Belo Horizonte ; em um dia imaginou que uma construção criada a partir do mármore pudesse, em vez de imprimir luxo e suntuosidade, garantir economia? Os pesquisadores da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), na Zona da Mata mineira, imaginaram. E comprovaram, inclusive, que a substituição da areia por sobras de mármore branco melhora em 16% as propriedades do concreto, conforme o cimento usado. Com menos impacto ambiental, a técnica aumenta a durabilidade do material e melhora a vida útil da construção.
O trabalho começou a ser desenvolvido em 2006 pela pesquisadora Cláudia Valéria Gávio Coura, do Departamento de Construções Civis, hoje vinculado ao Instituto Federal do Sudeste de Minas Gerais. Foi motivado pelo atual quadro de insustentabilidade da construção civil no Brasil. A indústria é a maior consumidora de recursos naturais esgotáveis, sendo responsável pelo uso de 20% a 50% dessas matérias-primas no país. É, também, de acordo com a especialista, ;a maior fonte geradora de resíduos e consumidora de energia, além de grande poluidora;.
Pela perspectiva do estudo de Cláudia, é necessário que toda a cadeia produtiva da construção civil passe por transformações significativas. No Brasil, a demanda de agregados, principalmente areias de rio e de barranco, que servem de base para misturas na construção, vem aumentando a cada ano. O consumo estimado desses agregados naturais, somente na produção de concretos e argamassas, é da ordem de 395 milhões de toneladas ao ano.
;No entanto, apesar de a construção civil ser um dos maiores consumidores de matérias-primas naturais, ela também se apresenta como uma das mais eficazes alternativas para consumir materiais reciclados;, indica a professora. Foi esse o motor principal do trabalho. O estudo envolveu a substituição da areia por resíduos de mármore, escolhas justificadas por questões ambientais e econômicas. Grande parte da areia usada na produção de cimento é extraída do leito de rios, o que, de acordo com a pesquisadora, provoca a retirada da cobertura vegetal e a degradação dos cursos d;água, levando a sérios impactos ambientais.
;Órgãos responsáveis pela fiscalização, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e os de competência estadual e municipal, vêm coibindo a prática;, lembra. Na outra ponta da economia, estão as empresas de extração de pedras e serrarias, cuja atividade traz perdas de 10 a 20% do volume processado de rochas ornamentais. Isso tudo se transforma em retalho. As marmorarias perdem, em média, 20% do volume de chapas trabalhadas. Com isso, o volume de rejeitos, sobras e peças quebradas se torna gigantesco. ;Sem terem uso comercial, esses materiais são depositados na natureza, em lixões, aterros sanitários ou em bota-foras de material de construção, degradando ainda mais a natureza;, explica a especialista.
Os testes no Laboratório de Materiais de Construção da UFJF demonstraram que o novo concreto, criado a partir do mármore, tem baixa absorção de água e baixa retração hidráulica. Isso leva ao aumento da durabilidade, pois a infiltração de agentes agressivos na estrutura se torna mais difícil. Para os testes, os pesquisadores usaram sobras de marmorarias de Juiz de Fora, como conta Cláudia: ;Colocávamos um tambor e coletávamos todo tipo de sobras. A grande maioria era mármore branco, mais barato que os demais. Apenas cerca de 5% era mármore bege ou rosa;. As variações entre os tipos de mármore, de acordo com ela, não influenciam na qualidade da mistura. A professora elenca ainda outras qualidades do material. ;O concreto contendo rejeito de mármore triturado atingiu maior resistência à compressão, à tração e à flexão, quando comparado ao concreto com areia natural. A resistência observada foi até 16% superior à do concreto convencional;, observa.
A aderência à pasta de cimento também é maior aos concretos convencionais. A pesquisadora prevê que a nova aplicação das sobras de mármores na construção civil pode atender a Região Sudeste e pontos do Nordeste, onde é grande a presença dessa rocha. Coordenado pela professora da Faculdade de Engenharia da Federal de Juiz de Fora Teresa Gomes Barbosa, o projeto, aprovado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), está em fase de expansão. A universidade agora pesquisa o uso do mesmo rejeito na fabricação de pisos industriais, enquanto uma empresa em Mar de Espanha, também na Zona da Mata mineira, a 312km de Belo Horizonte, já comercializa o material elaborado e testado nos laboratórios.
Para Cláudia Coura, é só o começo: ;Muito ainda precisa ser feito com relação às pesquisas experimentais, para que sejam exploradas todas as possibilidades de utilização dessa nova alternativa para agregados e para que os resíduos sejam totalmente aproveitados, atingindo uma fatia do mercado compatível com suas potencialidades;.