Cabelos ao vento depois do secador, da chapinha e da tintura. Ainda assim, não tem alívio. Um estudo brasileiro alerta que esses procedimentos estéticos podem afetar definitivamente a estrutura dos fios. Nenhum tipo de cabelo escapa, segundo a pequisa, que também indica quais os produtos mais indicados para evitar os danos causados pela exposição ao calor e para fazer com que as intervenções estéticas se tornem mais seguras.
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;Os tratamentos térmicos, como as chapinhas, podem causar danos à estrutura interna dos fios, o córtex. O calor pode desnaturar (mudar a forma) a queratina, a proteína responsável pelas propriedades mecânicas, como elasticidade e resistência dos fios de cabelo. Portanto, essa modificação na estrutura interna pode afetar os fios de maneira negativa;, resume Cibele Lima, pesquisadora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP) e autora do estudo.
Cibele Lima fez os experimentos com amostras capilares de diferentes etnias ; oriental, de pessoas com ancestralidade do Japão, da China e da Coreia; caucasiano, de origem europeia; e afro-étnico, cujos fios foram coletados de pessoas da África do Sul e de Gana. No experimento, os cabelos foram submetidos a diversas temperaturas por meio da exposição a secadores e chapinhas, e avaliou-se a quantidade de calor em que cada cabelo perdia a queratina (veja arte).
[SAIBAMAIS]
Um dos resultados que mais chamaram a atenção foi a vulnerabilidade do cabelo afro-étnico. Os fios mostraram-se menos resistentes, comparados às outras amostras. ;Acredito que essa diferença pode ter relação com a fragilidade desse tipo de cabelo. Ele, por exemplo, tem menor resistência ao estiramento e também quebra mais fácil ao ser penteado. Também possui o diâmetro do fio mais irregular, apresenta menos brilho e retém menos água, ou seja, é mais seco que os outros tipos de cabelo;, destalha a pesquisadora.
Na exposição acima de 250;C, os danos foram irreversíveis para todos os tipos de cabelos. Cibele Lima explica que o calor prejudica o fio internamente, e isso geralmente só é percebido quando é tarde demais, pois a evolução dos danos costuma ser imperceptível. ;Os estragos podem ser causados aos cabelos virgens e potencializados em cabelos submetidos a tratamentos químicos prévios, como alisamento, progressivas, descoloração e tingimento;, destaca a investigadora.
No caso da combinação descoloração e chapinha, constatou-se que há maior desnaturação da queratina do que nos cabelos virgens. ;Ou seja, o dano é maior. A tintura e a descoloração tornam os fios mais porosos, e isso pode aumentar a suscetibilidade deles aos prejuízos causados pelos dispositivos térmicos, em especial, se utilizados em demasia;, explica Cibele Lima.
Análise precisa
Bruna Duque Estrada, coordenadora do Departamento de Cabelos e Unhas da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), destaca que o estudo brasileiro consegue trazer dados precisos para um tema recorrente na área médica. ;É uma das primeiras pesquisas que tenta comparar os efeitos nos tipos de cabelo por etnia. O caucasiano e o africano são provavelmente as maiores influências para a formação do cabelo brasileiro, e essa individualidade é bastante importante. Os danos causados pela chapinha e o secador são conhecidos, mas não precisamente, com temperaturas específicas, como foi feito nessa pesquisa;, avalia.
Segundo Erick Omar, dermatologista da clínica AE Skin Center, em São Paulo, a maioria das chapinhas brasileiras funciona com cerca de 150;C. Aparentemente, não causariam danos graves às cabeleiras, conforme os resultados do estudo. ;Mas temos que ter em mente que uma pessoa que usa esses aparelhos todos os dias, o que é comum, está expondo o cabelo de forma mais severa;, alerta o especialista em tricologia.
O dermatologista explica que, ao longo da vida, a reação dos fios aos procedimentos estéticos vai mudando. No caso das mulheres, depois da menstruação, perde-se parte do volume do cabelo, que fica mais fino. ;Isso não ocorre de repente, é com o passar dos ciclos menstruais. Tenho pacientes que dizem que, antes, faziam chapinha e escova, e o cabelo aguentava melhor. Precisamos destacar também que, quando você usa tratamentos, como vitaminas, está cuidando do cabelo que ainda vai nascer. Os fios atuais não recebem esse auxílio;, ensina.
