Jornal Correio Braziliense

Ciência e Saúde

Brasil se arma contra ocorrências de doenças na Copa do Mundo de 2014

Ministério da Saúde antecipa ações de prevenção direcionadas ao Mundial de 2014 e ativa Laboratórios Nível de Biossegurança 3 nos estados para barrar epidemias graves

Belo Horizonte ; Um país aberto aos turistas, mas que pretende manter portas fechadas para os males que a concentração de torcedores do mundo inteiro pode trazer: vírus, bactérias e outros agentes patológicos, alguns causadores de doenças desconhecidas ou já erradicadas no Brasil, como o sarampo. Sim, ainda faltam mais de três anos para a Copa do Mundo de 2014. No entanto, várias ações do Ministério da Saúde (MS), projetos que começaram antes mesmo de o país ser escolhido para sediar o Mundial, já estão saindo do papel e servirão para proteger a população e os visitantes no período em que o país deve receber pelo menos 300 mil estrangeiros ; fluxo de visitantes na África do Sul em 2010.

Um dos projetos prestes a ter início é em Belo Horizonte. A Fundação Ezequiel Dias (Funed) prevê para março a inauguração do primeiro laboratório do estado habilitado em termos de biossegurança para isolar e investigar agentes exóticos e/ou com alto poder de contaminação. O objetivo da monitoração é dos mais importantes: permitir que órgãos oficiais e agentes de saúde tenham resposta rápida frente ao risco de proliferação de doenças, principalmente as endêmicas e pandêmicas, e criem mecanismos de contenção e bloqueio, como a produção de vacinas.

NB3
Denominado Laboratório Nível de Biossegurança 3, ou NB3, a unidade de Belo Horizonte integra uma rede que deve ter mais 11 unidades nacionais e está em fase de certificação de equipamentos para entrar em funcionamento. Segundo declaração do ministério, ;a capacidade de realizar diagnósticos é de extrema importância, principalmente sobre doenças cujo grau de risco biológico é desconhecido. Nesses casos, os Laboratórios NB3 são imprescindíveis, pois garantem o nível de segurança biológica adequada à manipulação para confirmação do diagnóstico desses agentes;.

Entre as doenças infecciosas mais preocupantes estão dengue, malária, febre amarela, influenza por H5N1 e H1N1, rubéola e sarampo, meningites, síndromes gastrointestinais, leptospirose, hepatites agudas e aquelas provocadas por bioterrorismo (com transmissão intencional de agentes normais ou modificados).

Além dos laboratórios, o MS já inaugurou 23 unidades dos Centros de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde (Cievs), como parte de uma iniciativa mundial para compor uma Rede Global de Alerta e Resposta a Emergências de Saúde, principalmente no caso de eventos de massa. ;Hoje, existem centros estruturados em todas as secretarias estaduais de Saúde e em 23 das 26 capitais;, diz nota do ministério. Entre essas unidades estão o Laboratório de Saúde Pública do Distrito Federal, os da Fundação Osvaldo Cruz (Fiocruz) de Pernambuco, do Rio de Janeiro e da Bahia, o Instituto Adolfo Lutz e o Pasteur, ambos em São Paulo, entre outros.

;Esse projeto não foi criado para a Copa do Mundo, mas veio em uma ótima hora;, avalia Sônia Conceição Machado Diniz, bióloga especialista em diagnóstico laboratorial de doenças tropicais e responsável pelo Serviço de Virologia e Riquetsioses (doenças transmitidas por carrapatos) da Funed. ;Aumentamos em muito nossa capacidade de prevenção, inclusive contra agentes desconhecidos que já deram trabalho, como o H1N1, da gripe suína, e o antraz, temido à época do atentado às Torres Gêmeas;, lembra.

