A única parte da Teoria da Relatividade Geral que ainda não havia sido comprovada pela ciência pode vir a ser totalmente esclarecida por meio de uma parceria entre a Agência Espacial Europeia (ESA) e a Agência Espacial Americana (Nasa). Está previsto para 2020 o lançamento em órbita solar da Antena Espacial de Interferômetros a Laser (Lisa, na sigla inglesa), um experimento gigantesco que visa estudar e principalmente comprovar a existência das ondas gravitacionais, fenômenos descritos pelo físico Albert Einstein em 1915. De acordo com especialistas no assunto, ondas gravitacionais consistem em vibrações na curvatura do espaço-tempo (como se fossem uma só unidade) que tiveram origem a partir da colisão de grandes estrelas e formações de buracos negros.
O grande objetivo do Lisa, portanto, é medir oscilações sutis no espaço causadas por ondas gravitacionais fracas. De acordo com o projeto, o experimento consistirá em três satélites que orbitarão o Sol, conectados por feixes de laser, formando um grande triângulo espacial (veja infografia). Segundo o cientista da ESA Fabio Favata, o custo médio do projeto está estimado em 650 milhões de euros. Os três satélites que fazem parte do Lisa devem ficar separados uns dos outros por 5 milhões de quilômetros e trilharão atrás da Terra a uma distância de 50 milhões de quilômetros, o equivalente a 20 graus. ;Os satélites levarão consigo dois cubos flutuantes de ouro platinado, totalmente protegidos do ambiente externo, principalmente da luz e de partículas cósmicas. Portanto, as ondas gravitacionais devem modificar a distância entre esses cubos de ouro em cinco centésimos de angstr;m, medida comumente utilizada para lidar com grandezas da ordem do átomo. A movimentação desses cubos demonstrará a existência das ondas;, explica o cientista da ESA.
Favata, chefe de Planejamento da Ciência e do Gabinete de Coordenação da Comunidade da ESA, revela que cientistas do mundo todo também participam da iniciativa. ;Para se ter uma ideia, pelo menos 200 pesquisadores costumam participar das reuniões da comunidade, os chamados simpósios;, destaca. Estudioso do assunto desde a década de 1980, o físico do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) Odylio Denys de Aguiar explica que hoje em dia a ciência conta com detectores sensíves a ondas gravitacionais, numa faixa de frequência entre 10 hertz e 10 khertz. ;Esses aparelhos, porém, só conseguem captar a existência de ondas muito fortes, verdadeiras tsunamis, o que é raro. Nas frequências mais baixas, existe uma quantidade e previsão maior de ondas gravitacionais na natureza. O Lisa conseguirá atingir essas faixas (mais baixas), captando ondas mais comuns e de forma contínua;, afirma.
;Ondas do mar;
Descritas por Albert Einstein na Teoria da Relatividade Geral, em 1915, as ondas gravitacionais fazem parte de um hall de temas científicos ainda pouco conhecido do grande público. Na tentativa de explicar o fenômeno de maneira mais simples, o professor do Departamento de Física e Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp) Cláudio Carvalho toma como exemplo as ondas do mar. ;Imagine um indivíduo dentro do mar. Nessa situação, ele sente a força das ondas de forma contínua, sendo que elas (as ondas) podem até derrubá-lo;, diz.
Conforme o docente da Unesp, se essa mesma pessoa estiver dentro do mar, mas em meio a uma tempestade, ela provavelmente sentirá que as ondas e a força proveniente delas surgem das mais diversas direções. Nesse caso, conforme o especialista, as ondas seriam tão fortes que poderiam inclusive matar a pessoa. ;No caso das ondas gravitacionais, ocorre algo parecido. A fonte gravitacional depende do tamanho dos corpos que produzem a força gravitacional. Quanto maior a massa, maior a força produzida e, no caso de dois corpos muito grandes colidirem, surgiriam várias ondas ou um choque delas. Mas isso precisaria acontecer entre buracos negros, por exemplo;, explica. Na opinião do especialista, caso as ondas gravitacionais sejam comprovadas, será possível entender melhor o universo. ;No momento, contudo, a principal contribuição vem da tecnologia que está por trás de toda essa empreitada da Nasa e da Esa;, avalia.
Já Odylio Denys acredita que as ondas gravitacionais podem abrir uma verdadeira ;janela de observação para o universo;, numa faixa de frequência que ainda não existe. ;O fenômeno pode contribuir para explicar, por exemplo, explosões de estrelas. Informações a respeito de outras fases do universo, inclusive de seu nascimento, também estarão mais próximas de nós;, afirma, lembrando que o estudo das ondas gravitacionais pode indicar se houve ou não a explosão do Big Bang ou se o universo já existia antes disso. ;São inúmeras as possibilidades de estudo;, finaliza.