Adepta da alta temperatura nos cabelos, Sofia Corrêa, 20 anos, também recorre a produtos que possam protegê-los. ;Como uso sempre o secador e, às vezes, o babyliss, passo o leave-in, porque ele dá uma proteção térmica. Isso ajuda, mas, geralmente, sinto que a ponta do meu cabelo fica danificada;, conta. A universitária ressalta que percebia maiores danos quando combinava mais um procedimento estético: a mudança na coloração. ;Eu pintei um tempo atrás. Também secava e lavava todos os dias. Foi quando notei o quanto o secador deixava meu cabelo bem mais ressecado;, lembra.
Protetores térmicos testados
A eficácia de protetores térmicos, recursos utilizados antes de procedimentos que usam a chapinha e o secador, também foi avaliada pela pesquisadora Cibele Lima, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP). Dois tipos existentes no mercado foram testados: o condicionador leave-on (que não precisa de enxágue) e os fluidos de silicone. Conforme o resultado, se o cabelo tiver sido submetido a algum tipo de procedimento químico (descolorido/com luzes/poroso), os fluidos são mais indicados.
;Eles permanecem aderidos à superfície dos fios, com uma menor penetração do que os condicionadores leave-on, por exemplo, que, por conter água, penetraram mais facilmente nos cabelos;, compara a pesquisadora. ;Em cabelos virgens, que possuem a superfície mais uniforme e não porosa, pode ser indicado o uso tanto dos fluidos de silicones quanto dos condicionares leave-on.;
Segundo Bruna Duque Estrada, coordenadora do Departamento de Cabelos e Unhas da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), a indicação desse produtos não é consenso entre os médicos. Dessa forma, o resultado da pesquisa brasileira pode ajudar a embasar as prescrições. ;(O estudo) traz um dado que ainda não tínhamos. A dermatologia, em geral, questiona muito a ação desses produtos, porque, muitas vezes, as pacientes usam o protetor térmico e abusam do secador e da chapinha, achando que, na verdade, isso pode proteger, e não é o que acontece;, explica.
Novos produtos
Camila Vaz, 29 anos, passou a utilizar protetores para o cabelo depois que pintou os fios. ;Sempre usei secador e chapinha, mas não me preocupava tanto. No início do ano passado, tive que fazer um corte químico porque fiz descoloração e o cabelo ficou muito debilitado. A partir desse momento, vi o quanto era necessário protegê-lo;, conta. A servidora pública, que tem como paixão assuntos relacionados à cosmética capilar, saiu em busca de produtos que pudessem ajudá-la, pois não pensava em abandonar o secador e a chapinha. ;Comecei a descobrir novos produtos, encontrei até shampoos que têm essa função de proteger termicamente. Utilizo o leave-in, géis de silicone e até sprays. Com isso, consegui evitar os danos e mantive o uso do secador e da chapinha.;
Para Cibele Lima, os resultados da pesquisa poderão facilitar a vida de consumidoras como a Camila, ajudando no desenvolvimento de soluções capilares mais específicas. ;As indústrias poderão direcionar os produtos para cabelos quimicamente tratados e para cabelos virgens, por exemplo. Sabendo que o calor pode causar danos à estrutura interna dos fios, as consumidoras poderão utilizar o que dará melhor proteção, a depender de sua etnia e dos tratamentos anteriores, bem como a recorrência das intervenções estéticas;, prevê. (VC)
Palavra de especialista
Paixão nacional
;Nos últimos 10 anos, os estudos sobre cabelos melhoraram muito, principalmente com o advento de um exame chamado dermatoscopia capilar, que analisa profundamente o bulbo. Saber mais sobre os fios é importante, porque o Brasil se destaca como um dos países que mais se preocupam com o cabelo. No último congresso internacional em que estive, fiquei sabendo que as brasileiras têm 10 centímetros de cabelo a mais em relação à população mundial. Também sabemos que elas estão entre as que mais buscam tratamentos nessa área, perdendo apenas para as norte-americanas. Com essa pesquisa, vemos também como o cabelo afro é frágil, mas a maioria das pessoas olha para ele e pensa o contrário. Agora, foi mostrado que o cuidado com ele deve ser ainda maior;
Alessandra Juliano, tricologista,
especialista no estudo de pelos e cabelos e médica da Aepit Cabel, em Brasília