Ciência e Saúde

Tendência aos ataques de raiva pode estar ligada ao código genético e a componentes psicológicos

postado em 29/12/2009 07:02
O coração acelera, o sangue ferve, a pulsação fica incontrolável. E assim, de repente, vem a fúria. Uma explosão pronta para despertar o que há de pior em cada um. A raiva pode transformar o melhor dos homens, causar tragédias, destruir relacionamentos e mudar destinos. Afinal, o sentimento que nos deixa impulsivos e fora de controle pode ser mais forte. Para o terceiro dia da série sobre os pecados capitais, o Correio ouviu especialistas que estudaram a ira. Os cientistas garantem que há redenção para o mal e que é possível usar esse sentimento para o próprio bem. Todas as pessoas sentem raiva de vez em quando, mas algumas a experimentam com mais frequência e muito mais intensidade que as outras. Para Eric R. Dahlen, professor de psicologia da University of Southern Mississippi, a explicação pode estar tanto em algum componente genético quanto psicológico. "De fato, existem evidências de que algumas crianças podem nascer com grande propensão para a raiva. Ao mesmo tempo, existem evidências que mensagens socioculturais informam o que nos provoca ira e nós aprendemos quando e como é aceitável expressá-la", diz. Segundo ele, grande parte da nossa experiência emocional está ligada a como reagimos a diferentes situações e eventos. Se alguém, por exemplo, está dirigindo para o trabalho em uma manhã qualquer e é fechado por outro motorista bruscamente, é capaz de ficar frustrado e levemente irritado se acreditar que a manobra perigosa foi fruto de distração da outra pessoa. "Agora, se você estiver convencido de que o motorista o cortou intencionalmente, você vai ficar com mais raiva. Então, o que pensamos sobre as situações que acontecem conosco pode influenciar nossas emoções", afirma. A forma de lidar com o estresse parece influenciar diretamente o grau de ira que alguém sente. De acordo com Charles B. Strozier, psicanalista e professor de história e justiça criminal na Universidade de Nova York, a questão está ligada às nossas experiências primárias - como aprendemos a nos acalmar durante a interação com aqueles que cuidam de nós, geralmente as mães. "Nossa habilidade de lidar com a pressão, as demandas e outros tipos de situações estressantes envolve esses primeiros momentos", explica. Alerta Ter raiva, porém, é um sentimento natural, dizem os especialistas. Já a ira aponta quando algo não está certo ou alerta quando existe um possível problema. As pessoas que se sentem assim têm menos tolerância às frustrações e geralmente colocam expectativas irreais nos outros. O ciclo não para por aí. O corpo também sente os efeitos da fúria. Ela desperta a adrenalina, aumenta a tensão muscular, altera a pressão arterial, o pulso, a respiração e o metabolismo. Estimula uma resposta para ir ou fugir do problema. "Um dos problemas associados à raiva crônica é que quando esse sistema é estimulado constantemente pode causar uma série de problemas de saúde, como pressão alta e doenças cardiovasculares", adverte Dahlen. Os cientistas ainda não conseguiram descobrir como a ira age no cérebro. Alguns estudos identificaram partes do cérebro que ficam mais ativadas quando se está com raiva, enquanto outras ficam menos intensas. "As partes afetadas pela raiva variam de acordo com as experiências individuais e se o episódio de irritação que tivemos foi positivo e negativo", conta professor de psicologia da University of Southern Mississippi. Pode parecer estranho, mas ter raiva, que geralmente é considerada um sentimento negativo, também pode ter um lado positivo. Uma ira mais moderada, especialmente quando dura pouco, pode nos levar a ações positivas como enfrentar injustiças, se autoafirmarmos e resolvermos problemas. Esse tipo de raiva pode ser um motivador importante que nos leva a ter atitudes que podem melhorar as nossas vidas e a vida de outros. "O que nunca deve ser válido é a fúria. Ela não tem objetivo ou propósito, apenas destrói. Freud falhou na hora de distinguir a fúria da ira. Em uma mundo de terrorismo e violência essa é uma distinção muito significante", afirma Strozier. Quando somos maltratados ou ameaçados, a ira pode ser uma fonte importante de autoproteção, segundo Sue Grand, psicanalista e autora dos livros The Reproduction of Evil: A Clinical and Cultural Perspective (A Reprodução do Mal: uma perspectiva clínica e cultural) e The hero in the mirror: From fear to fortitude (O herói no espelho: Do medo à fortaleza). Para aqueles que são muito tímidos, diferentes ou obedientes é vital poder expressar raiva. Para os que têm muita ira é importante reconhecer a vulnerabilidade e outros sentimentos neles próprios e naquelas pessoas importantes em suas vidas. A forma mais produtiva da ira é aquela em que se consegue expressar os sentimentos com clareza e firmeza. "Se feito sem explosão, culpa ou ataque, isso permite ao indivíduo a possibilidade de colaboração, crescimento, empatia e diálogo", afirma a especialista. Para Eric R. Dahlen o controle absoluto da raiva talvez não seja possível ou até mesmo desejável, mas existem evidências consideráveis de que programas de terapia de controle podem ajudar pessoas a reduzir a frequência e a intensidade desses sentimentos e a aprender a se expressar melhor em situações de tensão. "Nós podemos controlar a nossa raiva ou pelo menos aprender a entendê-la através da terapia, além de descobrir quais são as fontes dessa ira e com o tempo conseguirmos curar parte dessas expressões destrutivas", comenta.

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