Ainda hoje, há quem chame de ;doença nova;. Mas essa é uma enfermidade que aflige o homem desde quando sequer havia palavras para descrevê-la, e feitiços e encantamentos eram as armas que se tinha para lutar contra ela. O câncer, uma série de moléstias caracterizadas pela multiplicação anormal de células, acompanha a vida na Terra ; a mais antiga evidência de um tumor maligno data de 350 milhões de anos e foi detectada no fóssil de um peixe. Em seres humanos, um neandertal de 35 mil anos, encontrado em Stetten, na Alemanha, é, até agora, o primeiro paciente oncológico diagnosticado.
A área da paleoncologia é recente. Foi criada na década de 1980 por um grupo de médicos egípcios e gregos, nacionalidades com tradição milenar no tratamento de câncer. Papiros dos tempos dos faraós e textos da época dos grandes filósofos traziam indicações de como lidar com a doença (veja quadro nesta página). O interesse dos oncologistas nas pesquisas históricas sobre tumores malignos vai além da curiosidade. A ideia é de que, do passado, surjam pistas a respeito do desenvolvimento de um mal que ainda espera para ser decifrado.
Nos últimos anos, técnicas de imagem mais sofisticadas têm permitido detectar diversos tipos de câncer em múmias e humanos fossilizados. Há uma semana, cientistas do Centro Senckenberg de Evolução Humana e Paleoambiente da Universidade de Tübingen, na Alemanha, anunciaram a descoberta do mais antigo caso de leucemia que se tem notícia. Usando tomografia computadorizada de alta resolução, eles detectaram indícios da doença em um esqueleto de 7 mil anos pertencente a uma mulher que morreu com 30 a 40 anos.
;Nós examinamos muitos ossos do esqueleto e constatamos uma perda incomum no interior do tecido ósseo, no úmero superior direito e no esterno;, contou, em nota, Heike Scherf, cientista que integra a equipe do Centro Senckenberg. De acordo com Scherf, esses ossos contêm células-tronco hematopoiéticas, aquelas que darão origem às células sanguíneas; e, neles, a leucemia pode surgir. Ao comparar o úmero da paciente do neolítico ao de 11 indivíduos escavados no mesmo sítio arqueológico, os cientistas observaram que apenas o esqueleto da mulher apresentava a deformidade. Após descartar outras moléstias, concluíram que estavam diante de um caso de leucemia, embora não possam afirmar se a paciente morreu em decorrência do câncer.
Dificuldades
Em cerca de três décadas de estudos nessa área, ainda há poucos achados consistentes, apesar de já terem sido encontradas evidências de tipos variados da doença, como próstata e mama. Uma limitação é o próprio processo de decomposição do organismo. ;Quando você tem uma lesão óssea, ela é conservada. Mas as partes moles se degeneram. Nas múmias e nos fósseis, podem se conservar vestígios de fraturas, calos ósseos e neoplasias ligadas aos ossos. Já os tumores de órgãos se desfazem;, esclarece o doutor em patologia anatômica Carlos Alberto Basilio de Oliveira, acadêmico da Academia Nacional de Medicina.
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