Custo Brasil, algumas medidas prioritárias e principais desafios para o desenvolvimento de uma agenda do novo governo com vista ao comércio exterior são: aprovar as reformas tributária e previdenciária; eliminar a insegurança jurídica; facilitar o financiamento de exportações; estimular os investimentos em infraestrutura, com concessões e privatizações para acelerar os processos e reduzir os custos de logística; e acelerar a negociação de acordos bilaterais.
Industrializados perdem espaço
No ano passado, as exportações brasileiras somaram US$ 240 bilhões, dos quais os produtos manufaturados responderam por apenas US$ 86 bilhões, ou seja, menos da metade, conforme dados mostrados pelo presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. Ele ressalta que esse item de maior valor agregado vem perdendo espaço na pauta comercial brasileira, o que é preocupante. Para se ter uma ideia, o superavit comercial da balança brasileira em 2018, de US$ 58 bilhões, foi puxado pelas commodities, que tiveram um saldo positivo recorde de pouco mais de US$ 100 bilhões no ano passado. Já a balança comercial de produtos industrializados voltou a registrar aumento no deficit, que passou de US$ 47,7 bilhões, em 2017, para US$ 67,7 bilhões, no ano passado.
“Em suma, tivemos uma perda muito grande da participação de produtos de maior valor agregado, que registraram um deficit de US$ 67,7 bilhões no ano passado (na balança comercial de produtos manufaturados). Nosso pesadelo está aqui”, alerta Castro. Ele estima que, por conta desse deficit, algo em torno de “três milhões de empregos deixaram de ser gerados”, pois a cada bilhão exportado de produto manufaturado, cerca de 50 mil empregos “qualificados” são criados.
O presidente da AEB destaca que até as exportações brasileiras de manufaturados para os Estados Unidos, que é a maior vitrine do mundo, já foram maiores. Em 2000, os EUA respondiam por 25% dos embarques nacionais e, hoje, por apenas 12%, sendo que, antes, oito de cada 10 produtos embarcados para a maior potência do planeta eram manufaturados. Atualmente, esse dado caiu para seis em cada 10.
No mercado externo, quando um produto perde espaço, recuperá-lo é muito difícil, pois a competitividade é muito grande, principalmente em um cenário de retração do comércio global. “O futuro do Brasil é o passado. Quero voltar ao passado, porque o presente é péssimo”, afirma. Ele lembra que a Coreia do Sul, um país que tinha a mesma participação que o Brasil nas exportações globais em 1980, de 0,88%, deu um salto em relação à brasileira. O país asiático exporta US$ 550 bilhões de produtos manufaturados, enquanto o Brasil, US$ 86 bilhões. “O parque fabril da Coreia do Sul não é maior do que o do Brasil, mas tem algum estímulo ou capacidade produtiva maior”, avalia.