Eles emitem uma luz verde em meio à escuridão da mata. Por isso, para localizá-los, os pesquisadores só precisam apagar suas lanternas durante as incursões noturnas. Mas, além da curiosidade que despertam nos leigos e do espetáculo de beleza que proporcionam em meio ao breu, os fungos e cogumelos luminescentes podem desempenhar uma importante tarefa no meio ambiente. Pesquisa desenvolvida pelo Laboratório de Bioluminescência de Fungos do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP) identificou que a luz emitida pelo fungo Gerronema viridilucens pode ajudar na detecção de contaminação por metais pesados.
No estudo, desenvolvido pelo pesquisador Luiz Fernando Mendes, amostras da espécie foram colhidas na natureza e analisadas em laboratório. ;Testamos (a reação a) 11 metais diferentes, como cádmio, níquel e cobre;, conta Mendes. Ao serem expostos a essas substâncias, os exemplares analisados mostraram uma redução na intensidade da luz que emitem (veja arte).
;O fungo foi cultivado em placas de cultura e sobre uma espécie de gelatina conhecida como ágar. Medimos a intensidade da luz antes e depois que as devidas concentrações de metais foram aplicadas. Aqueles que sofreram algum dano, devido ao composto, apresentaram uma luminosidade mais baixa que os demais. Tal fator foi interpretado como algo danoso àquele organismo;, descreve Mendes, que em sua pesquisa contou com a supervisão do professor Cassius Stevani.
Os experimentos deram origem a gráficos que representam a intensidade de luz dos fungos bioluminescentes na presença dos 11 metais testados. Além desses, os pesquisadores conseguem prever a toxicidade de outros por meio de modelos matemáticos desenvolvidos com a ajuda do professor Erick Bastos, da Universidade Federal do ABC (UFABC).
Mendes conta que a linha de pesquisa que resultou no ensaio surgiu da simples curiosidade e vontade de conhecer melhor esse tipo de fungo. O resultado, porém, pode ter aplicações bem objetivas, como o uso do G. viridilucens para identificar se o solo de matas e plantações, por exemplo, está contaminado.
Futuro
Os fungos são organismos fundamentais dentro da cadeia alimentar do solo, por isso são considerados excelentes detectores. Por intermédio da pesquisa, os especialistas compreenderam também o comportamento dos metais sozinhos, combinados e na presença de moléculas orgânicas. Eles acreditam ainda que outras espécies de fungos podem apresentar resultados semelhantes aos observados como o G. viridilucens.
A técnica de usar fungos em ensaios de toxicidade ambiental já foi patenteada. Porém, segundo o orientador Cassius Stevani, antes que seja usada em favor do meio ambiente, são necessários alguns ajustes. Isso porque mesmo sendo um excelente indicador, de acordo com os especialistas, o G. viridilucens ainda é considerado pouco sensível à contaminação, talvez por viver no solo e estar bastante acostumado a condições adversas. O próximo passo, portanto, é investir na hipótese de que outras espécies possam ser utilizadas para o mesmo fim, encontrando fungos mais suscetíveis.
Stevani explica que os chamados bioensaios de toxicidade ambiental existem há mais tempo, mas essa pesquisa é pioneira na utilização de fungos. ;Exemplos (de outras técnicas) são uma bactéria marinha que emite luz e detecta a presença de certos componentes e peixes, algas e microcrustáceos utilizados com o mesmo objetivo. A lista de organismos é grande e a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) realiza essas avaliações principalmente em meio aquoso;, explica o cientista.
Confusão de termos
Fungos ou cogumelos? A verdade é que muita gente não consegue distinguir corretamente esses dois termos. De acordo com o pesquisador Cassius Stevani, os fungos são organismos eucariontes, que podem ser uni ou multicelulares (com apenas uma ou várias células). Visualmente, parecem bolores comuns no pão, capazes, em alguns casos, de produzir estruturas com finalidade reprodutiva, popularmente conhecidas como cogumelos.
;Os fungos são compostos por filamentos celulares microscópicos, as hifas, cujo conjunto denomina-se micélio. Todas as espécies de fungos bioluminescentes degradam celulose e possuem um micélio que emite luz, embora os cogumelos nem sempre possuam essa capacidade;, explica o especialista.
De acordo com ele, ainda não se sabe muitos detalhes a respeito do mecanismo de emissão de luz pelos fungos e cogumelos luminescentes, que podem ser encontrados em todas as partes do planeta. O que os cientistas já descobriram é que tal fenômeno ocorre a partir de uma reação química que depende da presença de oxigênio.
Ouça entrevista com o pesquisador Luiz Fernando Mendes