Uma dieta vegetariana pode estar associada a um menor risco de Infecções do Trato Urinário (ITU), concluiu um estudo chinês, publicado na última edição da revista Scientific Reports. Os pesquisadores realizaram uma análise com aproximadamente 10 mil budistas taiwaneses e observaram uma menor chance de pessoas que não comem carne serem acometidas por esse problema de saúde — algo em torno de 16%. Os especialistas acreditam que alterações envolvendo as bactérias que compõem o estômago, desencadeadas pela alimentação restrita, podem ser as responsáveis por esse efeito protetivo.
As ITUs são geralmente causadas por bactérias intestinais, como a E. coli, que entram no trato urinário através da uretra e afetam os rins e a bexiga. Os autores do estudo explicam que pesquisas anteriores demonstraram que a carne é um importante depósito para cepas de E. coli causadoras de ITUs.
“Uma análise mais aprofundada constatou que a carne, incluindo aves e suínos, é o principal reservatório desse tipo de bactéria. Imaginamos, então, que pessoas que não comem esses alimentos teriam menos chances de desenvolver a infecção urinária, mas nenhum estudo, até agora, havia examinado se as dietas vegetarianas realmente podem reduzir o risco de ITU”, detalharam os autores no trabalho, liderado por Chin-Lon Lin, pesquisador da Universidade Tzu Chi, em Taiwan.
No experimento, os cientistas avaliaram a incidência de ITUs em 9.724 budistas chineses. Dos 3.040 vegetarianos no estudo, 217 desenvolveram uma ITU, em comparação com 444 casos de ITU verificados em 6.684 não vegetarianos estudados. Como principal conclusão, os pesquisadores destacam que o risco geral de ITUs foi 16% menor em vegetarianos do que em não vegetarianos.
“A dieta vegetariana (versus dieta não vegetariana) está associada a um menor risco de ITU, principalmente em homens e também em indivíduos não fumantes”, concluiu o estudo. Os autores da pesquisa pretendem, agora, investigar um universo maior de pessoas para consolidar os resultados. “Tivemos poucos participantes que tinham como hábito consumir tabaco, por isso mais análises são necessárias, mas, ainda assim, conseguimos ver também uma maior proteção em pessoas sem tabagismo”, destacaram os autores no estudo.
Os investigadores acreditam que os resultados obtidos no experimento se devem ao fato de que, ao não consumir fontes comuns de E. coli, como aves e suínos, os vegetarianos podem evitar a ingestão dessa bactéria capaz de causar ITUs. Eles também propõem que a dieta mais rica em fibras de muitos vegetarianos pode impedir o crescimento de E. coli no intestino e diminuir o risco de ITU.
“Estudos recentes descobriram que as microbiotas intestinais e fecais eram diferentes entre vegetarianos e não vegetarianos. O alto teor de fibras na dieta vegetariana pode modular a microbiota intestinal humana. A fibra é metabolizada pela microflora intestinal para produzir ácidos graxos de cadeia curta, são eles que diminuem o pH intestinal, e isso contribui para um ambiente mais equilibrado”, assinalaram os pesquisadores.
Excessos prejudiciais
Os resultados vistos na pesquisa chinesa vão ao encontro de alertas sobre o consumo exagerado de carne, que vêm sendo feitos por especialistas, segundo destacou Bernardo Romão, nutricionista e professor colaborador da Universidade de Brasília (UnB). “Temos dois fatores principais relacionados a esse tema. O primeiro é que o consumo excessivo de carne, mesmo a processada, é prejudicial à manutenção da microbiota. Além disso, sabemos que pessoas que são vegetarianas comem menos químicos e mais alimentos ricos em fibras”, elencou, acrescentando: “Isso faz com que o intestino trabalhe melhor. Tudo isso entra em sintonia com os dados vistos pelos cientistas no estudo”.
Embora considere que as conclusões do estudo chinês sejam positivas, Romão defende que os pesquisadores deveriam ampliar o universo de participantes. “Acredito que esses resultados até podem se repetir em etapas futuras, mas é importante termos um grupo com mais analisados, e também que sejam de culturas diferentes. Sabemos que os chineses têm como costume consumir mais legumes, e isso pode fazer diferença. Precisamos de um grupo mais diverso, como os americanos que consomem muito fast food, e os brasileiros, que não têm como hábito comer muitos vegetais”, completou.
Para o nutricionista, pesquisas que buscam entender melhor as diversas formas de alimentação também podem contribuir para uma conscientização da população quanto à importância do que consomem no seu cotidiano. “Acredito que um dos objetivos dos cientistas é demonstrar como a dieta vegetariana está associada à longevidade. E também mostrar como doenças, como a obesidade, hipertensão e diabetes, que estão em crescimento mundialmente, podem ser prevenidas com atitudes tão simples, como cuidar do que comemos”, frisou o especialista.