Globalização
Até a Copa de 2014, muito trabalho será realizado nos NB3 brasileiros. Na lista de ações imediatas, a bióloga de Minas relaciona a investigação de agentes transmissores de dengue (eles já estudam o tipo 4), febre amarela e tuberculose. Vale ressaltar que o laboratório da Funed não produz vacinas, função de outros setores da fundação, localizada no Bairro Gameleira, região oeste de Belo Horizonte, e das demais entidades que trabalham com vigilância epidemiológica, mas é a partir do trabalho deles que a Secretaria de Estado de Saúde e outros órgãos de saúde pública são acionados em caso de riscos. ;Não há vigilância epidemiológica sem laboratórios especializados. Os investimentos nesse tipo de infraestrutura representam uma tranquilidade para todos nós, além de minimizar riscos para a população em geral, profissionais envolvidos e meio ambiente;, afirma Sônia Diniz.

Presidente da Sociedade Mineira de Infectologia, o médico Carlos Starling explica que a demanda existiria mesmo se o país não fosse sediar o Mundial. ;Toda grande movimentação de pessoas pelo mundo cria a oportunidade de transmissão de agentes infecciosos de uma região para outra. A Copa do Mundo é um desses megaeventos, com riscos de mão dupla. Mas não podemos esquecer que mesmo o fluxo de viajantes normal é gigantesco. Portanto, a circulação de agentes infecciosos é uma realidade.;

Entre os principais agentes infecciosos Starling destaca o vírus da gripe, ;que circula pelo mundo todos os anos e sofre mutações frequentes, exigindo uma monitorização constante para que as vacinas sejam produzidas a tempo;, além daqueles que transmitem malária, dengue, leishmaniose, doença de Chagas e febre maculosa, entre outros. ;Todos são exemplos de doenças que podem circular de uma região para outra por meio de pessoas, vetores e animais infectados. Vírus, bactérias, fungos e parasitas viajam pelo mundo de uma forma tão dinâmica quanto as pessoas;, ressalta.

Prevenção
O médico diz que a troca de informações é fundamental como mecanismo de prevenção e destaca a importância das iniciativas do Ministério da Saúde. ;A vigilância epidemiológica é a principal arma que dispomos para detecção precoce de casos de doenças infecciosas e de possíveis surtos. Quanto mais rápido o problema for detectado, maior é a possibilidade de controle e bloqueio do agente infeccioso, surtos e epidemias;, defende. ;Nesse sentido, a criação dos Cievs é muito importante, para detectar de maneira precoce o aparecimento de uma doença e disseminar informações que possam levar ao seu controle.;


MANUAL DA SAÚDE NA COPA

Por que o cuidado?

Megaeventos podem trazer riscos à saúde pública, com a rápida disseminação de doenças infecciosas ;importadas; de seus locais de origem ou pelo adoecimento de pessoas não imunes ou ;adaptadas; às doenças ditas locais. Deve-se considerar que, quando uma doença é introduzida em um país ou uma zona até então livres do mal, ela se apresenta normalmente com um quadro mais grave, devido à existência de primoinfectados (pessoas infectadas pela primeira vez).

Doenças que podem aparecer
Serviços de assistência e vigilância à saúde devem estar em alerta para a possibilidade de ocorrência de doenças incomuns e inesperadas ao país. As mais conhecidas são: dengue 4, sarampo, rubéola, poliomelite, além de novos subtipos de influenza, febres hemorrágicas africanas e doenças endêmicas, como malária, febre amarela e outras arboviroses.

O que tem sido feito
A Secretaria de Vigilância em Saúde enviou técnicos para as Olimpíadas de Inverno 2010, em Vancouver, no Canadá, e para a Copa do Mundo da África do Sul para acompanhar as experiências desses países. Material didático da Organização Mundial de Saúde sobre eventos de massa tem sido adequado para a realidade brasileira. Já foram iniciados os estudos de Planos de Prontidão e Resposta para Possíveis Emergências em Saúde. Secretarias de Saúde de cidades-sede da Copa do Mundo estão em fase de realização de planos específicos e de capacitação profissional para a prontidão e a resposta a possíveis emergências.

O que a população pode fazer
Não há motivos para alarde, desde que seguidas as orientações já conhecidas de higiene e prevenção de doenças. A agenda de vacinas deve estar em dia. Existe um planejamento em execução de todos os países perante a OMS, para que as equipes de vigilância em saúde estejam de prontidão durante o Mundial.