Thaís Moura*
postado em 16/07/2019 18:00
Nas últimas 3 semanas, o Ministério da Saúde rompeu Parcerias de Desenvolvimento Produtivo (PDPs) com 7 laboratórios públicos nacionais que produzem medicamentos para o Sistema Único de Saúde (SUS), que os distribui gratuitamente a população. Noticiada hoje (16/7) pelo jornal O Estado de S. Paulo, a ação resultou na suspensão da fabricação de 19 medicamentos para o tratamento de câncer, diabetes e transplantados, que agora serão desenvolvidos por iniciativas privadas. A ruptura dos contratos preocupa profissionais da saúde e laboratórios públicos, que podem perder investimentos para a continuidade de seus trabalhos, e por isso, darão início à ações judiciais.
No entanto, o Ministério da Saúde garantiu que a medida "não gera risco de desabastecimento para a população;, e que a fase atual ;permite que os laboratórios apresentem medidas para reestruturar o cronograma de ações e atividades;. O Ministério ainda informou estar realizando compras dos medicamentos por outros meios previstos na legislação, porém não deu maiores detalhes a respeito das fontes dos produtos. "A maior parcela das PDPs em fase de suspensão sequer chegou a fase de fornecimento do produto. Outras que têm produção estão com dificuldades de atendimento à demanda para o sistema de saúde e a pasta já realiza compras por outros meios conforme legislação vigente", justifica a nota divulgada pelo órgão.
O pesquisador e professor do departamento de Farmácia da Universidade de Brasília (UnB), Rafael Santana, ressalta que, entre os 19 medicamentos em fase de suspensão, pelo menos 7 já eram fornecidos pelos laboratórios, como as Insulinas e a vacina tetraviral, para a prevenção da cachumba, sarampo, rubéola e catapora. ;O principal efeito dessa medida vai ser o aumento dos gastos do governo, isso é evidente e preocupante, tanto em relação ao fornecimento quanto aos custos, que serão significativamente maiores;, argumenta Rafael.
Rafael acredita que também há um prejuízo no rompimento de contratos em relação aos demais produtos (12), que não chegaram a serem fornecidos pelos laboratórios nacionais. "Os laboratórios públicos, quando assinam esses acordos, fazem investimentos para aumentar a planta e sua área de produção, então alguns já devem ter começado a fazer esses investimentos. Interromper esse processo é muito ruim para eles (laboratórios)", esclarece o professor. "Além de que muitos desses produtos, como o Etanercepte, são medicamentos biológicos, que custam para o SUS mais de R$ 1 bilhão fora dos laboratórios públicos. Seria uma grande economia para o futuro".
"A principal vantagem das PDPs é a redução de preços de medicamentos importantes, como o Rituximabe, para câncer, e o Trastuzumabe, para linfoma. Esses são produtos muito caros, e com o rompimento de Parcerias, nem chegaram a ser produzidos pelos laboratórios públicos. Quando o ministério interrompe esses contratos, de certa forma interrompe também a possibilidade dos nossos laboratórios dominarem essa tecnologia e produzirem por preços ainda menores", destaca o professor da UnB.
Perda de R$ 1 bilhão
Apesar do que diz o governo, a Associação de Laboratórios Farmacêuticos Oficiais do Brasil (ALFOB) prevê uma perda anual de ao menos R$ 1 bilhão para o setor e risco de desabastecimento, já que ;mais de 30 milhões dependem dos remédios em fase de suspensão;. Entre os principais laboratórios excluídos dos contratos com o Ministério estão Biomanguinhos, Butantâ, Bahiafarma, Farmanguinhos, Furp e Tecpar. ;As PDPs, nos últimos oito anos, resultaram em mais de R$ 20 bilhões em economia para o Tesouro Nacional. Elas constituem fator de Soberania Nacional, ao reduzir a dependência tecnológica e vulnerabilidade do Brasil perante a indústria farmacêutica internacional;, defende a ALFOB.
Em nota, a ALFOB destacou que a adesão à rede de laboratórios públicos deixa o SUS menos exposto a eventuais problemas de fornecimento e a variações inesperadas de preços de medicamentos no mercado internacional, assim como à "manipulação de valores por parte dos laboratórios privados". Segundo a associação, por causa da medida do Ministério da Saúde, tanto laboratórios públicos nacionais quanto Estados afetados pela decisão já começaram a promover ações jurídicas que ;buscam reparação junto ao governo federal quanto aos investimentos em estrutura, pessoal e pesquisa realizados em torno das PDPs firmadas;.
Segundo a pasta de saúde, nove dos processos se referem a medidas recomendada pelos órgãos de controle, como Tribunal de Contas da União (TCU) e Controladoria Geral da União (CGU). "Toda e qualquer parceria que estiver em desacordo é suspensa para avaliação", diz a nota. O Ministério também ressaltou as 4 fases essenciais para a continuidade das parcerias com laboratórios: proposta para avaliação; desenvolvimento do projeto e elaboração dos contratos; transferência efetiva de tecnologia e início da aquisição do Ministério; verificação da internalização da tecnologia.
As PDPs que entraram em fase de suspensão após o estágio III de desenvolvimento, com a interferência do Ministério, englobam produtos como a Insulina (NPH), a Cabergolina, Pramipexol, Vacina Tetraviral, Sevelâmer e Alfataliglicerase. Outros componentes, como Rituximabe, Infliximabe, Sofosbuvir e Etanercepte foram suspensos no segundo estágio, antes de iniciar a distribuição.
