Uma planta brasileira conhecida pelo grande potencial medicinal, o barbatimão (1) (S. barbatiman), acaba de protagonizar um importante estudo desenvolvido na Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói (RJ). Segundo a pesquisa divulgada ontem, o extrato obtido da espécie da planta atuou como um potente inibidor do veneno letal expelido pela serpente surucucu, considerada uma das mais perigosas da América Latina. O Laboratório de Venenos e Toxinas de Animais e Avaliação de Inibidores (Lavenotoxi), pertencente à universidade, priorizou o uso de elementos naturais na busca de substâncias antiofídicas eficazes e mais seguras para a população. Durante o estudo, foram desenvolvidos quatro experimentos com o veneno da serpente ; três deles in vitro e um com o uso de camundongos, com 100% de eficácia. Até o momento, porém, não há previsões para a realização de testes em seres humanos.
O fato de o barbatimão ser usado há muitos e muitos anos, principalmente por povos indígenas e amazônicos, foi justamente o fator que mais chamou a atenção dos pesquisadores da UFF Rafael Cisne e André Fuly, responsáveis pelo estudo. De acordo com Fuly, professor do Departamento de Biologia Celular e Molecular da universidade, acidentes com serpentes são hoje combatidos com o auxílio do soro antiofídico. Porém a possível ocorrência de efeitos colaterais em decorrência do uso do medicamento, a exemplo de reações alérgicas sérias, além de custos altos e dificuldades na distribuição pelo país, devido à exigência de conservação em baixas temperaturas, precisa ser levada em consideração. ;Como em qualquer outra terapia, há vantagens e desvantagens. Portanto, diversas pesquisas tentam descobrir meios alternativos, com comprovação científica, para a inibição dos venenos de cobras. O uso desses inibidores naturais, combinados com o soro antiofídico convencional, também é uma das alternativas;, destaca.
Outras serpentes
A descoberta de propriedades inibidoras do veneno da surucucu no barbatimão é o primeiro passo para a produção de um soro específico, no futuro. Segundo os cientistas, a intenção a partir de agora é avaliar a capacidade do barbatimão diante do veneno expelido por outras serpentes. ;O índice de letalidade do veneno da surucucu, segundo dados do Ministério da Saúde, chega a ser três vezes maior do que o da jararaca. Por ano, cerca de 2% dos acidentes registrados são com surucucus. Os casos são poucos, mas a possibilidade de o indivíduo morrer é grande;, informa Fuly, lembrando que a serpente pode ser encontrada em áreas de Mata Atlântica e na Região Amazônica.
Para o diretor científico do Instituto Vital Brasil, Luís Eduardo Cunha, a iniciativa da UFF é louvável. ;Apoiamos a pesquisa acadêmica e achamos que, no futuro, ela pode trazer excelentes resultados. Mas é preciso reforçar que o procedimento não é terapêutico e, no caso de acidentes com serpentes, é preciso utilizar o soro antiofídico;, finaliza.
1 - Cicatrizante popular
Planta nativa dos cerrados brasileiros presente nas regiões Norte, Centro-Oeste, Nordeste e Sudeste, pode medir de 2m a 6m de altura. Floresce entre os meses de outubro e fevereiro e a produção de vagens se dá entre outubro e março. É utilizada popularmente como cicatrizante, principalmente por pessoas do campo, para o tratamento de feridas ou machucados de animais. Além disso, o barbatimão é tido como uma importante fonte de tanino, substância utilizada no curtume de couros e também no artesanato.