Jornal Correio Braziliense

Ciência e Saúde

Falta de vitamina D pode provocar complicações em gestação

Esse deficit acomete 81% das mulheres do Distrito Federal

A recomendação do banho de sol vem nas primeiras consultas com o pediatra. Para proteger o recém-nascido da icterícia, orienta o médico. Mas a relação entre o contato com os raios solares e a calmaria na maternidade deve começar bem antes: quando a mulher decide ter um filho. Não são poucas as evidências científicas de que a carência de vitamina D pode comprometer negativamente a gestação e os primeiros anos de vida dos bebês. E 90% do composto orgânico presente no corpo humano surge em decorrência de um processo biológico desencadeado pela exposição à luz solar.

;Sabemos que a vitamina D age em todo o aparelho reprodutor feminino, nas trompas, na musculatura do útero, nos ovários. Existe uma influência sobre o sistema reprodutivo, mas ainda não se descobriu toda a magnitude dela;, diz Vinicius Medina Lopes. O ginecologista do Instituto Verhum, porém, conseguiu detectar a vastidão da falta do composto orgânico entre as mulheres em idade fértil do Distrito Federal: 81% delas têm quantidade abaixo do recomendado. Dessas, 32% estão em quadro de carência considerado crítico, que demanda suplementação (veja arte).

Fruto de tese de mestrado defendida em julho na Universidade de Brasília (UnB), o levantamento inédito mostra ainda que o problema acomete igualmente as inférteis e aquelas não têm problema para engravidar. A taxa de participantes com deficiência de vitamina D foi de 30,2% e 35%, respectivamente. Ao todo, foram avaliadas 369 mulheres que tinham entre 21 e 47 anos, sendo que 232 sofriam de infertilidade. ;A hipovitaminose é uma epidemia em todo o mundo. O estudo mostrou que esse problema acontece também em Brasília, ou seja, as mulheres em idade fértil fazem parte do grupo de risco;, diz Lopes.

O ginecologista conta que a constatação científica mais forte é a de que a taxa de gravidez é maior entre mulheres com níveis normais de vitamina D. Em uma revisão de artigos sobre o tema, Marilyn Urrutia Pereira, professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, apontou outras complicações. ;Estudos recentes enfatizam a importância de papéis não clássicos da vitamina D na gestação e na placenta, e relacionam a deficiência na gravidez à pré-eclampsia, à resistência à insulina, ao diabetes gestacional, à vaginose bacteriana e ao aumento da frequência de parto cesáreo;, enumerou a pesquisadora em artigo divulgado na Revista Paulista de Pediatria. Na análise, ela levou em conta publicações dos últimos 20 anos.

Marilyn Urrutia Pereira cita um estudo prospectivo publicado no The Journal of Clinical Endocrinology and Metabolism e liderado por Anne Merewood demonstrando que o parto cesáreo é quatro vezes mais comum em mulheres com deficiência de vitamina D quando comparados às com taxas normais do composto. Ela pondera, porém, que essas relações são todas observacionais e conflitantes. ;Muitos outros fatores vão influenciar o risco de cesariana, como a preferência do médico e a preexistência de morbidade. A diabete materna, por exemplo, é muito comum quando há deficiência dessa vitamina;, justifica em entrevista ao Correio.

Nova rotina

É consenso, porém, entre os especialistas que, para chegar a taxas saudáveis do composto orgânico, precisa-se mudar um hábito enraizado às preocupações da vida moderna: a proteção excessiva à luz natural. ;As pessoas saem com filtro solar mesmo em dias nublados;, critica Henrique de Lacerda Suplicy, professor da Universidade Federal do Paraná. O também endocrinologista da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem) ressalta que adultos e crianças não devem deixar de se proteger do câncer de pele, mas também precisam estar atentos aos exageros. ;Todos os extremos são errados. Existe hoje uma certa neurose no mundo por conta da exposição ao sol.;

Um estudo conduzido por Jennifer Hilger, da Universidade de Heidelberg, na Alemanha, indicou a prevalência de deficiência de vitamina D em 37,7% da população de 44 países, incluindo o Brasil. Ao todo, foram consideradas cerca de 168 mil pessoas no trabalho de revisão de 195 pesquisas. Segundo Vinicius Medina Lopes, a literatura médica é escassa quanto à avaliação da prevalência da hipovitaminose D no Brasil. ;Os médicos começaram a pedir o exame (que mede a quantidade do composto) há pouco tempo;, diz. ;Mas não há dúvidas de que o sol é o melhor remédio. Até mesmo nos casos mais graves, quando se prescreve a suplementação, o resultado vem mais rápido quando a pessoa também tem contato com a luz natural;, garante.

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