Jornal Correio Braziliense

Ciência e Saúde

Danos que o homem causa ao meio ambiente é um dos temas da cúpula Rio+20

Londres - Os danos catastróficos que o homem vem causando ao meio ambiente e as disparidades entre ricos e pobres são os principais obstáculos da cúpula Rio%2b20, que será celebrada em junho, afirmaram especialistas nesta segunda-feira (26/3).

Segundo eles, a conferência precisa por fim a um sistema que permite que o crescimento desordenado destrua a saúde do planeta sem atender a bilhões de necessitados.

"Este século é especial na História da Terra. É o primeiro em que uma espécie, a nossa, tem o futuro do planeta em suas mãos", afirmou Martin Rees, da Royal Society, a academia britânica de ciências.

"Nós inventamos uma nova era geológica: o Antropoceno", afirmou, em alusão a um tempo que os cientistas afirmam ser forjado pelo homem e não pela natureza.

Um encontro de quatro dias, realizado em Londres, reúne 2.800 cientistas, economistas, executivos e autoridades com o objetivo de fazer um retrato da saúde do planeta antes da Rio%2b20.

A conferência das Nações Unidas, prevista para 20 a 22 de junho, será organizada 20 anos depois da famosa Cúpula da Terra, também realizada no Rio de Janeiro, em 1992.

Naquele ano, líderes políticos se comprometeram a incluir o desenvolvimento sustentável em sua agenda e com a criação de duas instituições no âmbito da ONU para enfrentar o aquecimento global e a perda de espécies.

Mas nesta segunda-feira, muitos especialistas fizeram um retrato sombrio da ameaça e convocaram os governos a descartar estratégias baseadas obsessivamente no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB).

Os principais elementos por trás do risco são uma população mundial que deve subir dos atuais 7 bilhões para 9 bilhões em meados do século, mas também o consumo ineficiente e danoso de recursos, afirmaram.

Will Steffen, chefe do Instituto de Mudanças Climáticas da Universidade Nacional Australiana, disse que o Antropoceno estava empurrando alguns ecossistemas da Terra para "pontos sem retorno".

No prazo de poucas décadas, estes ecossistemas vitais poderiam sofrer danos duradouros ou irreversíveis por causa do aquecimento provocado pelo homem, afirmou.

Entre as áreas preocupantes estão a cobertura de gelo da Groenlândia, a floresta amazônica e a Sibéria, onde bilhões de toneladas de gases causadores de efeito estufa de fonte natural poderão ser liberados com o derretimento do ;permafrost; (solo permanentemente congelado). O oceano Ártico provavelmente ficaria sem gelo ainda "neste século", alertou.

"No cenário mais pessimista, é muito provável, eu penso, que o sistema terrestre vá entrar em um novo estado de algum tipo, com uma mudança muito severa para a civilização contemporânea", reforçou Steffen. "Algumas pessoas chegam, inclusive, a falar em colapso", acrescentou.

Vinte lideranças, entre personalidades e organizações, todos ganhadoras do prestigioso prêmio Blue Planet de trabalhos relacionados com o meio ambiente, pediram que os participantes da Rio%2b20 se debrucem sobre os problemas ambientais com um novo olhar.

A meta estabelecida pela ONU de limitar o aquecimento global a 2;C já está fora do alcance, afirmou Bob Watson, ex-diretor do painel climático das Nações Unidas e conselheiro-chefe do Ministério britânico de Meio Ambiente, ao apresentar o estudo dos laureados com o prêmio.

"Se você olhar para os compromissos assumidos hoje por governos ao redor do mundo, nós temos apenas uma chance de 50% de um mundo 3;C mais quente, quase nenhuma chance de um mundo com [aquecimento de] 2;C e, para ser bem honesto, não é improvável que cheguemos a um mundo de 5;C", disse Watson.

"Claramente este é um mundo com consequências adversas significativas para sistemas ecológicos, sistemas socioeconômicos e para a saúde humana", acrescentou.

"Temos que perceber que estamos assistindo a uma perda da biodiversidade sem precedentes nos últimos 65 milhões de anos... Claramente estamos entrando na sexta extinção em massa (do planeta)", alertou.

"Os desafios que enfrentamos hoje são exatamente os mesmos que a (cúpula do) Rio encarou 20 anos atrás", continuou Watson, asperamente. "Simplesmente não agimos. A necessidade de ação está se tornando cada vez mais urgente a cada dia que passa", reiterou.

Diana Liverman, professora da Universidade do Arizona, afirmou no entanto que as notícias não são totalmente desanimadoras. Desde 1950, "nós temos visto uma grande aceleração dos impactos humanos, mas há alguns sinais de que alguns motivadores estão desacelerando ou mudando", afirmou.

Liverman apontou uma desaceleração e eventual estabilização no crescimento populacional, ganhos em eficiência energética e reflorestamento em alguns países.

Mas, acrescentou, "muitas pessoas ainda lutam para atender a necessidades básicas. Muitas delas veem o mundo como profundamente desigual. E muitas ainda aspiram a aumentar seu consumo".