Venkatesh Murthy, cardiologista do Centro Médico Frankel Cardiovascular de Michigan, conta que a intenção da equipe era avaliar se, e como, os dados genéticos poderiam acrescentar informações já disponíveis na rotina clínica. “Acontece que nosso exame clínico padrão, incluindo a avaliação do IMC, tem, na verdade, muito mais informações para ajudar a orientar o atendimento ao paciente”, afirma o principal autor do estudo, divulgado na edição desta quarta-feira (8/1) da revista Jama Cardiology.
Os dados analisados fazem parte do Cardia, um grande projeto do National Institutes of Health, dos Estados Unidos, que avalia o desenvolvimento de doenças cardiovasculares em jovens adultos. As informações foram coletadas entre 1985 e 2010 e, recentemente, analisadas por equipes da Universidade de Michigan.
Os cientistas trabalharam com um escore de risco poligênico para calcular o risco genético de obesidade para cada participante do Cardia e, depois, compará-lo com informações sobre saúde coletadas ao longo dos 25 anos do estudo longitudinal. A escolha pelo risco poligênico se deu porque a predisposição genética à obesidade é formada por uma combinação de características de genes, e não apenas uma. Dessa forma, para avaliar o risco de surgimento da doença, é preciso considerar vários fatores do genoma de um indivíduo e combiná-los.
A análise mostrou que ter como base o IMC de uma pessoa quando ela é jovem adulta ajuda a explicar 52,3% desse mesmo índice, e, consequentemente, como ela se enquadra nos critérios de obesidade, 25 anos mais tarde. No caso do risco poligênico, a relação detectada é mais fraca. O dado na juventude explica apenas 13,6% do IMC de uma pessoa na meia-idade. Em ambas as situações, a equipe considerou a combinação de idade do participante, sexo e histórico familiar (pelo menos um dos pais) com excesso de peso.
Segundo os autores, o primeiro monitoramento, o mais tradicional, também pode explicar até cerca de 80% da variação do IMC de um indivíduo ao longo da vida, e não apenas quando ele está no início da juventude ou da meia-idade. “Descobrimos que o condicionamento físico é um melhor indicador de como será o IMC de uma pessoa ao longo do tempo do que a genética. A genética claramente tem alguma influência, mas outros fatores são mais fortes”, destaca Venkatesh Murthy.
Alerta clínico
Para o cientista, os dados servem como alerta de que a genética humana pode ser interessante em grandes estudos populacionais, mas que ainda é preciso cautela para incorporá-la à prática médica cotidiana, como o aconselhamento de pacientes. Venkatesh Murthy conta que é cada vez mais comum profissionais de saúde receberem, em seus consultórios, pessoas com um relatório genético em mãos e muitas dúvidas sobre a própria saúde. “É importante que os médicos estejam cientes dos pontos fortes e das limitações desses produtos diretos ao consumidor”, recomenda.Além disso, para o cientista, o crescente interesse por escores de risco genético levanta a discussão sobre como incorporar essas informações à prática clínica e se isso terá realmente algum efeito prático. “Se alguém disser que nasceu com maior probabilidade de ficar obeso, por exemplo, como isso mudará o comportamento dessa pessoa hoje, este ano ou 25 anos depois? Por outro lado, as pessoas que aprenderem que estão menos dispostas à obesidade ficarão mais motivadas a perder o peso que tem sido difícil de eliminar?”, ilustra. “Ainda não sabemos muito bem essas respostas”, completa.
O pesquisador admite a força da genética, que também tem uma espécie de efeito placebo. “Alguns dados dizem que, com base em uma pontuação genética, real ou não, as pessoas podem ter um desempenho melhor nos testes de condicionamento físico se forem informadas que são geneticamente mais propensas a estar em forma”, relata. “Também corremos o risco de desmotivar alguns ao dizer que a genética é contra eles, embora agora saibamos que outras associações com o IMC são mais fortes que a genética.”
Mais acessível
Para Venkatesh Murthy, a boa notícia é que o monitoramento da obesidade pode ser mais simples e acessível, comparada à decisão de rastrear o DNA. O pesquisador lembra que, geralmente, os médicos têm registrados o peso e a altura de seus pacientes ao longo do tempo, o que pode garantir o cálculo de IMCs antigos e ajudar em análises sobre a influência de fatores de risco.Autor sênior do estudo e pesquisador do Massachusetts General Hospital Cardiovascular Research Center, Ravi Shah lembra a importância de outros cuidados, também considerados triviais nos consultórios. “Embora o risco genético possa ser mais importante para indivíduos com raras causas hereditárias de obesidade, para a maioria da população em risco de se tornar obesa, recomendações universais, como alimentação saudável e rotina ativa, são importantes e devem ser revistas regularmente com a equipe médica, diz.