Jornal Correio Braziliense

Ciência e Saúde

Estudo usa armadilhas fotográficas para compor análises de mamíferos


Belo Horizonte ; Um estudo com armadilhas fotográficas tem ajudado pesquisadores da Amazônia e de outras regiões do mundo a encontrar padrões para a análise da diversidade e mudanças nas populações de mamíferos. Liderada pelo cientista Jorge Ahumada, da Rede de Ecologia, Avaliação e Monitoramento de Florestas Tropicais (Tropical Ecology Assessment and Monitoring Network ; Team), coordenada pela organização não governamental Conservação Internacional (CI), a pesquisa está sendo conduzida em áreas protegidas de diferentes países tropicais.

No Brasil, em uma região próxima a Manaus, o estudo é coordenado por Wilson Spironello, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), com apoio dos bolsistas Carlos Silva, Carine Oliveira e André Gonçalves. Embora ainda não existam dados suficientes para cruzamentos globais, porque o inventário é recente, um dos resultados que os pesquisadores comemoram é o êxito do uso de câmeras fotográficas especiais para a coleta padronizada de dados com base em imagens de animais.

;Pesquisas sobre mamíferos são desenvolvidas há muito tempo, mas nem sempre os métodos foram padronizados, o que dificultava as comparações. Dessa forma, o Team vai nos ajudar a estudar mudanças climáticas e efeitos antrópicos, por exemplo, sobre esses animais;, explica Spironello, um dos coordenadores do estudo no Brasil. Segundo ele, em 30 dias, só na área próxima a Manaus, onde foi instalada uma câmera, foram capturadas cerca de 14 mil imagens.

Os primeiros resultados do estudo foram publicados na revista Philosophical Transactions of The Royal Society, na qual estão documentadas 105 espécies encontradas em sete áreas protegidas no Brasil, Costa Rica, Indonésia, Laos, Suriname, Tanzânia e Uganda. Wilson Spironello não descarta a possibilidade de o estudo revelar a existência de novas espécies, assim como hábitos desconhecidos dos animais. Mas, por enquanto, esse não é o foco da pesquisa. O que os estudiosos já sabem é que as modificações provocadas pelo homem no meio ambiente tem influenciado a diversidade e as populações de mamíferos.

Como se trata de um estudo de longo prazo, a expectativa dos pesquisadores é que daqui a 10 anos seja possível comparar dados em relação à precipitação, temperatura, variáveis da vegetação e fragmentação da paisagem, que poderão mostrar por que uma determinada espécie diminui e a outra não. Spironello sustenta a ideia de que como a tendência da humanidade é destruir quase tudo, a diversidade de espécies e de suas populações também deve diminuir.

;Se você tem áreas de preservação menores, mais alteradas, elas terão menor diversidade de espécies e abundância, mas haverá grupos de espécies mais sensíveis às mudanças do que outras. Se você vai reduzindo as áreas de florestas, vai ter uma redução enorme na diversidade e na quantidade de mamíferos;, afirma.

As câmeras usadas na pesquisa são aparelhos produzidos especialmente para esse fim. Elas seguem modelos já utilizados em equipamentos de segurança. Dotadas de poderosos sistemas de sensores infravermelhos de movimento e temperatura, as máquinas são programadas para disparar sem interferir no comportamento do animal, já que não têm flash. A proximidade do bicho estimula cliques contínuos. ;Muitos animais são sensíveis à presença humana, portanto de difícil detecção. Então, tínhamos uma ideia errônea do real. Muitas vezes vamos para o campo e não vemos nenhuma onça. Aí, quando você pega as imagens, você vê várias fotos delas;, detalha o pesquisador.

No Brasil, as câmeras do projeto estão espalhadas em duas regiões: uma perto de Manaus e a outra nos arredores de Belém do Pará. ;Como o projeto cresce, atualmente com 17 locais no planeta, estamos pensando em colocar o estudo em lugares com maior ou menor distúrbio antrópico, ou sem nenhum em termos de devastação ou caça. Daí podemos comparar essas variáveis também;, explica Spironello. Na pesquisa padronizada, a escolha dos pontos de instalação dos equipamentos também segue determinadas regras.

De acordo com o especialista do Inpa, as câmeras estão espalhadas em uma área de 120 quilômetros quadrados, com distância de 2 quilômetros entre elas. Os aparelhos são georreferenciados e ficam no campo durante 30 dias. Os pesquisadores identificam o ponto espacial e depois, munidos de GPS, instalam próximo de vestígios como pegadas e árvores com frutos. Como a câmera tem sensor de calor, tudo que passa em volta é registrado.

;O objetivo é gravar os animais de médio e grande portes. São mamíferos de hábitos terrestres;, acrescenta.;Cada evento, cada animal que passa, a máquina bate três fotos e depois de cinco segundos dispara de novo. A gente começa a ver até o movimento dos animais. Aqueles que vivem em grupos, tentamos contar todos os indivíduos. É um trabalho bem detalhado em que você lê imagem por imagem;, conclui Spironello.