Belo Horizonte ; São micro-organismos dos quais todo mundo quer distância. Responsáveis pelo desagradável mofo em paredes úmidas, pelas manchas que surgem em alimentos estragados ou pelas terríveis micoses que atingem os pés mal-enxugados, os fungos são indesejados e têm destino comum quando aparecem nas frutas e nos queijos guardados há mais tempo: a lata de lixo. Esse tratamento cheio de repulsa, no entanto, não tem espaço dentro de um dos laboratórios de química da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Lá, os micro-organismos servem como objeto de estudo dos pesquisadores, atrás de soluções que vão desde a produção de corantes naturais e novas substâncias para o desenvolvimento de medicamentos até novas maneiras de remover metais pesados e despoluir a água.
No Laboratório de Biotecnologia e Bioensaios, do Departamento de Química do Instituto de Ciências Exatas (Icex), a imagem negativa dos fungos começa a se transformar a partir de vários experimentos. ;Lembramos-nos dos fungos mais pelo lado negativo, associados a mofos, micoses e alimentos estragados. Mas o número dos que causam malefício é menor do que dos úteis. As substâncias biologicamente ativas produzidas por fungos podem ser utilizadas para desenvolver medicamentos. Há, no mercado, remédios de grande importância que surgiram de substâncias isoladas a partir de fungos, como os antibióticos da penicilina, por exemplo;, destaca Jacqueline Takahashi, coordenadora do laboratório do Icex.
Um dos projetos de pesquisa desenvolvidos pelos cientistas da UFMG busca metodologias para aplicar os fungos na remoção de metais pesados presentes na água. Com a capacidade de absorver com mais rapidez vários elementos metálicos de líquidos contaminados, os micro-organismos podem ajudar na despoluição do líquido de maneira eficiente. ;Nesse processo, os fungos são usados para remover, degradar ou diminuir a toxidade de um determinado poluente presente em meio aquoso. Entre esses poluentes, temos metais pesados, resíduos de agrotóxicos e corantes provenientes da indústria têxtil;, afirma a pesquisadora.
Usos variados
Apesar do aumento nos estudos envolvendo fungos durante as duas últimas décadas, estima-se hoje que apenas 5% dos existentes já foram pesquisados, o que torna o reino um grande potencial científico. ;Eles também são objetos de estudo em outras faculdades, como na Escola de Farmácia e no curso de ciências biológicas, o que pode ajudar na criação de aplicações variadas e com resultados mais rápidos;, explica Jacqueline.
Além das aplicações ambientais, os estudos são focados principalmente na produção de fármacos, cosméticos, transformação da biomassa em alimento e na produção de biodiesel. Esse último envolve um esforço multidisciplinar ; química orgânica, microbiologia industrial e química analítica ; para avaliar a viabilidade do uso de enzimas que catalizam reações químicas para produzir biodiesel. Por isso, estão sendo analisados alguns fungos que têm a capacidade de produzi-las.
O trabalho começou com o professor Gecernir Colen, da Faculdade de Farmácia, autor de estudos em microbiologia. ;Ele nos convidou para dar continuidade na área química, a partir de fungos considerados promissores, por terem capacidade de produzir lipases (enzimas catalisadoras) em grande quantidade;, acrescenta Jacqueline.