Veja a lista completa dos medicamentos em fase de suspensão:
Adalimumabe, Solução Injetável (40mg/0,8mL), produzido por TECPAR
Adalimumabe, Solução Injetável (40mg/0,8mL), produzido por Butantan
Bevacizumabe, Solução injetável (25mg/mL), produzido por TECPAR
Etanercepte, Solução injetável (25mg; 50mg), produzido por TECPAR
Everolimo, Comprimido (0,5mg; 0,75mg; 1mg), produzido por Farmanguinhos
Gosserrelina, Implante Subcutâneo (3,6mg; 10,8mg), produzido por FURP
Infliximabe, Pó para solução injetável frasco com 10mL (100mg), produzido por TECPAR
Insulina (NPH e Regular), Suspensão injetável (100 UI/mL), produzido por FUNED
Leuprorrelina, Pó para suspensão injetável (3,75mg; 11,25mg), produzido por FURP
Rituximabe, Solução injetável frasco com 50mL (10mg/mL), produzido por TECPAR
Sofosbuvir, Comprimido revestido (400mg), produzido por Farmanguinhos
c, Pó para solução injetável (150mg; 440mg), produzido por Butantan
Cabergolina, Comprimido (0,5mg), produzido por Bahiafarma Farmanguinhos
Insulina (NPH e Regular), Suspensão injetável (100 UI/mL), produzido por Bahiafarma
Pramipexol, Comprimido (0,125mg; 0,25mg; 1mg), produzido por Farmanguinhos
Sevelâmer, Comprimido (800mg), produzido por Bahiafarma Farmanguinhos
Trastuzumabe, Pó para solução injetável (150mg), produzido por TECPAR
Vacina Tetraviral, Pó para solução injetável, produzido por Bio-manguinhos
Alfataliglicerase, Pó para solução injetável (200 U), produzido por Bio-manguinhos
Veja nota completa do Ministério da Saúde:
Esclarecimento sobre fase de suspensão de 19 PDPs
O Ministério da Saúde informa que estão em fase de suspensão 19 Parcerias de Desenvolvimento Produtivo (PDPs). A lista disponível no Portal da Saúde foi atualizada no dia 8/7. A etapa atual permite que os laboratórios públicos apresentem medidas para reestruturar o cronograma de ações e atividades. Desde 2015, 46 PDPs passaram por processos de suspensão. Atualmente, 87 parcerias estão vigentes.
Para garantir o abastecimento da rede, o Ministério da Saúde vem realizando compras desses produtos por outros meios previstos na legislação. A medida, portanto, não afeta o atendimento à população. A maior parcela das PDPs em fase de suspensão sequer chegou a fase de fornecimento do produto.
As PDPs são suspensas por fatores como:
ü Recomendação por órgãos de controle (CGU e TCU). Nove suspensões atendem esse critério;
ü Decisão Judicial;
ü Desacordo com o cronograma;
ü Falta de avanços esperados;
ü Falta de investimentos na estrutura;
ü Solicitação de saída do parceiro privado;
ü Não enquadramento de um projeto como PDP; entre outros.
Trata-se de uma medida regular e recomendada pelos órgãos de controle como Tribunal de Contas da União (TCU) e Controladoria Geral da União (CGU), além de estar prevista no marco regulatório das PDPs e realizada com normalidade. Toda e qualquer parceria que estiver em desacordo é suspensa para avaliação.
A PDP é uma parceria que prevê transferência de tecnologia de um laboratório privado para um público, com o objetivo de fabricar um determinado produto em território nacional. O Ministério da Saúde coordena o processo e utiliza seu poder de compra para apoiar a produção nacional de produtos considerados estratégicos para o SUS.
São fases de uma PDP:
Fase I ; Proposta para avaliação;
Fase II ; Desenvolvimento do projeto: elaboração dos contratos entre parceiros, treinamento, desenvolvimento da estrutura e qualificação dos processos de trabalho. Não há fornecimento direto ao Ministério da Saúde;
Fase III - Transferência efetiva de tecnologia e início da aquisição do Ministério da Saúde;
Fase IV ; Verificação da internalização da tecnologia.
Estágio atual das PDPs em fase de suspensão:
ü Adalimumabe ; Fase II
ü Etanercepte ; A PDP suspensa está em Fase II
ü Everolimo - Fase II
ü Gosserrelina - Fase II
ü Infliximabe - A PDP suspensa está em Fase II
ü Insulina (NPH e Regular) ; São duas parcerias: 1 - Fase III, em virtude dos atrasos de entregas, o Ministério da Saúde está realizando compras por pregão; e 2 ; Fase II
ü Leuprorrelina - Fase II
ü Rituximabe - A PDP suspensa está em Fase II
ü Sofosbuvir ; Fase II, além de suspensão por decisão judicial
ü Trastuzumabe ; São três PDPs: 1 - PDP suspensa está em Fase II; 2 ; PDP em fase III suspensa por determinação do TCU; 3 ; Vigente
ü Cabergolina - Fase III, em desconformidade com cronograma de investimentos e estrutura fabril. O Ministério da Saúde realizou pregão eletrônico para aquisição do produto
ü Pramipexol - Fase III, em desconformidade com cronograma do projeto. O Ministério da Saúde realizou aquisição do produto fora da parceria.
ü Sevelâmer - Fase III, em desconformidade com cronograma de investimentos e estrutura fabril. O Ministério da Saúde realizou pregão eletrônico para aquisição do produto
ü Vacina Tetraviral ; Está em desacordo com os critérios de PDPs. O Ministério da Saúde realizou aquisição do produto fora da parceria.
ü Alfataliglicerase - Está em desacordo com os critérios de PDPs. O Ministério da Saúde realizou aquisição do produto fora da parceria.
ü Bevacizumabe ; Fase II