Jornal Correio Braziliense

Ciência e Saúde

Geoarquelogia busca no Egito faraônico soluções para mudanças climáticas

Enquanto especialistas mundiais se debatem sobre as formas de conter o aquecimento global, cientistas se reúnem no Egito em busca de respostas do passado faraônico que ajudem a enfrentar os problemas ambientais do presente.

Dono de uma incomparável riqueza arqueológica, o Egito é a nação mais populosa do mundo árabe e o número de habitantes no país deve mais que dobrar em 2050, com uma estimativa de 160 milhões de pessoas.

Há muito tempo, os efeitos das mudanças climáticas têm sido negligenciadas neste grande país norte-africano, que depende amplamente do fértil Delta do Nilo para alimentar sua crescente população, em meio a preocupações sobre a erosão do solo.

Na conferência de três dias, inaugurada no domingo, especialistas esperam compreender como os antigos egípcios, que foram capazes de erguer as pirâmides, lidavam com as mudanças do clima.

"É tempo de tentarmos aprender com o passado para tomarmos decisões melhores no futuro", disse Shawkat Yahia, cientista da prestigiosa Universidade Americana do Cairo.

Ele afirmou, em entrevista coletiva, que são necessárias respostas rápidas, ressaltando que as vidas de milhões de pessoas estarão em risco se desaparecerem as preciosas terras cultiváveis do país.

"Entendendo mais sobre como as sociedades se adaptaram ao seu ambiente, estaremos mais bem preparados para nos planejarmos e adaptarmos aos desafios atuais e futuros que confrontam o Delta do Nilo", afirmou.

Yahia está entre os cerca de 200 arqueólogos, historiadores, geólogos e paleontólogos de 25 países que esperam que a geoarqueologia - união entre arqueologia e geologia - encontrarão a chave.

A conferência é a primeira do tipo a ser celebrada no Egito, onde a arqueologia sempre foi tomada com uma abordagem rígida e clássica para entender o passado. "A Egiptologia tradicional precisa se adaptar a novas abordagens, (tais como) reconstituir o ambiente no qual as pessoas se desenvolveram", disse Yann Tristant, do Instituto Francês de Arqueologia Oriental (IFAO).

O IFAO uniu forças com o Centro Nacional de Pesquisas francês (CNRS) e o Conselho Supremo de Antiguidades do Egito em torno de um ;brainstorming; que ajudasse os especialistas a encontrarem soluções para o futuro.

A meta das discussões é resgatar evidências arqueológicas e geológicas que possam explicar como os antigos sobreviveram às mudanças climáticas e quais lições podem ser tiradas daí.

Pierre Zignani e Matthieu Ghilardi, especialistas do CNRS, acreditam que muito pode ser aprendido dos arquitetos que criaram templos milenares capazes de resistir aos ataques do tempo. "Fortes chuvas provocadas pelas mudanças climáticas no último milênio e grandes inundações do rio Nilo foram consideradas pelos arquitetos ao construir as estruturas religiosas", destacaram, em artigo conjunto.

Pesquisar o passado "pode trazer informações sobre nosso conhecimento fundamental atual e novas informações críticas para a nossa comunidade".

Em um artigo preparado para a conferência, Mahmoud Abdel Moneim, da Universidade Ain Shams do Egito, questionou se a cabeça da Grande Esfinge poderia vir abaixo por causa das mudanças climáticas "no século atual".

"A taxa de intemperização da Esfinge é estimada em 0,66 milímetro por ano", disse, em alusão à enigmática estátua, metade leão, metade homem, que se ergue no meio do deserto, como guardiã do complexo de pirâmides de Gizé.