Jornal Correio Braziliense

Ciência e Saúde

Grupo de pacientes do DF participa de estudo mundial que está prestes a colocar no mercado uma nova droga contra diabetes

O remédio promete, além de controlar o nível de glicose, regenerar parcialmente o pâncreas. Nove laboratórios devem produzir o medicamento

Walter Malva sempre teve um corpo atlético. Aos 53 anos, o professor de educação física se mantém em forma. Aparenta ser mais novo. Praticante de esportes desde que consegue se lembrar, escolheu o judô para se especializar e dar aulas em Brasília. Mesmo com vida regrada, alimentação saudável e exercícios físicos constantes, ele não escapou de integrar os 10% dos adultos brasileiros que têm diabetes. A estatística, divulgada pela Universidade Católica de Brasília (UCB), acende um alerta sobre a prevenção e o tratamento da doença. Uma nova opção médica, em fase final de testes em vários países e com um núcleo de pacientes no Distrito Federal, traz vantagens sobre os medicamentos utilizados atualmente: além de controlar os níveis de glicose, a droga consegue regenerar parcialmente o pâncreas ; órgão responsável pela produção de insulina e que é bastante afetado pelo problema.

Sob supervisão do Conselho de Ética da Universidade Católica, do Conselho Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o tratamento é realizado com medicamento à base de incretinas, que são hormônios gastrointestinais. A substância é mais potente que os remédios disponíveis nas farmácias e consegue permanecer mais tempo no corpo. De acordo com o endocrinologista João Lindolfo Borges, responsável pelos testes, realizado no Centro de Pesquisa Clínica do Brasil, no Lago Sul, a nova opção também ajuda a reduzir alguns quilos do paciente. Ainda segundo ele, 90% dos adultos diabéticos estão acima do peso, o que é muito ruim para o tratamento da doença.

;Esse tratamento com as incretinas é extremamente eficaz e os resultados comprovam isso. Esse, com certeza, é um grande avanço da medicina, porque o paciente que sofre de diabetes, hoje em dia, é polimedicamentado. Com a chegada dessa droga, que ainda não recebeu um nome comercial, em vez de 14 aplicações por semana, a pessoa só vai precisar tomar uma injeção a cada sete dias;, explica Borges. ;Isso sem falar nos benefícios financeiros. Até agora, temos nove laboratórios trabalhando para a produção do medicamento. Ou seja, quando o remédio chegar às farmácias, o custo tende a ser bem menor que o atual, por causa da concorrência entre as fabricantes;, completa.

Há quase 10 meses como voluntário dos testes, Walter Malva conta que perdeu 4kg, teve a glicemia estabilizada e a pressão controlada ; ele é hipertenso. De reações, descreve que teve apenas enjoos no início do tratamento, mas nada que o fizesse desistir. ;Eu descobri que tinha diabetes há cinco anos, depois de uns exames que fiz durante o tratamento de uma lesão na coluna. Na época, fiquei muito assustado, porque tenho histórico familiar e três tias maternas tiveram membros amputados por culpa da doença;, diz. ;A informação de que existia um novo tratamento em testes chegou a mim por meio de um amigo. Até agora, estou bastante satisfeito e pretendo continuar o tratamento quando iniciarem a comercialização;, ressalta.

Voluntários
O novo medicamento com as incretinas está no estágio que antecede a chegada do produto às farmácias. No DF, cerca de 100 pessoas integram o programa de voluntários que testam os efeitos da droga. No mundo, esse número aumenta para, aproximadamente, 5 mil voluntários. A escolha dos diabéticos que ajudam no desenvolvimento do tratamento é bastante criteriosa, segundo Fernanda Cardoso, pediatra endocrinologista que também faz parte da equipe de cientistas que avalia o processo.

;Para participar dos testes, o voluntário tem de estar com a doença controlada e não pode ter outros tipos de problemas de saúde, como câncer, por exemplo. Depois de ser submetido a uma série de entrevistas e exames, o paciente admitido passa por um controle rigoroso. Todos os sintomas, reações e comportamentos são registrados e enviados a uma central que compara com as anotações sobre outros voluntários de todo o mundo. Qualquer detalhe é importante;, destaca. Fernanda lembra, ainda, que caso o paciente integrante do processo de testes não cumpra com todos os cuidados e instruções estabelecidos inicialmente, é desligado do programa. ;Não pode haver dúvidas da eficácia da droga;, afirma.

Os voluntários que se submetem a tratamentos como esse contra a diabetes no Brasil, diferentemente do que acontece em outros lugares do mundo, não são remunerados. Em compensação, os responsáveis pela pesquisa são obrigados a arcar com todo o custo do projeto, incluindo transporte até o local onde a droga é aplicada, alimentação e remédios complementares. Além disso, o grupo de pesquisadores fica responsável pela integridade da saúde dos pacientes.

;Outra pessoa;
O representante comercial João Batista, 61 anos, ficou apavorado, em 2007, quando descobriu que tinha diabetes. O resultado veio depois de uns exames de rotina, em uma clínica do Guará. Lá, duas estagiárias do Centro de Pesquisa Clínica do Brasil comentaram sobre um tratamento experimental. Sem tentar as drogas convencionais para combater a doença, ele se inscreveu e foi aprovado no programa. ;Fiquei apavorado quando fiquei sabendo que estava diabético. Eu sempre comi muita gordura e imaginei que poderia ter colesterol alto ou qualquer outra coisa, menos diabetes. Confiei na equipe e me submeti ao tratamento com as incretinas. Depois da primeira aplicação, tive enjoo. Só uma vez. Até hoje, me dou muito bem com o medicamento e espero prosseguir com ele;, relata.

Agora, com 15kg a menos, Batista comemora os efeitos das aplicações de hormônios gastrointestinais. ;Ainda preciso perder mais uns 4kg e o doutor João Lindolfo ainda briga comigo quando exagero em alguma coisa, mas faço isso porque estou me sentindo muito bem. Sou outra pessoa. É como se eu tivesse 20 anos a menos;, vibra. Para tentar uma vaga no tratamento com incretinas ou obter mais informações sobre o processo, é necessário entrar em contato com o Centro de Pesquisa Clínica do Brasil, no endereço SHIS QI 9, S/N, comércio local. Dúvidas podem ser respondidas, também, pelo telefone (61) 3364-3364. O horário de atendimento vai das 8h às 12h e das 14h às 18h30.