Belo Horizonte ; Quando Santos Dumont decolou a bordo do primeiro avião impulsionado por motor a gasolina, em outubro de 1906, na França, não imaginava que sua terra, Minas Gerais, seria referência no setor da aviação. Pouco mais de um século depois, o estado caminha para se tornar um dos principais centros de plataforma de logística aeronáutica e estudos de aerodinâmica do país. A capital mineira abriga os centros de manutenção da Gol e da Trip Linhas Aéreas, e o estado pode receber em breve o centro de manutenção da TAM Executiva. Junto aos centros de manutenção, há investimentos pesados em pesquisas para a indústria aeronáutica e aerospacial, laboratórios para a fabricação de protótipos de aeronaves, unidades de simuladores de voos, instituto de estruturas inteligentes em engenharia e cursos de capacitação de pilotos e técnicos de manutenção.
Neste semestre, a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) termina a construção do Laboratório de Aerodinâmica, onde será instalado o túnel do vento, projetado e desenvolvido no Centro de Estudos Aeronáuticos. O túnel tem o objetivo de apoiar pesquisas sobre voos. Por ele, passa a corrente de ar controlada que permite o estudo da aerodinâmica dos modelos de avião. Atualmente, a UFMG é, ao lado do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e da USP em São Carlos, uma das três universidades no Brasil apta a formar engenheiros em aeronáutica.
;A maioria das pessoas que se forma aqui ainda vai para São Paulo, mas a indústria de aviação começa a florescer em Minas;, observa Paulo Iscold, professor do projeto de aeronaves do Departamento de Engenharia Mecânica da UFMG. Segundo ele, cerca de 40% do quadro de engenheiros aeronáuticos da Empresa Brasileira de Aeronáutica (Embraer) são formados na instituição, que conta ainda com um laboratório para fabricação de protótipos de aeronaves. Em outubro, foi inaugurado o sétimo protótipo da faculdade, a aeronave CEA-309 Mehari. O projeto do avião de acrobacia, coordenado pelo professor Iscold, contou com US$ 300 mil de investimento. Foi o primeiro avião de acrobacia ilimitada (capaz de fazer manobras ousadas, como piruetas, loopings e rasantes) projetado e construído no Brasil.
O Mehari foi projetado para executar manobras complexas a 430km/h. Uma das principais metas do projeto foi reduzir o custo operacional. Isso foi possível com o uso de motor de quatro cilindros no lugar de seis. Além disso, a estrutura de fibra de carbono da aeronave, normalmente usada para esse tipo de avião, foi substituída por outros materiais como aço cormolibdênio e madeira frejó, o que ajudou a reduzir custos. Em 2008, a UFMG construiu um hangar para abrigar as aeronaves em Conselheiro Lafaiete.
Mão de obra
Outra novidade será iniciada dentro de 90 dias, quando começam as obras do Centro de Capacitação Aeroespacial de Minas Gerais, em Lagoa Santa. O objetivo do programa, criado pelo governo estadual, é formar mão de obra especializada em atividades nos setores aéreo e espacial. O centro vai receber investimentos em laboratórios, centros de pesquisa e desenvolvimento de protótipos de avião, unidades de simuladores de voos para treino de pilotos, escolas profissionalizantes e faculdades voltadas para a indústria.
O laboratório de aviônicos, motores e turbinas de avião do centro vai ser usado para treinar mecânicos e engenheiros e contará com R$ 12 milhões de investimento. O projeto prevê ainda laboratório para uso de aulas práticas de 300 estudantes de cursos profissionalizantes, como mecânicos de aviões. A previsão é que o centro esteja em funcionamento ainda este ano. ;Estão sendo criadas diretrizes para a formação de pessoas e atração de empresas ligadas à indústria aeronáutica, com a preparação de estruturas de capacitação;, afirma Luiz Antônio Athayde, subsecretário de Assuntos Internacionais do governo de Minas Gerais.
Ao mesmo tempo, o Centro de Instrução e Adaptação da Aeronáutica (Ciaar), escola de formação de oficiais da Força Aérea no aeroporto da Pampulha, terá, até 2012, nova sede em Lago Santa. O Ciaar forma cerca de 600 profissionais por ano, que respondem por 75% dos oficiais da Aeronáutica. No ano passado, foi criado o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) de Estruturas Inteligentes em Engenharia, sob a coordenação da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). O pesquisador e coordenador do Instituto, Valder Steffen, explica que o projeto é focado na análise de estruturas adaptativas, com modificações nas características dos materiais para facilitar o controle de possíveis falhas. Steffen afirma que houve uma mudança nos paradigmas na engenharia. Se antes a durabilidade era valorizada, hoje as estruturas são projetadas para resistir às falhas.
"A maioria das pessoas que se forma aqui ainda vai para São Paulo, mas a indústria de aviação começa a florescer em Minas"
Paulo Iscold, professor do Departamento de Engenharia Mecânica da UFMG