Ciência e Saúde

Anticorpos da mãe têm relação com síndrome provocada pelo zika, diz estudo

Constatação ajuda a explicar por que filhos de algumas mulheres infectadas durante a gestação nascem com anomalias do desenvolvimento. Há substâncias produzidas pelas mães que aumentam a capacidade de o vírus se instalar no interior das células

Paloma Oliveto
postado em 15/08/2019 06:00
As malformações fetais, como a microcefalia, acometem 5% dos filhos de grávidas infectadas pelo vírusHá pouco mais de quatro anos, o primeiro surto de zika foi confirmado no Brasil. A infecção assemelhava-se à de uma gripe, sem maiores intercorrências. Porém, quando os primeiros bebês de mães infectadas durante a gestação começaram a nascer, a comunidade médica e a população viram que não era algo tão simples assim. Cinco por cento das crianças apresentam um conjunto de anomalias do desenvolvimento, sendo a microcefalia a mais associada a esse vírus. Ainda não se sabe o porquê de nem todas nascerem com os problemas. Mas pesquisadores da Universidade de Rockfeller ; mesma instituição que, na década de 1940, isolou o micro-organismo pela primeira vez ; acreditam terem encontrado uma resposta.

Em um artigo publicado na revista Journal of Experimental Medicine, os cientistas afirmam que a explicação pode estar no tipo de anticorpos produzidos pelas gestantes em resposta à infecção. Quando o organismo é invadido por vírus, bactérias ou outros patógenos, o sistema imunológico é acionado e produz proteínas que vão lutar para expulsar o agente externo. Na análise do sangue de brasileiras que, entre 2015 e 2016, foram infectadas quando estavam grávidas, Davide F. Robbiani e Michel C. Nussenzweig constataram que há uma correlação entre a substância liberada pelo organismo e o risco de o feto ser afetado pela síndrome congênita provocada pelo zika.

Depois da epidemia de 2015/2016, que afetou 60 milhões de pessoas no mundo ; a maior parte na América do Sul ;, cientistas começaram a investigar o que causava os defeitos de desenvolvimento nos fetos. Vários fatores foram propostos para explicar o risco aumentado, como a exposição prévia ao vírus da dengue ou da chicungunha.

A ideia era que os anticorpos produzidos para combater esses vírus poderiam reconhecer o zika, mas, em vez de neutralizá-lo, ajudariam o micro-organismo a penetrar nas células maternas e romper a barreira da placenta, atingindo, assim, o feto. ;Mas por que algumas gestantes dão à luz bebês aparentemente saudáveis e outras não permanece sem resposta;, explica Robbiani, que coliderou o estudo. Testes exaustivos de laboratório invalidaram a teoria, porque não se observou diferenças significativas na atividade das proteínas fabricadas pelo corpo para lutar contra a dengue, sugerindo que o contato anterior com arbovírus não favorecia a doença congênita.

Testes em macacos

A resposta parece estar, sim, nos anticorpos. Porém, naqueles produzidos contra o próprio vírus da zika, explicam os autores. De acordo com Robbiani, ao analisar a atividade dessas substâncias, eles viram muitas diferenças naquelas produzidas pelo organismo das mães de crianças com anencefalia, comparadas às das mulheres que, embora infectadas pelo micro-organismo durante a gestação, deram à luz bebês saudáveis. Além disso, ao contrário do que se espera de um anticorpo ; brigar contra um agente invasor ;, os contra o zika reforçaram a habilidade do vírus de entrar nas células. Essa característica foi observada em testes feitos com tecidos humanos cultivados em laboratório.

As descobertas foram confirmadas em macacos infectados com o micro-organismo. As fêmeas gestantes que produziram anticorpos capazes de aumentar a capacidade de o vírus se instalar no interior celular apresentavam mais risco de dar à luz filhotes com dano cerebral provocado pelo zika. ;Embora nossos resultados só mostrem uma correlação até esse ponto, eles sugerem que os anticorpos podem estar implicados na doença fetal causado pelo zika;, diz Michel C. Nussenzweig. ;Em vez de anticorpos que protegem contra o zika, pode haver aqueles que estejam fazendo o contrário. Então, o próximo passo será descobrir quais são responsáveis por isso e de que forma promovem os danos fetais;, completa Robbiani. De acordo com ele, isso tem implicações para o desenvolvimento de vacinas. ;Uma vacina segura que seletivamente eleja anticorpos que protejam, enquanto evite aqueles que aumentam o risco de microcefalia;, explica.

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